com os olhos postos na felicidade do futuro
“Aceite o passado como passado, sem negá-lo ou descartá-lo.
Tenha suas lembranças, mas não viva no passado.” - Morrie Schwartz
Morrie Schwartz estava morrendo... Durante mais de três
décadas fora um daqueles professores que marcam especialmente a vida dos
alunos. Ensinou Sociologia na Universidade Brandeis, em Waltham, Massachusetts,
por 35 anos, antes de aposentar-se...
Pouco antes de morrer, já completamente paralisado sobre o
leito, depois de inglória luta contra uma insidiosa enfermidade conhecida pelo
nome de esclerose lateral amiotrófica (ELA), ou doença de Lou Gehrig, ditou
suas reflexões, enfeixadas no livro intitulado: “Lições Sobre Amar e Viver”, da
Editora Sextante, do qual extratamos parte do capítulo cinco:
“(...) Viver no momento presente não significa rejeitar o
passado; significa reagir a qualquer coisa que esteja ocorrendo agora. Se
ficarmos pensando no passado, estaremos presos a ele em termos emocionais. Não
são só os idosos ou pessoas com doenças graves que têm motivos para remorsos.
Todos nós, no correr da vida, em algum momento pensamos: ‘se ao menos eu
tivesse agido assim; se ao menos eu me tivesse casado com aquela pessoa; se ao
menos eu tivesse dado aquele passo na minha carreira’. Se nos deixamos dominar
por esses pensamentos, ficamos atolados no passado, o que é um grande
desperdício de tempo. Em vez disso, olhemos para o passado e perguntemos: o que
posso aprender com ele? Como ele pode me ajudar aqui e agora?”
APRENDA A SE PERDOAR E A PERDOAR OS OUTROS...
“(...) O perdão enternece o coração, esgota o rancor e
dissolve a culpa.”
M. Schwartz.
A epígrafe acima tem o mesmo sentido daquela proferida por
José, Espírito protetor, registrada há décadas no livro terceiro da codificação
espírita[1]: “(...) sede indulgentes, meus amigos, porquanto a indulgência
atrai, acalma, ergue; ao passo que o rigor desanima, afasta, irrita!...”
Completa M. Schwartz: “(...) somos excessivamente rigorosos
conosco mesmos pelo que não realizamos ou pelo que deveríamos ter feito. O
primeiro passo é perdoar-se por tudo aquilo que você não fez e que deveria ter
feito, assim como por tudo o que fez e que não deveria ter feito. Livre-se da
culpa. Sentimentos negativos não fazem bem a ninguém. A melhor forma de lidar
com eles é perdoando-se e perdoando os outros.
O perdão é um termo difícil. Ele não significa apenas um
pedido de desculpas, embora o remorso pelo que se fez sem dúvida faça parte
dele. Podemos querer reparar o erro, se possível, mas há algumas circunstâncias
em que não há nada mais que se possa fazer. Mesmo quando não temos como fazer
as pazes com alguém, é preciso dizer a nós mesmos: é, fiz isso, e teria sido
melhor se não tivesse feito, mas agora quero me perdoar por ter cometido esse
erro.
O perdão nos ajuda a entrar em harmonia com o passado.
Aprendi a me perdoar e isso me ajudou a não sentir mais tristeza ou remorsos
profundos acerca do meu passado”.
UTILIDADE PRÁTICA DO PASSADO
“(...) Há uma diferença fundamental entre usar o seu passado
e chafurdar nele” – continua explicando ainda M. Schwartz – “digamos que eu
tenha tido uma experiência com uma pessoa grosseira e que eu tenha retribuído
com grosseria, mas que não queira mais agir dessa forma. Posso usar aquela
experiência para desenvolver uma atitude diferente, sempre que alguém não for
simpático comigo. Se eu não gostei da minha reação no passado, posso mudar
minha atitude de resposta.
Podemos examinar o nosso passado, tirar proveito dos nossos
sucessos e aprender com nossos erros sem nos julgarmos. Essa é uma hora
excelente para passar a vida em revista, reparar erros, identificar
arrependimentos e encará-los com desapego, procurar harmonizar relacionamentos
não resolvidos e acertar assuntos pendentes.”
Consoante a Doutrina Espírita, ainda existem outros motivos
pelos quais é de toda a conveniência o esquecimento do passado: lá pelos meados
do século XIX, Allan Kardec[2] e os Espíritos Superiores escreveram: “(...) o
homem não pode e tampouco deve saber tudo. Deus, em Sua infinita sabedoria,
assim o quer. Esquecido o passado, ele é mais senhor de si... Em cada nova
existência, o homem dispõe de mais inteligência e melhor pode distinguir o bem
do mal. Onde o seu mérito se se lembrasse de todo o passado? Quando o Espírito
volta à vida anterior (a vida espírita), diante dos olhos se lhe estende toda a
sua vida passada: vê as faltas que cometeu e que deram causa ao seu sofrer,
assim como de que modo as teria evitado. Reconhece justa a situação em que se
acha e busca então uma existência capaz de reparar a que vem de transcorrer.
Escolhe provas análogas às que não soube aproveitar, ou as lutas que considere
apropriadas ao seu adiantamento e pede a Espíritos que lhe são superiores que o
ajudem na nova empresa que sobre si toma, ciente de que o Espírito, que lhe for
dado por guia nessa outra existência, se esforçará pelo levar a reparar suas
faltas, dando-lhe uma espécie de intuição das em que incorreu. Tendes essa
intuição no pensamento, no desejo criminoso que frequentemente vos assalta e a
que instintivamente resistis, atribuindo, as mais das vezes, essa resistência
aos princípios que recebestes de vossos pais, quando é a voz da consciência que
vos fala. Essa voz, que é a lembrança do passado, vos adverte para não
recairdes nas faltas de que já vos fizestes culpados. Em a nova existência, se
sofre com coragem aquelas provas e resiste, o Espírito se eleva e ascende na
hierarquia dos Espíritos, ao voltar para o meio deles.
Não temos, é certo, durante a vida corpórea, lembrança exata
do que fomos e do que fizemos em anteriores existências; mas temos de tudo isso
a intuição, sendo as nossas tendências instintivas uma reminiscência do
passado. E a nossa consciência, que é o desejo que experimentamos de não
reincidir nas faltas já cometidas, nos concita à resistência àqueles pendores.
(...) Gravíssimos inconvenientes teria o nos lembrarmos das
nossas individualidades anteriores. Em certos casos, humilhar-nos-ia
sobremaneira; em outros nos exaltaria o orgulho, peando-nos, em consequência, o
livre-arbítrio. Para nos melhorarmos, dá-nos Deus exatamente o que nos é
necessário e basta: a voz da consciência e os pendores instintivos.
Acrescentemos que, se nos recordássemos dos nossos
precedentes atos pessoais, igualmente nos recordaríamos dos dos outros homens,
do que resultariam talvez os mais desastrosos efeitos para as relações sociais.
Nem sempre podendo honrar-nos do nosso passado, melhor é que sobre ele um véu
seja lançado.
(...) Mergulhado na vida corpórea, perde o Espírito,
momentaneamente, a lembrança de suas existências anteriores, como se um véu as
cobrisse. Todavia, conserva algumas vezes vaga consciência dessas vidas, que,
mesmo em certas circunstâncias, lhe podem ser reveladas. Esta revelação, porém,
só os Espíritos superiores espontaneamente lha fazem, com um fim útil, nunca
para satisfazer a vã curiosidade.
As existências futuras em nenhum caso podem ser reveladas,
pela razão de que dependem do modo por que o Espírito se sairá da existência
atual e da escolha que ulteriormente faça.
O esquecimento das faltas praticadas não constitui obstáculo
à melhoria do Espírito, porquanto, se é certo que este não se lembra delas com
precisão, não menos certo é que a circunstância de tê-las conhecido na
erraticidade e de haver desejado repará-las o guia por intuição e lhe dá a
ideia de resistir ao mal, ideia que é a voz da consciência, tendo a secundá-la
os Espíritos superiores que o assistem, se atende às boas inspirações que lhe
dão.
O homem não conhece os atos que praticou em suas existências
passadas, mas pode sempre saber qual o gênero das faltas de que se tornou
culpado e qual o cunho predominante do seu caráter. Bastará então julgar do que
foi, não pelo que é, sim, pelas suas tendências. As vicissitudes da vida
corpórea constituem expiação das faltas do passado e, simultaneamente, provas
com relação ao futuro. Depuram-nos e elevam-nos, se as suportamos resignados e
sem murmurar...
A natureza dessas vicissitudes e das provas que sofremos
também nos pode esclarecer acerca do que fomos e do que fizemos, do mesmo modo
que neste mundo julgamos dos atos de um culpado pelo castigo que lhe inflige a
lei”.
O ínclito Codificador aduz com sua habitual lucidez[3]:
“(...) em vão se objeta que o esquecimento constitui obstáculo a que se possa
aproveitar da experiência de vidas anteriores.
Havendo Deus entendido de lançar um véu sobre o passado, é
que há nisso vantagem. Com efeito, a lembrança traria gravíssimos inconvenientes.
Poderia, em certos casos, humilhar-nos singularmente, ou, então, exaltar-nos o
orgulho e, assim, entravar o nosso livre-arbítrio. Em todas as circunstâncias,
acarretaria inevitável perturbação nas relações sociais.
Frequentemente, o Espírito renasce no mesmo meio em que já
viveu, estabelecendo de novo relações com as mesmas pessoas, a fim de reparar o
mal que lhes haja feito. Se reconhecesse nelas as a quem odiara, quiçá o ódio
se lhe despertaria outra vez no íntimo. De todo modo, ele se sentiria humilhado
em presença daquelas a quem houvesse ofendido.
Ao nascer, traz o homem consigo o que adquiriu[4], nasce
qual se fez; em cada existência, tem um novo ponto de partida. Mas, pouco lhe
importa saber o que foi antes: se se vê punido, é que praticou o mal. Suas
atuais tendências más indicam o que lhe resta a corrigir em si próprio e é
nisso que deve concentrar-se toda a sua atenção, porquanto, daquilo de que se
haja corrigido completamente, nenhum traço mais conservará. As boas resoluções
que tomou são a voz da consciência, advertindo-o do que é bem e do que é mal e
dando-lhe forças para resistir às tentações.
Aliás, o esquecimento ocorre apenas durante a vida corpórea.
Volvendo à vida espiritual, readquire o Espírito a lembrança do passado; nada
mais há, portanto, do que uma interrupção temporária, semelhante à que se dá na
vida terrestre durante o sono, a qual não obsta a que, no dia seguinte, nos
recordemos do que tenhamos feito na véspera e nos dias precedentes.
E não é somente após a morte que o Espírito recobra a
lembrança do passado. Pode dizer-se que jamais a perde, pois que, como a
experiência o demonstra, mesmo encarnado, adormecido o corpo, ocasião em que
goza de certa liberdade, o Espírito tem consciência de seus atos anteriores;
sabe por que sofre e que sofre com justiça”.
“O passado merece ficar soterrado, constituindo a base para
a edificação do presente, com os olhos postos na felicidade do futuro”.
[1] - KARDEC, Allan. O Evangelho seg. o Espiritismo. 125. ed. Rio: FEB, 2006, cap. X,
item 16, § 5º.
[2] -
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 88. ed. Rio [de Janeiro]: FEB,
2006, questões: 392 a 399.
[3] - Kardec, A. O Evangelho segundo o Espiritismo. 104. ed. Rio [de Janeiro]: FEB, cap. V, item
11.
[4] - Mt., 16:27.
Rogério Coelho
rcoelho47@yahoo.com.br
Muriaé, MG (Brasil)