quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Perseguidos / Elucidações de Emmanuel


Batido no ideal de bem fazer, desculpa e avança à frente.
Açoitado no coração, enxuga as lágrimas e segue adiante.
A indulgência é a vitória da vítima e o olvido de todo mal é a resposta do justo.
Acúleos despontam no corpo da haste verde, mas a rosa, em silêncio, floresce, triunfante, por cima deles, enviando perfume ao céu.
Sombras da noite envolvem a paisagem terrestre na escuridão do nadir; todavia, o Sol, sem palavras, expulsa as trevas, cada manhã, recuperando-a para a alegria da luz.
Lembra-te dos perseguidos sem causa, que se refugiaram na paz da consciência, em todas as épocas.
Sócrates bebe a cicuta que lhe impõem à boca; entretanto, ergue-se à culminância da filosofia.
Estêvão morre sob pedradas, abrindo caminho a três séculos de flagelação contra o Cristianismo nascente; contudo, faz-se o padrão do heroísmo e da resistência dos mártires que transformam o mundo.
Gutenberg é processado como devedor relapso, mas cria a imprensa, desfazendo o nevoeiro medieval.
Jan Hus é queimado vivo, mas imprime novos rumos à fé.
Colombo expira abandonado numa enxerga em Valladolid; no entanto, levanta-se, para sempre, na memória da América.
Galileu, preso e humilhado, desvenda ao homem nova contemplação do Universo.
Lutero, vilipendiado, ressuscita as letras do Evangelho.
Giordano Bruno, atravessando pavoroso suplício, traça mais altos rumos ao pensamento.
Lincoln tomba assassinado, mas extingue o cativeiro no clima de sua pátria.
Pasteur é ironizado pela maioria de seus contemporâneos; no entanto, renova os métodos da ciência e converte-se em benfeitor de todos os povos.
E, ainda ontem, Gandhi cai sob golpe homicida, mas consagra o princípio de não violência.
Entre os perseguidores, contam-se os obsidiados, os intemperantes, os depravados, os infelizes, os caluniadores, os calculistas e os criminosos, que descem pelas torrentes do remorso para a necessária refundição mental nos alambiques do tempo, mas, entre os perseguidos sem razão, enumeram-se quase todos aqueles que lançam nova luz sobre as rotas da vida.
É por isso que Jesus, o Divino Governador da Terra, preferiu alinhar-se entre os escarnecidos e injuriados, aceitando a morte na cruz, de maneira a estender a glória do amor puro e a força do perdão, para que se aprimore a Humanidade inteira.

Da obra Religião dos Espíritos, psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.


Imagem do livro

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Os limites da liberdade


Em que condições poderia o homem gozar de absoluta liberdade?

Nas do eremita no deserto. Desde que juntos estejam dois homens, há entre eles direitos recíprocos que lhes cumpre respeitar; não mais, portanto, qualquer deles gozará de liberdade absoluta (Livro dos Espíritos, questão 826, Lei de Liberdade).

Um náufrago vem ter em ilha deserta. Constrói tosca habitação e ali se instala. Desfruta de liberdade plena. Movimenta-se à vontade. Faz e desfaz, conforme lhe parece conveniente, senhor absoluto daquela porção de terra.
Tempos depois chega outro náufrago. A situação modifica-se. O primeiro experimentará limitações. A não ser que se disponha a eliminar o recém-chegado, descendo à barbárie, deverá reconhecer que seu direito de dispor da ilha esbarrará no direito do companheiro em garantir a própria sobrevivência. Terão, pois, que dividir os recursos existentes. E a liberdade de ambos diminuirá à medida que outros náufragos aparecerem.
É o que ocorre na vida comunitária, onde nossa liberdade é relativa, porquanto deve ser conciliada com a liberdade dos concidadãos. O limite de nosso direito é o direito do próximo. A inobservância desse princípio elementar gera conflitos. As implicações dessa equivalência de direitos são extensas. Fácil enunciar alguns exemplos:
Não nos é lícito, na vida comunitária, transitar de automóvel pelas ruas à velocidade acima da fixada por lei; a ninguém é permitido, em logradouro público, postar-se nu, nem ali despejar lixo ou satisfazer necessidades fisiológicas. A liberdade de movimentação é restrita. Vedado nos é invadir uma propriedade alheia ou recintos de diversão como cinema ou teatro. Mister sejamos convidados ou nos disponhamos a pagar o ingresso.
Não é conveniente nem mesmo permanecer na inércia se fisicamente aptos, porquanto não nos pertencem os bens comunitários. Alimentos, abrigo, roupas, indispensáveis ao nosso bem-estar e à própria subsistência, pertencem àqueles que os produzem. Somos chamados a produzir, também, com a força do trabalho, a fim de que, em regime de permuta, utilizando um instrumento intermediário, o dinheiro, possamos atender às nossas necessidades.
A perfeita compreensão dos deveres comunitários, que restringem a liberdade individual, é virtude rara. Por isso existem mecanismos destinados a orientar a população e conter suas indisciplinas. Há leis que definem direitos e obrigações. Há órgãos policiais para fiscalizar sua observância. Os infratores sujeitam-se às sanções legais, que podem implicar até no confinamento em prisões por tempo determinado, compatível com a natureza dos prejuízos causados a alguém ou à sociedade.
Quanto maior a expansão demográfica e a concentração urbana, mais difícil o controle da população. E há infrações que nem sempre podem ser enquadradas como delitos passíveis de punição ou nem sempre podem ser rigorosamente detectadas e corrigidas pelas autoridades.
Revelam os infratores, total desrespeito pelos patrimônios individuais e coletivos da comunidade e pelo inalienável direito comum à tranquilidade.
Todavia, estes impenitentes individualistas, ilhados numa visão egocêntrica de vida, saberão, mais cedo ou mais tarde, que nenhum prejuízo causado ao próximo ficará impune.
Se a justiça da Terra é impotente para sentenciar os infratores, a justiça do Céu o fará, inelutavelmente, confinando-os em celas de desajuste e infelicidade, na intimidade de suas consciências, impondo-lhes penosas retificações na presente existência ou em existências futuras.
Aprendemos todos, por experiência própria, que há limites em nossa liberdade de ação e que o mínimo que nos compete, em favor de nossa felicidade, é não perturbar o próximo, tanto quanto estimamos que ele não nos perturbe.

Richard Simonetti

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quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Eu admito...


Admito que o céu é azul e lindo, mesmo quando encoberto por nuvens, nubladas e escuras.
Admito que nem sempre tenho razão, e prefiro ter paz do que ter razão.
Admito que errar é humano, mas que prudente é aprender com o erro, e sábio é aprender com o erro alheio.
Admito que todos os dias preciso, ao despertar, fazer escolhas – e para minha paz e felicidade escolho aprender, servir, perdoar e amar.
Admito que boa vontade, mente aberta e honestidade vão me levar para um lugar seguro – consciência tranquila por ter feito o melhor.
Admito que com determinação e fé posso alcançar meus objetivos no bem, confiante que o Universo conspira a meu favor.
Admito que amizades sejam frutos da confiança e da fidelidade e que devo cultivá-las para manter a graça mais perto de mim.
Admito que ainda me confundo entre o bem e o mal, mas me esforço para ser melhor hoje do que fui ontem.
Admito que ninguém renasce para sofrer, mas para evoluir, crescer e ser melhor em gentileza, generosidade e gratidão.
Admito que as melhores coisas da vida não se compram, mas se permutam: sorriso, abraço e carinho.
Admito que o passado é irrecuperável, mas reparável no presente.
Admito também que, onde se desenvolve o amor, se desenvolve a paz, e onde existe paz, Deus está presente.

Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo

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quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Enquanto brilhe o Sol


Há dias em que tudo parece sombreado, sem possibilidade de luz…
Programações cuidadosas tornam-se mais difíceis de serem realizadas, esperanças sustentadas em todos momentos com alegria tornam-se mais distantes, os compromissos habituais parecem enfadonhos e inúteis, ao tempo em que uma onda de pessimismo toma conta dos nossos ideais.
Nesta quarentena longa, que se vem arrastando com vários ritmos e definições, tem havido aturdimento em muitas mentes, gerando grandes conflitos nos relacionamentos, afastando os indivíduos uns dos outros, produzindo tédio e ansiedade, assim como outros conflitos emocionais em razão da falta desse hábito de convivência.
Ideias estapafúrdias, nascidas nas fugas psicológicas da realidade, anunciam prazeres que exaurem e atentados contra a dignidade, como se fosse uma campanha bem dirigida contra a ordem, o equilíbrio e o dever, dando a impressão que essas são manifestações tabus que devem desaparecer da sociedade.
Nesse báratro perde-se o discernimento ante o que é ou não salutar, porque as filosofias existenciais e a política pervertida somente trabalham em favor dos seus interesses mesquinhos, pretendendo reduzir o seu humano contemporâneo ao indivíduo grosseiro e primitivo, por cujas experiências antropológicas transitou com êxito.
Campanhas sistemáticas muito bem urdidas trabalham contra a fé religiosa de qualquer espécie, como se isso resolvesse os graves problemas existenciais nas suas expressões mais significativas.
A educação, que deveria ser a base da construção do mundo novo, por ser o alicerce de glorificação da criatura humana, experimenta a banalização e o desprezo, porque, quanto menos educado (e disciplinado um povo), melhor para os dominadores de ocasião implantarem os seus regimes brutais e esmagadores das populações que permanecerão na miséria social e econômica.
Nada obstante, se arregimentam legiões enlouquecidas do mundo espiritual inferior que invadem o planeta ansiosas para transformar a abençoada Gaia em um núcleo de perversão, de crimes tornados legais pela desventura dos partidos políticos.
Não será esta a primeira vez que ocorrerá. Periodicamente o planeta vê-se assaltado pelas guerras e desvarios, tudo transformado em sombras e desencanto, mas subitamente raia o Sol da liberdade, dos direitos humanos, das democracias, dos valores éticos e Deus abençoa a humanidade, envolvendo-a em conquistas da beleza e da paz.
Renasça em nossos corações a esperança, porquanto todos fomos criados para a plenitude.

Divaldo Franco

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quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Fraternidade sempre!

 

Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós. (Mateus 7: 1,2)

Encontramos no dicionário da língua portuguesa, entre outras definições para a palavra fraternidade, as que seguem: Amor ou afeto em relação ao próximo; Boa convivência ou harmonia entre as pessoas, o que nos leva a deduzir que ser fraterno é antes de tudo buscar o bom convívio, a paz e a harmonia em nossas relações com o nosso próximo, no contexto em que a Soberana Sabedoria do Universo nos situou por misericórdia.
Quando alcançamos a bênção de compreender com a Doutrina Espírita que temos um passado de vidas anteriores à presente, em que nem sempre pautamos nossas relações com o nosso irmão de caminhada nos preceitos do Evangelho do nosso Mestre e Guia, que é Jesus de Nazaré, isso nos faz entender o porquê, quase sempre, nossas experiências e desafios de hoje causam-nos tantas dificuldades, dores e sofrimentos.
Mas há sempre uma porta aberta para nos libertar na busca de transformar os obstáculos de hoje em bênçãos para o amanhã com a Lei Divina do Trabalho, pela qual nos é permitido refazer em pensamentos, palavras e atos, uma imprescindível reforma íntima, pois que para isto, recursos não nos faltam em momento algum.
Preciso se faz que empreguemos os nossos melhores recursos intelectuais, morais e espirituais, movidos por uma vontade verdadeira para seguir com disciplina os exemplos daquele que é para nós “O Caminho a verdade e a Vida”, que nos impulsionaram na direção da caridade e do respeito ao nosso próximo, que conosco convive, o que nem sempre é tão simples. Somos naturalmente convidados a entender que precisamos ser os braços multiplicados do Amigo Maior da Humanidade e, nessas condições, é imprescindível nos movimentemos na execução dos nossos programas na fraternidade legítima.
Isto porque, nem todos os membros de nossa convivência social estão em condições de compreender conceitos tão fora de uso pela maioria dos indivíduos que preferem seguir os modismos ditados pelos padrões materialistas do mundo de hoje, onde os mais desrespeitosos, indecentes e atrevidos conquistam espaços e, até mesmo, a atenção e a inveja dos incautos que chegam ao cúmulo de admirar-lhes a “esperteza”.
É lastimável essa visão de tantos quanto ainda não despertaram para o fato de que a criminalidade em qualquer nível não tem outra consequência que não seja a desgraça causada pela infidelidade aos ensinamentos do Cristo que resumiu as Leis e os Profetas em “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”, e que mais tarde esses supostos “espertos” estarão às voltas com a realidade da Lei de Causa e Efeito, que lhes chamarão à prestação de contas, fazendo-os entender pela dor, que o crime jamais compensará.
Essa realidade está à vista de quem tiver olhos de ver as prisões lotadas desses irmãos, tolhidos em uma das maiores bênçãos que desfrutamos na vida, a liberdade de ir e vir, causada justamente pelas tais atitudes de esperteza, desrespeito etc., onde aprendem de forma dura, triste e lamentável que a honestidade, o respeito e a paz têm para todo indivíduo um valor inestimável.
O pior de tudo isso, é que não somente sofre o indivíduo encarcerado, mas também toda sua família, amigos e toda sociedade, pois, ninguém há que possa ser beneficiado em termos reais com a desgraça de um irmão em humanidade, um filho do mesmo Pai de todos nós, levado a infelicidade de uma vida de presidiário.
O espiritismo nos ensina a não julgar ninguém, entregar a Deus o justo direito do julgamento que só ELE pode avaliar com exatidão o melhor para cada filho seu. Cabe-nos orar, vibrar e a fazer ao outro o que gostaríamos que os outros nos fizessem em situações delicadas como a vida nas penitenciárias.

PRISÃO

“Mentalizemos a criatura recolhida à prisão para relacionar-lhes os aflitivos problemas.
Quase sempre chora sem lágrimas sob o azorrague do remorso a zurzir-lhe o espírito, arrependendo-se, tardiamente, da culpa que poderia ter evitado a preço de complacência.
Dia e noite, o relógio assinala-lhe os instantes amargos que se acumulam em cristalizações de angústia que, frequentemente, raiam no desespero.
Padece doloroso banimento social, em compulsória distância daqueles que mais ama….”(1)

Francisco Rebouças

Referência:
Xavier, Francisco Cândido, pelo espírito Emmanuel. Livro: Alvorada do Reino – Cap. 20 Prisão.

quarta-feira, 28 de julho de 2021

Nascer de novo


Existe um pensamento predominante entre os educadores de que as crianças são como uma tábua rasa ou folha em branco e que a relação com o meio constrói as estruturas de pensamento e do ser da criança. Nos relacionamentos sociais, no que a criança vivencia, está a base de seu caráter. Na revista Nova Escola[1] encontramos o eixo basilar deste pensamento. Ele provém do pensador inglês John Locke. No artigo de Márcio Ferrari, escrito na referida revista, ele descreve: “um aprendizado coerente com sua mais famosa afirmação: a mente humana é tábula rasa, expressão latina análoga à ideia de uma tela em branco”.
São possíveis várias linhas de pensamento sobre esta posição filosófica. Contudo, enfocaremos a criança como um ser humano que está em uma jornada de aprendizado através de um novo nascimento. Jesus nos ensina sobre este nascer de novo no encontro com Nicodemos. Respeitosamente, Nicodemos pergunta a Jesus: “...que deverei lançar mão para conhecer o Reino de Deus?” Jesus com seu poder de síntese, nos oferece esta profunda frase como resposta: “Ninguém poderá ver o Reino de Deus se não nascer de novo”.[2]
É uma referência clara à reencarnação, porém, nós temos no íntimo que a reencarnação é real? Ou a reencarnação é uma ideia sem grande importância para os dias atuais? Reflitamos! Quem nos alerta sobre a importância da reencarnação é Jesus. Nascer de novo está como condição para encontrar o reino de Deus.
Podem nos pairar algumas dúvidas: Como existem outras vidas, se não me lembro nada? Não há comprovação sobre isso: se já reencarnamos. Esta pode ser uma resposta racional quando pensamos em vidas sucessivas. Em contraponto a estas dúvidas, existem diversos estudos, livros sobre lembranças de outras vidas, mas mesmo assim as questões podem persistir e a reencarnação não se tornar algo concreto que se possa observar sua veracidade no cotidiano. Assim, no íntimo podem surgir dúvidas sobre outras existências, mesmo para os espíritas, que podem minimizar a importância do processo reencarnatório para evoluirmos.
Será que os espíritas, de certa forma ainda estão como Nicodemos? Um fariseu de bom coração, inteligente, mas ainda sem conseguir compreender a lei do nascer e renascer. Jesus respondeu para Nicodemos assim, ante sua dúvida: “Se vos falei de coisas terrestres e não crestes, como crereis se vos falar das coisas celestiais?”[3]
O saber sobre as múltiplas vidas é pôr em prática no íntimo e nas ações exteriores a compreensão da lei reencarnatória. Para tanto, é importante empreender o nosso melhor no ambiente humano que nascemos. O berço é o melhor lugar, ele molda-se às necessidades da evolução do Espírito.
“De conformidade com a regra, porém, nosso berço no mundo é o reflexo de nossas necessidades, cabendo a cada um de nós, quando na reencarnação, honrá-lo com trabalho digno de restauração, melhoria ou engrandecimento, na certeza de que a ele fomos trazidos ou atraídos, segundo os problemas da regeneração ou da mordomia de que carecemos na recomposição de nosso destino, perante o futuro.” (Emmanuel/F. C. Xavier: Pensamento e Vida. Cap. 11, p. 49. 19ª edição, FEB.)
A morada na Terra foi o lugar que escolhemos pela lei da sintonia, seja esta por sentimentos bons, ruins ou até pela nossa feição psicológica. O que temos no interior do ser se exterioriza a todo momento e atraímos aqueles com mesmo padrão vibrátil; é a parte psicológica a influenciar o renascimento. Emmanuel nos explica com propriedade:

“A chamada hereditariedade psicológica é, por isso, de algum modo, a natural aglutinação dos Espíritos que se afinam nas mes­mas atividades e inclinações.
Um grande artista ou um herói preemi­nente podem nascer em esfera estranha aos sentimentos nos quais se avultam. É a ma­nifestação do gênio pacientemente elaborado no bojo dos milênios, impondo os reflexos da sua individualidade em gigantesco trabalho criativo. Todavia, na senda habitual, o templo doméstico reúne aqueles que se retratam uns nos outros.” (Emmanuel/F. C. Xavier: Pensamento e Vida. Cap. 12, p. 52. 19ª edição, FEB.)

A nossa vida, como um todo, está entrelaçada de renascimentos. Não temos ideia de quanto o Espírito aferiu de aprendizado nas oportunidades do nascer novamente. Portanto, não temos tempo a perder, viver bem é harmonizar-se com o criador no trabalho diário de fraternidade e compreensão.
Por outro lado, não seria importante sabermos o passado reencarnatório, para bem encaminharmos o que fazemos no hoje? A título de reflexão, imaginemos que nesse instante, todas as lembranças, sentimentos bons, ruins, ações boas, destrutivas, que cometemos, surgissem na nossa tela mental. Como seria? Aguentaríamos equilibrar tantas informações a embaraçar o discernimento? Acredito que não teríamos maturidade para compreender se toda a estrada que percorremos nos diversos renascimentos brotasse toda de uma vez. Não conseguiríamos equilíbrio com o turbilhão de ideias, remorsos, perdas, acertos, ganâncias, encontros, desencontros a pulularem na mente. Não lembrar concretamente certos fatos também é imperioso para não trazermos o erro do passado para interferir no presente. Prejudicaria o propósito reencarnatório de harmonização.
O esquecimento é uma forma de permanecermos mais centrados, em harmonia interior com os propósitos de reajuste. Deus é sábio. Portanto, não somos uma tábua em branco, uma folha de papel para se escrever. O ser humano é muito mais complexo, temos uma verdadeira biblioteca no interior da mente. Muitas vidas e muitos aprendizados.
Por outro olhar, o renascer não acontece somente em uma nova vida. Quantos momentos passamos em que a estrada muda, se transforma em grandes desafios existenciais. Um trauma, uma dor profunda, afastamentos, encontros, reencontros, muitas vezes significam mudanças tão impactantes que poderemos dizer, metaforicamente, que foi um nascer de novo. Quem poderá dizer que não foi um renascer para Saulo encontrar Jesus no caminho de Damasco? Ele caiu vergado, cego, pela força poderosa do amor de Jesus. A proposta de renovação do mestre do amor ainda nos ofusca? Para Saulo, Jesus ofereceu a compreensão de Ananias que, com afeto, retirou a crosta dos seus olhos, fazendo-o ver novamente. Quem sabe, para nós, Jesus tenha ofertado o Espiritismo a nos banhar os olhos, para nos fazer enxergar as potencialidades de transformação que possuímos?

Nota da Redação:

O texto acima foi contemplado no concurso A Doutrina Explica – 2020-2021, promovido pelo Jornal Brasília Espírita (www.atualpa.org.br), com o objetivo de sensibilizar para a leitura, o uso da biblioteca espírita e levar a conhecer alguma metodologia de pesquisa para apoiar o estudo doutrinário, além de incentivar os participantes para o potencial de racionalização e explicação da realidade social e espiritual pela Doutrina Espírita.

[1] Revista Nova Escola - 01 de Outubro de 2008 – ou pelo site:
[2] Humberto de Campos/Fco. C. Xavier: Boa Nova. Cap. 14, p. 115. 3ª edição, FEB.
[3] Novo Testamento - S. João, 3:12

Gustavo Henrique de Lucena

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quinta-feira, 24 de junho de 2021

Aprimorando as qualidades!


Não é de estranhar que os adeptos da Doutrina Espírita, conscientes de suas responsabilidades perante a vida, estejam sempre preocupados em desenvolver suas atividades cotidianas da melhor forma possível, com o claro objetivo de evitarem as consequências lastimáveis da dor da consciência incomodada pelo desperdício das oportunidades que a vida lhes propõe.

“Nem todos conseguem, de improviso, realizar feitos heroicos ou desfrutar encargos de grande elevação, como sejam: apresentar uma vida sem erros; dirigir sabiamente a comunidade; ser um gênio na sublimação da inteligência; conservar equilíbrio invulnerável, a ponto de ser um modelo acabado de virtude; dispor de fortuna para garantir a beneficência; ou manejar o poder para a felicidade geral.
Mas todos podemos, seja onde for, dizer a boa palavra, esboçar o gesto de simpatia, estimular a cooperação fraternal, abençoar com a prece e auxiliar pelo prazer de servir.
Em resumo, nem todos estamos habilitados, de pronto, a desempenhar as funções da lâmpada perfeita do Eterno Bem, cuja luz remove as trevas do mal; entretanto, cada um de nós, onde esteja, pode e deve ser um pequenino raio de amor ou luz!” (1)

O verdadeiro espírita é alguém detentor de conhecimentos da vida para além do presente período de vida física; por essa razão é justo que guarde a lembrança de fazer sempre o bem cada vez mais e melhor, sabendo que não deve se deixar deter nas ilusões ou inibições na crença na fé raciocinada proposta pela doutrina espírita aos seus fiéis seguidores afirmando que “Fora da caridade não há Salvação “. (2)

Não podemos mais em sã consciência alegar desconhecimento das Sábias e Imutáveis Leis Divinas, que devolve a cada criatura, segundo seus merecimentos.
No mundo espiritual, quando da volta do Espírito após as experiências da vida física, encontraremos a nos esperar nossas construções positivas e negativas que nos proporcionarão paz ou intranquilidade, pois somos sabedores de que fomos educados pela doutrina consoladora e esclarecedora do Espiritismo quanto aos impositivos do bem e da verdade, que seguimos ou não tornando-nos construtores de nossa felicidade ou dos nossos tormentos.
Não nos faltam, em momento algum, as lições e exemplos de Jesus nas incontáveis páginas que temos à disposição e que se não tirarmos proveito será por livre vontade.
Fácil fica deduzir que perante os claros, lógicos e convincentes ensinamentos do Espiritismo, é certo esperar que a consciência do seu verdadeiro seguidor lhe solicite atitudes condizentes com o que os Imortais vieram nos lembrar dos ensinos e exemplos de Jesus nosso Mestre e guia.

Referências:
(1) Xavier, Francisco Cândido pelo Espírito AlbinoTeixeira. Livro Aulas da Vida, cap. Na Seara de Luz; e
(2) Kardec Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, FEB. 121 edição, cap. 15.

Francisco Rebouças

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terça-feira, 1 de junho de 2021

O Dever e a Paz


“Bem aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.” (Mateus 5:9)

Como podemos viver em paz em meio a tantas tribulações, violência, corrupção, tragédias, conflitos de relacionamentos? São empecilhos para a tranquilidade tão almejada?
A verdade é que os problemas existem e, se continuarmos buscando a paz no ambiente externo, não vamos encontrá-la, afinal a paz legítima não significa ausência de problemas; ela provém dos nossos sentimentos e capacidade de lidar com os percalços da vida.
Nossas fragilidades e desequilíbrios íntimos são antagônicos à paz, frutos do egoísmo e do orgulho, impedindo-nos de perdoar, buscar a humildade e de compreender o próximo. Para tanto, necessário se faz um exame interno, auscultando as profundezas da alma, identificando as imperfeições que estão bloqueando o avanço do Espírito para a paz e, assim, promover a desconstrução dos nossos sentimentos egóicos.
Nesse sentido, a doutrina espírita, que amplia a mensagem do Cristo, é uma poderosa ferramenta para se obter a paz, já que nos convida a uma reflexão intensa, apresentando a chave do progresso individual através do conhecimento de si mesmo, conforme nos orienta o benfeitor espiritual Santo Agostinho na questão 919a de O Livro dos Espíritos: “ Examinai o que pudestes ter obrado primeiro contra Deus, depois contra o vosso próximo e finalmente contra vós mesmos. As respostas vos darão, ou o descanso para a vossa consciência, ou a indicação de um mal que precise ser curado.”
Exigimos a paz exterior (do mundo) mas, em nossa vida, muitas vezes somos nós os responsáveis por conflitos de relacionamentos, promovendo desarmonia e nos afastando da Lei Divina. Isso está em consonância com nossa posição de Espíritos imperfeitos, inseridos em um mundo de provas e expiações. No entanto, somos filhos de Deus, criados para o amor, todos irmãos, em diferentes níveis de maturidade psíquica. A nossa meta deve ser a fraternidade universal, aprendendo a amar o próximo e fazer a ele somente o que desejaríamos que fosse feito para nós.
Conforme ressalta a benfeitora espiritual Joanna de Ângelis: “Não sejais aquele que se transforma em obstáculo ao bem, criando situações embaraçosas que se convertem em amargura noutrem.”(Vitória sobre a depressão – Joanna de Ângelis/Divaldo P. Franco.)
Um caminho para a paz interior proposto por Kardec através do Espírito Lázaro, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, item 7, capítulo XVII: “ Na ordem dos sentimentos, o dever é muito difícil de ser cumprido, porque se acha em antagonismo com as seduções e interesses do coração; suas vitórias não têm testemunho e suas derrotas não têm repressão. O dever íntimo do homem está entregue ao seu livre arbítrio: o aguilhão da consciência, esse guardião da probidade interior, o adverte e o sustenta, mas permanece, frequentemente impotente, diante dos sofismas da paixão. O dever do coração, como precisá-lo? Onde começa ele? Onde se detém? O dever começa precisamente do ponto em que ameaçais a felicidade ou a tranquilidade do vosso próximo; termina no limite que não gostaríeis de ver ultrapassado em relação a vós mesmos.”
Portanto, o convite amoroso para esse trabalho íntimo e para a condução dos relacionamentos encontra-se no dever, que é fonte de paz e alegria.
Importa mesmo percorrer esse caminho de desenvolvimento de virtudes, pensando, sentindo e agindo no bem. Assim, realizaremos o encontro com a paz da consciência do dever cumprido e, pacificados, encontraremos a paz do mundo.

Karina Rafaelli

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quarta-feira, 5 de maio de 2021

Fé, esperança e caridade


Se tivessem a fé de um grão de mostarda, transportariam montanhas. - Jesus

Tema recorrente dentro da Doutrina espírita, mas sempre vale a pena conversar um pouco mais, pois nossa evolução depende muito desses três ensinamentos.
Nas nossas preces sempre pedimos a Deus ‘dai-nos a fé’, assim ficamos aqui pensando sobre essa nossa colocação de muitas vezes pedir fé.
Fé, vem do latim, que significa firme opinião de que algo é verdade, sem a necessidade de prova ou um critério objetivo.
Esperança, um estado de espírito que acompanha a fé. Elas são amigas inseparáveis.
Fé e esperança podem ser comparadas ao Sol e à lua. A lua não tem luz própria, mas usa da luz do Sol para brilhar. Assim a esperança depende da fé para se estabelecer em nossas vidas.
A fé na doutrina espírita diferencia-se um pouco dos demais segmentos religiosos, pois ela se baseia dentro de um estudo criterioso, ou pelo menos deveria ser assim, nos dando uma esperança para dias melhores, seja na matéria ou na vida espiritual, dentro do conhecimento das imutáveis Leis de Deus e de nossas ações positivas, éticas e construtivas. Ter esperança na verdadeira justiça e não na justiça humana que em muitas vezes está adequada a interesses e épocas. Precisamos desenvolver a esperança do justo, daquele que procurou fazer de seus pensamentos, palavra e atos, provas de verdadeira caridade, trabalho e mudanças íntimas profundas.
Justamente a fé e a esperança nos fazem lembrar da frase de Chico, quando ele dizia, isso vai passar... Quando ele nos convida a ter paciência, tolerância e força de vontade, para resistir aos problemas que aparecem, pois são como tudo nessa vida, temporário.
Como alguém pode dizer que uma tormenta ou uma alegria vai passar? Porque está balizada na fé em Deus e na esperança de suas Leis. Pois a única alegria que nunca vai passar será aquela que tem como base a caridade, pois essa é a alegria de servir. Precisamos desenvolver a caridade no olhar, no falar, no pensar, nas ações e tudo aqui que venha enobrecer o homem.
Assim, dentro da fé profunda e da esperança ativa, construiremos o maior de todos os sentimentos do homem de bem, a caridade, na sua mais profunda expressão de amor e dedicação ao próximo.
Caridade, como nos ensina Paulo, é a maior de todas as virtudes do espírito; fé e esperança são sentimentos nobres que devem e precisam ser cultivados, mas a que vai calar profundamente dentro de nós é a caridade. A fé nos faz acreditar, a esperança nos leva a esperar e a Caridade nos faz agir.
Caridade também chamada de Amor. Precisamos entender que o exercício da Caridade realiza no íntimo do ser profundas mudanças que nos conduzem à fé, consequentemente à esperança, pois podemos ver os frutos dessa luta incessante.
Hoje passamos momentos difíceis, mas na época de Jesus as coisas também não eram fáceis. O nosso grande problema está na nossa necessidade de exaltar nosso ego. Muito difícil em nossas atividades, decisões e comportamento, aniquilar ou pelo menos reduzir nossas vaidades, portanto, nosso orgulho. Mas hoje muitos companheiros de jornada enfrentam grandes dores, problemas de saúde, financeiro, entre outros, e nós precisamos nessa hora realizar tudo aquilo que está ao nosso alcance e quem sabe ir mais além. Tudo segue o rumo preparado por Deus; devemos confiar, seguir e agir no caminho do bem. Por isso disse Jesus: A minha paz vos dou, a minha paz vou deixo, mas não a paz do mundo...
Lembre-se sempre que na espiritualidade temos muitos irmãos torcendo por nós e nos ajudando, por isso devemos cultivar a fé e a esperança, mas nunca a fé cega. Também vamos sempre trabalhar pela fé e com a caridade.
Precisamos sempre fazer com que as nossas ações sejam marcadas pela caridade pura. Essa Caridade estará sempre baseada na fé e na esperança que não morre jamais.

Wagner Ideali

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quinta-feira, 29 de abril de 2021

O respeito pela vida.


O respeito pela vida abrange o sentimento de alta consideração por tudo quanto existe.
Não apenas se detém na pessoa, mas em todas as expressões da natureza.
Quando não existe essa manifestação, os valores éticos se enfraquecem e todos os anseios superiores perdem a significação.
A criatura humana, impulsionada por ilusões da conquista do sucesso aparente, tem se esquecido disso, sem se dar conta da gravidade de tal atitude.
O egoísmo tem controlado os sentimentos, impondo o seu interesse, em detrimento de todos os valores mais dignos.
Os membros da sociedade têm sido separados lamentavelmente, dividindo-se em classes medidas pelos recursos sociais, econômicos, porém, nunca os morais.
Surge, então, um inevitável abismo entre os seres. Reações de animosidade se convertem em ódios tolos, abrindo campo para as batalhas da violência doméstica e urbana.
Quando mais intensos, se apresentam como atos de terrorismo e guerras odientas.
Alguns acreditam que, possuindo dinheiro e desfrutando de projeção política ou social, serão capazes de conseguir afeição e companheirismo. Amargo engano.
Afeto e amizade não se compram, nem tampouco se impõem. Alguns se deixam seduzir por esses recursos transitórios.
Iludem-se pensando que a criatura pode ser identificada pelo que possui e não pelo que realmente é.
Todas essas fantasias, no entanto, são passageiras, porque as riquezas trocam de mãos rapidamente.
A beleza e o poder não enfeitam as mesmas faces por longos anos.
Tocadas pela brisa do tempo, elas desaparecem a olhos vistos, e cedem lugar à verdadeira essência dos seres.
Ninguém consegue ser feliz individualmente no deserto que cria para si mesmo ou numa ilha isolada da convivência social.
Tentando ignorar essa verdade, muitos se valem de subterfúgios infelizes. Buscam no álcool, nas drogas químicas, na baixeza emocional e sexual, a fuga da solidão e do desconforto em que vivem.
Esse é outro equívoco que conduz a tragédias ainda mais dolorosas. A vida só se faz digna e próspera, quando se estrutura na pedra fundamental do respeito.
O respeito pela vida eleva o padrão de conduta, dignificando aqueles a quem é direcionado e elevando moralmente quem assim se comporta.
A honestidade, por sua vez, indispensável no sucesso dos relacionamentos humanos, proporciona confiança e bem-estar aos seres.

* * *

Elaboremos uma lista de desafios íntimos que nos possam conduzir a situações embaraçosas.
Trabalhemos item a item, cada dia, experimentando as alegrias que decorrem do respeito pela vida.
Redescobriremos o amor e a satisfação de repartir e de compartilhar os júbilos com o próximo.
Constataremos o resultado decorrente da renovação íntima que nos dispomos realizar.
Respeitando a vida, passaremos a ser respeitados e estimados por todas as expressões dela própria.
Notaremos em nós mesmos a indescritível satisfação de estar em paz com a própria consciência.
Lembremos: a vida é sublime concessão de Deus, que não pode ser desconsiderada, por quem quer que seja.

Redação do Momento Espírita.

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sexta-feira, 2 de abril de 2021

A navalha de Occam


É fácil escrever difícil. Basta colocar no papel as ideias que surgem no bestunto, ainda que, não raro, desandem em destemperos mentais.
Difícil é escrever fácil. Exige demorada e árdua elaboração para tornar a leitura elegante, atraente e objetiva, sem impor prodígios de concentração e entendimento.
Trata-se de uma gentileza que todo autor esclarecido deve ao leitor que se dispõe a examinar suas criações. O texto que exige cuidadosa interpretação é mais charada do que literatura. Fica por conta da capacidade de quem lê, no empenho em orientar-se por labirintos tortuosos, fruto dos devaneios do autor.
Jesus dizia que a verdade está ao alcance dos simples.
Os doutos e entendidos costumam sofrer uma intoxicação intelectual que oblitera o bom senso e os leva a imaginar que tortuosidade e complexidade são sinônimos de cultura e saber.
A propósito vale lembrar Guilherme de Occam (1285-1349), notável teólogo e filósofo inglês (nascido em Occam, nos arredores de Londres). Ingressou bem jovem na ordem franciscana. Estudou e lecionou na gloriosa universidade de Oxford.
Inteligente e lúcido estimava a simplicidade na exposição de suas ideias. Complexidades ou conjecturas, apenas se absolutamente necessárias.
Adotou um princípio que ficaria conhecido como a navalha de Occam, definindo o empenho em retirar de um pensamento ou de uma tese acessórios e complicações desnecessários, louvando-se no bom senso.
Se a aplicássemos em textos herméticos e obscuros dos filósofos que fazem a história das contradições do pensamento humano, seria uma “carnificina”. Pouco sobraria.

***

Nem sempre Occam conseguiu usar sua navalha.
Aconteceu particularmente em relação à existência de Deus, assunto que preferia não abordar. Não a negava, mas considerava que, devido à transcendência do tema, seria impossível conjeturar sobre o Criador sem recorrer a argumentos complexos, de difícil entendimento.
Os Espíritos que orientaram a codificação da Doutrina Espírita ensinaram diferente. Dotados de notável capacidade de síntese, própria da sabedoria autêntica, demonstraram que é possível passar a navalha de Occam em lucubrações complexas e reduzir a argumentação em favor da existência de Deus à sua expressão mais singela.
Isso acontece na questão número quatro, em O Livro dos Espíritos.

Pergunta Kardec:

Onde se pode encontrar a prova da existência de Deus?

Resposta:

Num axioma que aplicais às vossas ciências. Não há efeito sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem e a vossa razão responderá.

Comenta Kardec:

Para crer-se em Deus, basta se lance o olhar sobre as obras da Criação. O Universo existe, logo tem uma causa. Duvidar da existência de Deus é negar que todo efeito tem uma causa e avançar que o nada pode fazer alguma coisa.

Simplíssimo! Se o Universo é um efeito inteligente, tão superior ao nosso entendimento que seus segredos são inabordáveis, forçosamente tem um autor infinitamente inteligente – Deus.
A partir dessa ideia o difícil é provar que Deus não existe. Teríamos que explicar o efeito sem causa, a criação sem um Criador.
Quaisquer argumentos em favor desta tese ingrata seriam facilmente eliminados pelo próprio Occam, usando a navalha do bom senso.

Richard Simonetti

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sexta-feira, 19 de março de 2021

A essência da verdadeira beleza


Lucinha saiu de seu quarto correndo e adentrou-se ao banheiro onde ficou por horas em frente ao espelho. Iria se encontrar com o seu crush1 e queria impressioná-lo.
Além do encontro marcado, precisava também aproveitar o momento para tirar novos selfies2. Afinal, toda aquela atividade de maquiagem, cabelo, limpeza de pele, entre outras, precisava ser compartilhado em suas redes sociais. Da forma como estava linda, certamente ganharia alguns likes3 de seus amigos e seguidores.
Concluída toda aquela etapa, pegou o celular e começou a navegar pelas redes sociais. “Se estou linda e maravilhosa, como estarão meus close friends4 agora?” – pensou antes de publicar as suas fotos.
A primeira imagem que viu foi de uma amiga de “olhos claros e pele de maçã”, descrevendo-a assim, com uma admiração indignada. “Que inveja” – pensou – “ela arrasou”, concluiu.
Deslizando o indicador na tela do telefone, chegou ao perfil de outra amiga de uma “beleza negra incrível e um corpo todo malhado” – e já com o humor alterado, exclamou em voz alta, acrescentando: -“assim não dá!”.
Por último, abriu outro perfil e viu três amigas juntas, preparadas para uma festa; “cada uma mais deslumbrante que a outra. Chega!” – exclamou mais uma vez, totalmente aborrecida com as comparações infelizes enxertadas pela percepção míope de si mesma.
Do entusiasmo explosivo à depressão abrupta, olhou novamente para o espelho e disse: – “Nossa, estou horrível! Não vou mais a lugar algum!” Batendo a porta do banheiro se enfurnou no quarto de onde só voltou a sair no dia seguinte.

* * *

Em um mundo onde as redes sociais ganharam um espaço significativo na mente de muitos, temas como a beleza, a riqueza e a ostentação, entre tantos, parecem catalisar uma corrida desenfreada entre aqueles que comungam com esses valores.
Atendo-se ao primeiro, a beleza, rostos esculpidos em maquiagens e adornos se equilibram em corpos em movimento cuja dinâmica, muitas vezes, transcende o limite entre o normal e o amoral, levando a derrocadas exposições desnecessárias do íntimo humano.
No emaranhado de imagens da internet que transitam da simples naturalidade até a vaidade e o orgulho, pode-se então levantar a questão de onde está a essência da verdadeira beleza.
Evoluindo por séculos, o ser humano vem perdendo aos poucos a rudeza dos traços, a animalidade da expressão e a crueza do olhar (1) percebidas em registros preservados que datam do alvorecer de nossa humanidade.
Deixando para trás instintos ríspidos e avançando em valores morais mais depurados, o homem vem refletindo em seu corpo material, como envoltório externo, a evolução do espírito após diversas encarnações, tornando-se uma criatura cada vez mais harmoniosa em seus traços físicos.
Considerando que em nosso plano terrestre convivemos com diversos níveis de espíritos que vão desde a condição de irmãos menos favorecidos na senda do bem até aqueles mais evoluídos dentro de uma faixa pertinente ao nosso mundo de expiações e provas, encontramos aqui uma diversidade de faces que nos envolvem ainda em ares que vão do assombro à graça.
Neste contexto, cada um, em sua individualidade, ostenta uma beleza própria do ser, independente da perspectiva e do modelo social adotado. Alguns, mesmo detentores de curvas menos harmônicas em seus rostos e corpos, transmitem um carisma, uma beleza e um magnetismo inexplicáveis. Outros, mesmo levando consigo desenhos, teoricamente, perfeitos, exalam uma repulsa sem razão, possuindo apenas uma beleza plástica (1).
Uma vez aceitas estas argumentações, firmadas na razão e na lei do progresso, conclui-se que a essência da verdadeira beleza está na pureza da alma. Quanto mais o ser humano se eleva em suas condições morais, tanto maior será a beleza angélica (1) refletida em seu corpo físico.
Logo, ainda em nossa condição de aprendizes dos valores morais do Evangelho deixado por Jesus, busquemos no amor e na caridade refletir a beleza sublime dos anjos de luz em nossos atos e ações. Esta é, de fato, a essência da verdadeira beleza que devemos perceber no próximo e em nós mesmos.

Referências Bibliográficas:

KARDEC, Allan. Obras Póstumas. Teoria da Beleza. Trad. de Evandro Noleto Bezerra. Brasília: FEB, 2016. 2 ed.

Notas do Autor:

Termos usualmente empregado pelo público jovem foi transcrito no texto, quais sejam:

1 indica uma paquera, um namoro, um flerte;

2 foto tirada de si mesmo;

3 indica que uma postagem em uma rede social foi apreciada; e

4 do inglês, usado em rede sociais para indicar amigos próximos.


Márcio Martins da Silva Costa

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quarta-feira, 10 de março de 2021

Um coração de mãe perante a desencarnação dos filhos


Se há circunstância bastante desafiadora para o coração de mãe é ter que sepultar o próprio filho. Lorelei Go, mãe de três filhos , “perdeu” os 3 filhos para o câncer de fígado em um pequeno intervalo de 4 anos.
Rowden, o seu filho mais velho, foi diagnosticado com câncer de fígado em estágio 4 e desencarnou em 2014. Apenas um ano mais tarde, Lorelei Go estaria enterrando o seu filho do meio, Hasset que sofria do mesmo câncer de fígado. O filho mais novo, Hisham também foi diagnosticado com câncer de fígado e embora tenha se submetido a diversos tratamentos, incluindo uma criocirurgia experimental na China, pouco mais de dois anos após o falecimento de Hasset, Lorelei teve que sepultar o seu último filho de apenas 27 anos.
Conquanto Lorelei tenha experimentado um momento no qual questionou as leis de Deus, porém percebeu que aquele era um teste de fortalecimento das suas convicções. Como uma pessoa de fé, ela decidiu pensar em seus filhos em condições mais agradáveis no além tumba, e preserva a esperança do momento no qual ela poderá se reencontrar com eles. Isso, segundo ela, é o que a dá forças. Quando falou com o GMA Public affairs, Lorelei disse que sabe que tudo isso faz parte dos planos de Deus para “testar e fortalecer a minha fé”, como citado pela goodtimes.my.
Poucos são os que estão preparados para receber a notícia de que um filho tem um câncer voraz. E muito menos para ver o filho perder a batalha para a doença. Contudo, urge que pacifiquemos a consciência em vez de nos infelicitarmos quando for dos desígnios de Deus retirar do corpo um de nossos filhos deste planeta de prova e expiação.
Segundo interpretações apressadas, concebemos que muitas situações chamadas de infelicidade, cessam com a vida física e encontram a sua compensação na vida além-túmulo. Emmanuel, com a nobre sensibilidade que lhe assinala o modo de ser, considera que “nenhum sofrimento, na Terra, será talvez comparável ao daquele coração que se debruça sobre outro coração regelado e querido que o ataúde transporta para o grande silêncio. E acentua, convincente: “Digam aqueles que já estreitaram de encontro ao peito um filhinho transfigurado em anjo da agonia. [1]
Em realidade, ante aqueles que demandam a Vida na Espiritualidade, o comportamento do espírita é algo diferente, ou pelo menos deve ser diferente, variando, contudo, de pessoa a pessoa, com prevalência, evidentemente, de fatores ligados à fé e à emotividade.
Nesses instantes cruciais do sepultamento de um filhinho o espírita chora discreto, mas se fortalece na oração. Na certeza da Imortalidade gloriosa, domina o pranto que desliza na fisionomia sofrida e busca na esperança uma das virtudes evangélicas, o bálsamo para a saudade justa.
O Espírita consciente nunca se entrega à desesperação. Não fraqueja ante os convites da rebeldia, porque sabe que revolta é insubordinação ante a Magna Vontade do Criador, que o espírita aprende a compreender e acolher, paradoxal e inexplicavelmente jubiloso, por dentro, vergado conquanto ao peso das mais agudas agonias.

Referências bibliográficas:

[1] PARALVA, J. Martins. O pensamento de Emmanuel, RJ: Ed FEB, 1990

Jorge Hessen

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terça-feira, 2 de março de 2021

A Serenidade


A serenidade nada tem a ver com a preguiça. O sentido dela é mostrar-nos o trabalho honesto. Serenidade imperturbável somente se vê nos seres elevados, nos espíritos que já alcançaram a verdade e vivem com a consciência no esplendor das leis de Deus. Brandura permanente na alma carece de movimentos nobres do coração. O egoísta não pode ter serenidade, por concentrar em si vibrações inferiores. O orgulho alimenta todas as espécies de inferioridade que te perturbam os sentimentos mais elevados.
Quem deseja alcançar a serenidade deve combater o orgulho e o egoísmo; eles são responsáveis pelos distúrbios de todas as manifestações do bem nos caminhos dos homens e mesmo dos espíritos desencarnados que não se libertam destes monstros devoradores. Olha para tuas mãos e vê o que elas estão fazendo em favor dos outros. Se paradas, estimula-as no trabalho do amor aos outros. Se paradas, estimula-as no trabalho do amor, compreendendo que fora dele não existe salvação. Liberta-te pelo seu exercício todos os dias. Não precisas gastar dinheiro para amar, o amor é um dom dentro de cada criatura, doado por Deus e que deve ser estimulado por nós. Ele é tão divino que, quanto mais se ama, mais cresce dentro d’alma. Assim são todas as outras virtudes ensinadas por Jesus. Conversa, meu filho, com quem quer que seja, sem esquecer a serenidade; ela te ajuda no equilíbrio da vida.
No labor diário, pensa na serenidade, que tudo sai das tuas mãos. Mesmo no momento de orar, invoca a serenidade. A vida é a maior doadora destes bens eternos, e Deus, sendo Pai de todas as criaturas, tudo nos oferta com abundância. Ele é o Suprimento Divino e fecundador universal. Confia no Senhor e nada te faltará. Quando sentares à mesa de refeição, não te esqueças da serenidade, pois também comes o que pensas e estás juntando ao repasto a serenidade como saúde para o corpo e paz para o espírito. Assim, ao beberes a água, deixa que os goles desçam com serenidade refrescando os teus órgãos e levando energias superiores ao teu mundo espiritual. Faze esses simples exercícios e verás como são saudáveis. A felicidade te visita todos os momentos; compreende essa aproximação e desfruta dessas ofertas de Deus nos teus caminhos.
A medicina do futuro está em tua mente, mas é preciso que ela seja educada, e para tanto, Jesus, o Mestre dos mestres, nos legou o Evangelho que instrui e renova, que alimenta e aprimora, que alegra e dá vida aos tristes e aos mortos. A serenidade é estágio de superioridade; busca-a, que ela te atenderá pelos meios que Deus ajuda sempre. O teu exemplo de paz interna diante dos outros é um estímulo para que eles igualmente se esforcem para adquirir esse clima de luz. Não percas oportunidade de semear a serenidade pelo exemplo, pela palavra, pelos gestos, que são unidades de luz que se multiplicam por onde passam, que iluminam onde servem.
A serenidade é filha da alegria e neta do amor.

Pelo Espírito: Miramez
Psicografia de: João Nunes Maia
Livro: Força Soberana
5ª Edição 2002 – Editora Espírita Fonte Viva
Páginas: 119 até 122 – Belo Horizonte – 1986


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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Viver no Mundo sem ser do Mundo


Frase que dá título a este artigo é de autoria de Cairbar Schutel e consta do livro de sua autoria, Parábolas e Ensino de Jesus.
Estudando sobre a vida na Terra e a vida eterna, o autor ensina que “o escopo da vida na Terra é o aperfeiçoamento do espírito. Aquele que assim compreende, eleva-se, dignifica-se, e, livre dos entraves materiais, sobe às alturas inacessíveis ao sofrimento, alcançando a felicidade eterna”.
No entanto, são poucos, muitos poucos, os que têm essa compreensão e que desde logo procuram aproveitar a oportunidade que a presente existência nos oferece para realizar, com verdade e denodo, a transformação moral, objetivo principal da vida terrena.
Todos nascemos e renascemos em obediência ao comando divino chamado Lei do Progresso. Por conseguinte, “não estamos aqui para derrotas, mas para sermos vitoriosos”, conforme feliz afirmação da pedagoga Heloísa Pires.
De fato, todos aqueles que se dispõem a trabalhar no terreno do bem, perseguindo, incansavelmente, em cada gesto, a renovação e a reforma íntima, conseguirão dar largos passos no caminho traçado por Deus. Eis a fórmula da felicidade, tendo em conta que, na esteira do que ensinou Jesus, “a cada um será dado segundo suas obras”.
Acontece, porém, que a grande maioria da humanidade não procura conhecer as verdades contidas nas lições constantes que a vida nos oferece. Lançam as suas preocupações e os seus esforços para amealhar as efêmeras alegrias do mundo. Acumulam tesouros em local errado, como diria o Mestre, onde não há sorriso que não comporte a herança de uma lágrima, nem gozo material satisfeito que não recaia no enfado, no fastio. Mas o destino do espírito não é se enfastiar, nem tombar exausto no abismo da saciedade. O corpo, esse poderá saciar-se, mas o espírito não se aquieta enquanto sedento de luz, faminto de justiça e de saber, ansioso por conquistar a felicidade que não passa.
As festas dos prazeres materiais, que privilegiam os sentidos, levam o homem a uma felicidade fictícia, irreal, as quais, em contradição com as suas aparências, são muito tristes. Quantas responsabilidades contraem os que navegam sem bússola nos mares do gozo! Quanta degradação! Quanta obcecação! Pobres aqueles que buscam flores onde só se pode encontrar espinhos.
O espiritismo não condena o gozo. Embora estejamos sujeitos a expiações e provas, das quais necessitamos e com as quais nos comprometemos, Deus quer que sejamos felizes. Mas esse gozo deve ser racional, belo. Não se confunde com a concupiscência, com a irresponsabilidade, com a leviandade de quem só conhece direitos e não enxerga obrigações.
Todos necessitamos almejar uma vida melhor, usufruindo os bens que a Terra nos oferece. Mas para isso exige-se discernimento, sabedoria. Quem opta por degradantes deslizes, certamente colherá conseqüências que nos serão cobradas na volta para o mundo espiritual, nossa verdadeira morada e, ainda, em novas reencarnações aqui ou em outros mundos para onde seremos levados pela Lei de Afinidade.
Os que reconhecem seus erros, os arrependidos e submissos, precisam tomar o caminho de volta à “Casa Paterna”, como ensina Jesus através da parábola do filho pródigo. Este retorno representa o reinício de uma nova vida, preparando-se para a viagem que todos teremos que fazer através do fenômeno morte ou desencarnação, como leciona o espiritismo.
Na mesma trilha, ainda lembramos as palavras de Cairbar Schutel: “Quem luta pelo seu aperfeiçoamento no campo do saber e do amor, eleva-se, dignifica-se, e, livre dos entraves materiais, sobe às alturas inacessíveis ao sofrimento, alcançando, dessa forma e só assim, a felicidade real, tão desejada por todos. Aquele que não quer compreender rebaixa-se, desmoraliza-se, e, absorvido pelas paixões, desce às voragens da dor, para expiar e reparar as faltas, as transgressões das leis divinas. (…) A vida na Terra, para os que acumulam tesouros nos Céus, é a senda luminosa que liga a Terra aos Céus, é a estrada comunicativa que lhes permite a passagem para se apossarem desse tesouro. Os que vivem na Terra pela Terra, são da Terra; os que vivem na Terra sem serem da Terra, são dos Céus. A vida na Terra é efêmera; a Vida nos Céus é eterna, e a posse da Vida Eterna consiste no cumprimento da Lei: ‘Buscai o Reino de Deus e a sua justiça, que tudo o mais vos será dado por acréscimo’, como nos ensinou Jesus”

Édo Mariani
https://artigosespiritas.wordpress.com/2011/10/30/viver-no-mundo-sem-ser-do-mundo/

Jornal “O Espírita Fluminense”
Instituto Espírita Bezerra de Menezes – IEBM – Niterói – RJ

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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Desilusões e Decepções


Mesmo que não pareça, pela dor que causa, desiludir-se é bom. Desiludir-se é sair de uma ilusão, de uma visão distorcida ou equivocada acerca de alguém, de algo, de alguma circunstância. Portanto, a desilusão é benéfica, apesar dos dissabores que inicialmente pode causar. Com o tempo e o amadurecimento, as desilusões passam até a ser bem-vindas, pois indicam crescimento interior.
As decepções possuem outras características. É expectativa frustrada. Decepcionar-se é esperar demais de uma situação ou de alguém e não ter os resultados esperados. Em muitos casos, desilusão e decepção se fundem num só sentimento de abatimento moral, de desânimo e, por vezes, de descrença.
Muitos estão decepcionados com a humanidade que, apesar do grande número de seres moralmente e espiritualmente superiores que por aqui tem passado, permanece no atraso. Evoluímos muito em técnicas e mesmo em ciência, mas tão pouco em valores humanos e espirituais. Os apelos do mundo externo são tão fortes que muitos vivem em sua função. Deles se nutrem e para eles vivem. A desilusão os aguarda após o retorno à verdadeira vida.
Outros estão decepcionados com a sociedade que criamos, que valoriza em demasia o ter, o possuir, e tão pouco o ser, o caráter, as qualidades e as virtudes morais. Quando falamos de virtudes não nos referimos a crenças em particular. O homem de bem independe de uma crença. Ele faz o bem porque é bom, com naturalidade, sem esperar nada em troca.
Não são poucos os que veem nossa humanidade como uma locomotiva prestes a descarrilar. É como se tivéssemos entrado em alta velocidade num nevoeiro, sem saber o que vem em seguida. Um mundo de inseguranças e incertezas, de medos e de sensação de impotência. Estamos tentando acionar os freios, rever as rotas, corrigir os erros, mas… os que fazem isso ainda são minoria.
Imenso número de pessoas pelo mundo está decepcionado e desiludido com a política e com os políticos. Passou o tempo das mentiras, dos segredos e dos silêncios. Graças à internet quase tudo se torno público em tempo real e fica difícil, cada vez mais difícil, mentir e ganhar tempo para manipular o povo.
É errado desprezar a política, pois essa é a vida de relação. Tudo o que fazemos tem caráter político, seja por ação ou omissão. A política partidária é outra coisa. Mostra-se esgotada no atual modelo. Não tem caráter representativo e o pragmatismo favorece grupos. É uma luta pelo poder, pelo controle, pela condução do povo segundo critérios de grupos dominantes.
Mas não podemos nos esquecer de que esse mesmo mecanismo pode ser usado para o bem. Se grupos de pessoas à altura da tarefa assumem o controle político de nações, esses mecanismos podem servir para a construção de sociedades justas, equilibradas, mas fraternas, onde o estímulo ao respeito às diferenças são freqüentes, eliminando – pouco a pouco -, as disposições mentais para o confronto.
Há muita, muita gente mesmo, decepcionada e desiludida com as crenças, seitas e religiões. O deus mercado, o bezerro de ouro, aparentemente – ou temporariamente – venceu. Praticamente tudo gira em torno do dinheiro e do poder temporal. O Criador anda ausente nos discursos e preleções. Jesus, Buda, Sócrates e tantos outros luminares da humanidade, são citados de passagem por mera conveniência retórica; como uma pitada de sal na mistura de ideias, num esforço para lhes dar algum sabor.
Nem a Doutrina Espírita vem escapando dessa prática. É natural que ela se apresente com aspectos novos, como desejava e previa Allan Kardec. Uma doutrina evolucionária e revolucionária, que acompanhe a ciência e os conhecimentos humanos, autocorrigindo-se onde e quando preciso, fazendo das obras do codificador um ponto de partida e não de chegada. É cada vez menor o número de leitores de obras com certa densidade e há, até mesmo, desprezo pelo conhecimento.
Quase não há mais pesquisa dos aspectos científicos da paranormalidade. Há pouca ou nenhuma reflexão filosófica e sobram repetições de trechos evangélicos, muitas vezes mal alinhavados, mal interpretados ou claramente adaptados a interesses de grupos. O senso crítico, autocrítico e o bom senso, recomendados pelo codificador, andam igualmente se afastando do movimento espírita que – em certos casos – se vê às voltas com a mentalidade de rebanho, seguindo pessoas e não mais a Doutrina Espírita.

Coisa para se pensar!

Paulo R. Santos

Instituto Espírita Bezerra de Menezes – IEBM – Niterói – RJ
Jornal Informativo “O Espírita Fluminense”

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terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Coerência


“Cuida para que teus atos e palavras expressem a mesma linguagem.” – François C. Liran

Jesus, nosso “modelo e guia mais perfeito”, Mestre por excelência, legou-nos as mais altas expressões de coerência. Nunca houve defasagem entre suas palavras e atos. Antes d’Ele, temos também Sócrates, evidentemente com menos brilho, mas na mesma linha comportamental.
Em várias oportunidades, o meigo Rabi desaconselhou a dubiedade, a falsidade… Estão aí registradas, indelevelmente, pelos Evangelistas a Parábola da Figueira Estéril e a significativa expressão “túmulos caiados”.
O espírita-cristão não se pode deixar surpreender em contradição entre o que fala e o que faz.
O espiritismo, revivendo as fórmulas eternas do Cristianismo, não deixa margem a dúvidas quanto à coerência que deve existir entre a mensagem verbal e o procedimento na prática de seus seguidores. Nossos atos deverão ser o adubo enriquecedor de nossas palavras, produzindo assim, os frutos da verdade, da coerência.
Jesus falava com autoridade e tanto suas palavras quanto os seus atos traduzem uma coerência inquestionável. Assim, do mesmo modo deve agir toda criatura que o elegeu como Mestre.
A fidelidade doutrinária é, antes de tudo, o compromisso maior do espiritista sincero. O contrário seria a revivescência do farisaísmo de tão triste história.
Resta-nos indagar à nossa consciência se, na verdade, estamos atendendo o postulado Kardequiano de “dia-a-dia combater as inclinações más e cuidando da transformação moral”, ou se, a exemplo dos fariseus, estamos apenas mostrando um leve verniz, que esconde sob a sua fina camada “podridão por dentro”.
Não sejamos como a figueira estéril que, embora repleta de folhas, não possuía frutos.
Possa o Mestre Maior contar com a nossa operosidade no Bem, expressada, coerentemente, em atos e palavras na mesma linguagem.

Rogério Coelho

Jornal “O Espírita Fluminense”
Instituto Espírita Bezerra de Menezes – IEBM – Niterói – RJ

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quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

A metáfora da laje


A obra mediúnica de Chico Xavier trabalha incansavelmente o pensamento de que o espírita é alguém que assumiu, previamente a essa experiência corpórea, compromissos de tarefa no bem, por via da seara espírita.
André Luiz se reporta a vastas e complexas escolas domiciliadas nas esferas espirituais mais próximas do planeta destinadas a preparação de colaboradores para as tarefas espíritas. Comenta que longas fileiras de médiuns e doutrinadores para o mundo carnal partem daqui, com as necessárias instruções, porque os benfeitores da Espiritualidade Superior, para intensificarem a redenção humana, precisam de renúncia e de altruísmo.[i]

Emmanuel, na mesma linha, exorta-nos:

Se te encontras, quanto nós, entre aqueles que tanto recebem da Nova Revelação, perguntemos a nós mesmos o que lhe damos em serviço e apoio, cooperação e amor, porque sendo o Espiritismo crédito e prestigio de Cristo entregues às nossas consciências endividadas, é natural que a conta e o rendimento que se relacionem com ele seja responsabilidade em nossas mãos.[ii]

Recentemente, tem-se ouvido de simpatizantes da Doutrina espírita que tal pensamento é por demais exclusivista, retratando uma espécie de ufanismo espírita, pois o que importa é fazer o bem, independentemente se no ambiente espírita ou em qualquer outro espaço vital.
Indiscutivelmente, ser bom, útil, justo e generoso é uma proposta transcendental de vida, e tem seus méritos próprios; assim, jamais deve ser limitada a este ou aquele setor específico. No entanto, o que os benfeitores espirituais têm mostrado é que um serviço anteriormente aceito faz parte de um programa extenso e complexo do qual não fazemos a mínima ideia. A questão que importa no caso ora examinado, portanto, não é a ação no bem em si mesma, mas a especificidade que lhe caracteriza.

Para ilustrar, consideremos a seguinte metáfora. Armando está construindo, na cidade de Astolfo Dutra uma nova casa e pede a Arthur, amigo querido, colaboração no enchimento da laje. Combinam para a manhã do domingo seguinte.
Na data aprazada, Arthur levanta-se cedo e parte em direção à futura morada do amigo, conforme combinado. Todavia, em rua anterior, observa que um outro amigo, o Luciano, está igualmente envolvido em morada nova e prepara para também preencher a laje da residência. Atendendo ao convite de Luciano, Arthur fica por lá mesmo, auxiliando alegremente o amigo. Diante do acontecido Armando fica impossibilitado de seguir sozinho na tarefa programada, transferindo-a para outro dia.

A questão que se coloca é esta: Arthur ajudou um amigo, fez o bem, mas faltou com um compromisso previamente assumido, obrigando a uma revisão das tarefas, com os inconvenientes ligados ao fato.
Concluindo: viver é cumprir uma missão, preservando a fidelidade ao núcleo mais íntimo da nossa personalidade, e, consequentemente, aos avalistas de nossa reencarnação que, da dimensão espiritual, acreditaram em nós e investem incansavelmente em nossas realizações.

[i] Os Mensageiros, cap. 3.
[ii] Opinião espírita, cap. 6.

Ricardo Baesso de Oliveira

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