quinta-feira, 8 de maio de 2014

O remédio imprevisto


O pequeno príncipe Julião andava doente e abatido. Não brincava, não estudava, não comia. Perdera o gosto de colher os pêssegos saborosos do pomar. Esquecera a peteca e o cavalo. Vivia tristonho e calado no quarto, esparramado numa espreguiçadeira.
Enquanto a mãezinha, aflita, se desvelava junto dele, o rei experimentava muitos médicos.
Os facultativos, porém, chegavam e saíam, sem resultados satisfatórios. O menino sentia grande mal-estar. Quando se lhe aliviava a dor de cabeça, vinha-lhe a dor nos braços. Quando os braços melhoravam, as pernas se punham a doer.
O soberano, preocupado, fez convite público aos cientistas do País. Recompensaria nababescamente a quem lhe curasse o filho.
Depois de muitos médicos famosos ensaiarem, embalde, apareceu um velhinho humilde que propôs ao monarca diferente medicação. Não exigia pagamento. Reclamava tão somente plena autoridade sobre o doentinho. Julião deveria fazer o que lhe fosse determinado.
O pai aceitou as condições e, no dia imediato, o menino foi entregue ao ancião.
O sábio anônimo conduziu-o a pequeno trato de terra e recomendou-lhe arrancasse a erva daninha que ameaçava um tomateiro.
— Não posso! estou doente! — gritou o menino.
O velhinho, contudo, convenceu-o, sem impaciência, de que o esforço era viável e, em minutos breves, ambos libertavam as plantas da erva invasora.
Veio o Sol, passou o vento; as nuvens, no alto, rondavam a terra, como a reparar onde estava o campo mais necessitado de chuva...
Um pouco antes do meio-dia, Julião disse ao velho que sentia fome, O sábio humilde sorriu, contente, enxugou-lhe o suor copioso e levou-o a almoçar.
O jovem devorou a sopa e as frutas, gostosamente. Após ligeiro descanso, voltaram a trabalhar.
No dia seguinte, o ancião levou o príncipe a servir na construção de pequena parede. Julião aprendeu a manejar os instrumentos menores de um pedreiro e alimentou-se ainda melhor.
Finda a primeira semana, o orientador traçou-lhe novo programa. Levantava-se de manhã para o banho frio, obrigava-se a cavar a terra com uma enxada, almoçava e repousava. Logo após, antes do entardecer, tomava livros e cadernos para estudar e, à noitinha, terminada a última refeição, brincava e passeava, em companhia de outros jovens da mesma idade.
Transcorridos dois meses, Julião era restituído à autoridade paternal, rosado, robusto e feliz. Ardia, agora, em desejos de ser útil, ansioso por fazer algo de bom. Descobrira, enfim, que o serviço para o bem é a mais rica fonte de saúde.
O rei, muito satisfeito, tentou recompensar o velhinho. Todavia, o ancião esquivou-se, acrescentando:
— Grande soberano, o maior salário de um homem reside na execução da Vontade de Deus, através do trabalho digno. Ensina a glória do serviço aos teus filhos e tutelados e o teu reino será abençoado, forte e feliz.
Dito isto, desapareceu na multidão e ninguém mais o viu.

Do cap. 38 do livro Alvorada Cristã, obra de Neio Lúcio, psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.

Matéria extraída da Revista Espírita: O Consolador

Imagem da capa do livro

domingo, 4 de maio de 2014

A árvore generosa


Ontem, em nossa oficina de educação para a vida e para a morte, com o tema A Criança diante da Morte, com Franklin Santana Santos e eu, no Espaço Pampédia, houve uma discussão fecunda sobre um livro famoso e belo: A Árvore Generosa, de Shel Silverstein (Editora Cosac Naify). Bons livros infantis são assim: têm múltiplos alcances, significados, atingem de 8 a 80 anos, porque falam de coisas essenciais e profundas. Houve intensa discordância quanto à mensagem dessa história, sobre a qual já queria escrever há muito.
Para situar o leitor que não leu (mas recomendo ler), repasso aqui a sinopse do livro:
“’A árvore generosa’ traz o clássico de 1964 que conta a história do amor entre uma árvore e um menino. A árvore é a amiga amorosa que dá tudo ao menino, suas folhas, seus frutos, sua sombra. O menino também ama a árvore, a grande companheira de todos os dias; sobe em seu tronco, se pendura nos galhos, brinca de esconde-esconde. Até que vai crescendo, se torna adolescente, depois adulto. E, pouco a pouco, deixa a amiga de lado. ‘Estou grande demais para brincar’, diz o menino, que então precisa de dinheiro para comprar ‘muitas coisas’. A árvore fornece suas maçãs, para o jovem vender. Depois seus galhos, para o homem construir sua casa. E a história acompanha o passar do tempo até a velhice do homem – que até o fim, já bem velho e cansado, é chamado de menino pela árvore.”
A história retrata uma relação de amor que, de início, quando o personagem é menino, é recíproca, mas depois, quando cresce, vai se tornando uma doação unilateral, pois a árvore dá, se dá, se doa, fica feliz de se oferecer e se sacrificar pelo seu menino, mas o menino, adulto, maduro, só tira, só recebe, sem lhe dar nada em troca. Mas sempre volta para sua árvore e lhe pede mais. Quando ela não tem mais nada para dar e se tornou apenas um toco e ele está velho e cansado, ainda ela lhe serve para ele se sentar e se confortar. E ela se sente sempre feliz em se doar para o seu menino.
O que ressalta à primeira vista na leitura é a oferta irrestrita da árvore (generosa) e o egoísmo depredatório e indiferente do menino, que cresceu, mas continua menino para sua árvore. Aliás, é sintomático que ele continue até o fim do livro, sendo chamado de menino, porque embora velho, ainda se comporta como um menino mimado, incapaz de assumir uma responsabilidade de amor com quem tanto lhe deu. Ela cuida e ele se descuida. Ela se oferece e ele vai embora. Ele volta e ela exulta, mas ele volta apenas para pedir mais. Ela quer vê-lo feliz e não mede sacrifícios para isso, ele se comporta de forma indiferente à dor que ela sente, ao vê-lo partir.
Claro que o comportamento do menino é revoltante, mas a atitude da árvore é divina. Uma atitude de amor pleno, de entrega total, de esquecimento de si, pelo ser que ama. Uma atitude aliás muito mal vista e mal compreendida no mundo atual, onde amor não pode incluir sacrifício e renúncia, mas apenas troca calculada e medida.
Existe, é verdade, um único tipo de amor que não comporta a entrega plena sem reciprocidade nenhuma: é o amor entre um casal. Nesse campo, é preciso haver um equilíbrio, embora possa um dos dois, que tiver maior maturidade espiritual, exercer uma doação maior. Mas se houver um descompasso muito grande, dá-se a anulação e a exploração, a desvalorização do outro. A reciprocidade do amor num casamento, numa relação a dois, é uma necessidade para a sua sobrevivência. Fora isso, o amor pode se libertar de qualquer espera de retorno, pode projetar a reciprocidade plena para a eternidade – o amor fraterno, o amor de amizade, o amor pedagógico e, sobretudo, o maior amor de todos, o materno (que não é exclusivo de uma mãe para com o filho, podemos experimentar o amor materno com qualquer outro ser humano), são amores que podem se soltar das amarras de cobrança e procurarem um status de divindade.
Não foi esse, por acaso, o amor de Jesus? Não é isso que propõe o cristianismo? Mais amar do que ser amado? Jesus, na cruz, dizendo: perdoai-lhes Pai, porque não sabem o que fazem não é igual à árvore entregando seus galhos para o menino egoísta? Qual o sentido desse amor? O amor que se sacrifica, que se devota, que se entrega plenamente é o amor que toca o outro, é o amor que fará um dia o menino crescer e amadurecer, sentir o quanto foi amado e aprender também a se devotar assim.
Essa árvore, ao contrário do que alguns podem pensar, não era masoquista, sobretudo porque a árvore ficava feliz em amar e se doar. Ela era sábia e sabia que seu menino ainda era mesmo um menino e teria muito o que aprender. Mas para ensiná-lo, não se nega, não recua, não repreende, não põe limites ao seu amor. Simplesmente exemplifica o que é de fato amar. Só se aprende o que é o amor pleno, recebendo esse amor de alguém. Por isso, as leis divinas fizeram as mães (embora muitas delas ainda não desenvolveram esse amor completo, e algumas até o renegam, mas ele está imanente até mesmo nos animais, porque é emanação de Deus): sem a entrega total de alguém que nos cuide e vele por nós nos primeiros anos de vida, não sobreviveríamos… Essa necessidade absoluta com que viemos ao mundo revela um momento na vida (poderá haver outros, em crises, doença, velhice e morte) em que precisamos exatamente de uma árvore generosa, que não meça sacrifícios por nós.
Mas o mundo contemporâneo tem grande dificuldade de entender e aceitar isso. Muitos, ao lerem essa história, se revoltam mais com a árvore, considerada tola, mole, masoquista, do que com o menino, egoísta e indiferente – vale dizer, imaturo. Porque nem mais as mães querem hoje ser árvores generosas! Estamos num mundo que despreza a entrega de si mesmo e prega que todos devemos exercitar o “pensar primeiro em si”. Ou seja, todo mundo tem é que se comportar como o menino. Mas se não houvesse árvores generosas, pessoas que se entregam ao próximo, que se sacrificam pelo bem e amam incondicionalmente, o mundo estaria ainda mais ressecado e vazio do que está.
Podemos ainda dizer que a árvore mais generosa do universo é Deus – amor infinito, irrestrito, pleno, o amor que cobre a multidão de pecados. Quando passarmos a entender e sentir mais Deus como amor pleno e não como um juiz punitivo, justiceiro, melhor compreenderemos e vivenciaremos esse amor divino em nós. Quem se comporta como a árvore generosa está aprendendo a ser mais perto de Deus. E os meninos mimados e egoístas crescerão. E só o amor das árvores generosas poderá curá-los e educá-los.

Dora Incontri

quinta-feira, 1 de maio de 2014

História educativa.


Um jovem foi se candidatar a um alto cargo em uma grande empresa . Passou na entrevista inicial e estava indo ao encontro do diretor para a entrevista final. O diretor viu seu CV, era excelente. E perguntou-lhe: 
- Você recebeu alguma bolsa na escola? - o jovem respondeu - Não.
- Foi o seu pai que pagou pela sua educação?
- Sim - respondeu ele.
- Onde é que seu pai trabalha?
- Meu pai faz trabalhos de serralheria.
O diretor pediu ao jovem para mostrar suas mãos.
O jovem mostrou um par de mãos suaves e perfeitas.
- Você já ajudou seu pai no seu trabalho?
- Nunca, meus pais sempre quiseram que eu estudasse e lesse mais livros. Além disso, ele pode fazer essas tarefas melhor do que eu.
O Diretor lhe disse:
- Eu tenho um pedido: quando você for para casa hoje, vá e lave as mãos de seu pai. E venha me ver amanhã de manhã.
O jovem sentiu que a sua chance de conseguir o trabalho era alta!
Quando voltou para casa, ele pediu a seu pai para deixá-lo lavar suas mãos.
Seu pai se sentiu estranho, feliz, mas com uma mistura de sentimentos e mostrou as mãos para o filho. O rapaz lavou as mãos de seu pai lentamente. Foi a primeira vez que ele percebeu que as mãos de seu pai estavam enrugadas e tinham muitas cicatrizes. Algumas contusões eram tão dolorosas que sua pele se arrepiou quando ele a tocou.
Esta foi a primeira vez que o rapaz se deu conta do significado deste par de mãos trabalhando todos os dias para pagar seus estudos. As contusões nas mãos eram o preço que seu pai teve que pagar por sua educação, suas atividades escolares e seu futuro.
Depois de limpar as mãos de seu pai, o jovem ficou em silêncio organizando e limpando a oficina do pai. Naquela noite, pai e filho conversaram por um longo tempo.
Na manhã seguinte, o jovem foi encontra-se com o Diretor.
O diretor percebeu as lágrimas nos olhos do moço quando ele perguntou:
- Você pode me dizer o que você fez e aprendeu ontem em sua casa?
O rapaz respondeu: 
- Lavei as mãos de meu pai e também terminei de limpar e organizar sua oficina. Agora eu sei o que é valorizar, reconhecer. Sem meus pais, eu não seria quem eu sou hoje... Por ajudar o meu pai agora eu percebo o quão difícil e duro é para conseguir fazer algo sozinho. Aprendi a apreciar a importância e o valor de ajudar a família.
O diretor disse: 
- Isso é o que eu procuro no meu pessoal. Quero contratar uma pessoa que possa apreciar a ajuda dos outros, uma pessoa que conhece os sofrimentos dos outros para fazer as coisas, e que não coloca o dinheiro como seu único objetivo na vida. Você está contratado.
Uma criança que tenha sido protegida e habitualmente dado a ela o que quer, desenvolve uma mentalidade de "Tenho direito" e sempre se coloca em primeiro lugar. Ignora os esforços de seus pais.
Se somos esse tipo de pais protetores, estamos realmente demonstrando amor ou estamos destruindo nossos filhos?
Você pode dar ao seu filho uma casa grande, boa comida, educação de ponta, uma televisão de tela grande... Mas quando você está lavando o chão ou pintando uma parede, por favor, o faça experimentar isso também . Depois de comer, que lave os pratos com seus irmãos e irmãs. Não é porque você não tem dinheiro para contratar alguém que faça isso; é porque você quer amar do jeito certo. Não importa o quão rico você é, você quer entender. Um dia, você vai ter cabelos brancos como a mãe ou o pai deste jovem.
O mais importante é que a criança aprenda a apreciar o esforço e ter a experiência da dificuldade, aprendendo a capacidade de trabalhar com os outros para fazer as coisas.

(Tradução da postagem de Adri Gehlen Korb)

Fonte: Mensagem Espírita

Imagem ilustrativa