segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Lições de amor e perdão


O mundo conheceu o drama da mulher nigeriana que, por ter concebido fora do casamento, foi condenada a morrer apedrejada.
Sua história comoveu o Mundo, mas poucos a sabem em detalhes.
Poucos sabem que ela, aos treze anos foi dada em casamento, pelos pais, a um homem de mais de cinquenta anos.
Após ela ter quatro filhos, foi repudiada por esse marido, com a alegação de que não cuidara de forma eficiente das crianças, permitindo que duas viessem a morrer.
Diga-se, de catapora, em uma região desolada, na savana nigeriana, com total falta de recursos.
Quando o médico chegou, era tarde demais.
Depois disso, ela se casou mais três vezes, tendo ao todo sete filhos.
Conforme a Lei Islâmica, foi repudiada por mais duas vezes e, do último marido, ela mesma pediu o divórcio.
Um primo distante, pertencente à família de seu pai começou a corteja-la.
Toda vez que ela saía, ele a encontrava. Falava-lhe coisas gentis, agradáveis, que a foram seduzindo.
Prometeu-lhe casamento. Ela acreditou ter encontrado a felicidade.
Quando engravidou, feliz, lhe deu a notícia. Ele a aconselhou a fazer um aborto clandestino, que ela não aceitou.
Quando a gravidez não podia mais ser ocultada, ela foi denunciada à Corte Islâmica.
Quem a denunciou? Não foram os vizinhos, parentes ou curiosos. Foi seu irmão. O irmão mais querido.
Aquele que ela, ainda menina, auxiliara a cuidar, levando amarrado às costas muitas vezes.
O drama vivido por essa mulher foi pungente. Humilhada, várias vezes, ao ter sua sentença de morte decretada, seu maior pesar foi que sua filhinha, Adama, ficaria sem mãe.
Duas grandes lições essa mulher passou ao Mundo.
A primeira, é que o fruto da sua ligação com o homem que a abandonou, o motivo da sua sentença de morte, é intensamente amado por ela.
Em momento algum, ela deixou de olhar para a menina com olhos de muito amor.
Mesmo condenada à pena capital, continuou a amamentá-la, acarinhá-la, considerando-a um presente de Deus.
Minha filha me dá forças, ela é o meu alento. - Dizia.
A outra grande lição é a do perdão incondicional. Quando foi decretada sua sentença, o irmão que a denunciara a foi visitar.
Sem esperar que ele falasse, ela se aproximou dele e o abraçou.
Ele estava arrependido do que fizera. Dera ouvidos a amigos, não pensara nas consequências finais.
Misturaram as lágrimas. Ele se ofereceu para auxiliar a pagar o advogado que faria a apelação perante a Corte Islâmica.
Safiya foi perdoada. Considerada inocente.
Graças ao esforço de seu advogado e da grande pressão internacional.
A sua história auxiliará, em seu país, a outras mulheres, com certeza.
As suas lições de amor e perdão, contudo, se fazem exemplo para o Mundo inteiro.

* * *

Safiya vive no mesmo lugarejo, ao norte da Nigéria. Ela tornou a se casar.
Um jornalista italiano transformou em livro a sua história. Parte dos proventos vindos da venda do livro são doados a um projeto de apoio e assistência às mulheres e crianças nigerianas.
Tudo realizado por uma ONG italiana, fundada em 1965. Ao todo, essa ONG trabalha em trinta e seis países da África, América Latina, Ásia e nos Bálcãs, envolvendo quase mil e oitocentos operadores.
Isso demonstra que a solidariedade não tem fronteiras.

Redação do Momento Espírita, com base no livro: Eu, Safiya de Raffaele Masto.

 Imagem ilustrativa

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Perseguidos / Elucidações de Emmanuel


Batido no ideal de bem fazer, desculpa e avança à frente.
Açoitado no coração, enxuga as lágrimas e segue adiante.
A indulgência é a vitória da vítima e o olvido de todo mal é a resposta do justo.
Acúleos despontam no corpo da haste verde, mas a rosa, em silêncio, floresce, triunfante, por cima deles, enviando perfume ao céu.
Sombras da noite envolvem a paisagem terrestre na escuridão do nadir; todavia, o Sol, sem palavras, expulsa as trevas, cada manhã, recuperando-a para a alegria da luz.
Lembra-te dos perseguidos sem causa, que se refugiaram na paz da consciência, em todas as épocas.
Sócrates bebe a cicuta que lhe impõem à boca; entretanto, ergue-se à culminância da filosofia.
Estêvão morre sob pedradas, abrindo caminho a três séculos de flagelação contra o Cristianismo nascente; contudo, faz-se o padrão do heroísmo e da resistência dos mártires que transformam o mundo.
Gutenberg é processado como devedor relapso, mas cria a imprensa, desfazendo o nevoeiro medieval.
Jan Hus é queimado vivo, mas imprime novos rumos à fé.
Colombo expira abandonado numa enxerga em Valladolid; no entanto, levanta-se, para sempre, na memória da América.
Galileu, preso e humilhado, desvenda ao homem nova contemplação do Universo.
Lutero, vilipendiado, ressuscita as letras do Evangelho.
Giordano Bruno, atravessando pavoroso suplício, traça mais altos rumos ao pensamento.
Lincoln tomba assassinado, mas extingue o cativeiro no clima de sua pátria.
Pasteur é ironizado pela maioria de seus contemporâneos; no entanto, renova os métodos da ciência e converte-se em benfeitor de todos os povos.
E, ainda ontem, Gandhi cai sob golpe homicida, mas consagra o princípio de não violência.
Entre os perseguidores, contam-se os obsidiados, os intemperantes, os depravados, os infelizes, os caluniadores, os calculistas e os criminosos, que descem pelas torrentes do remorso para a necessária refundição mental nos alambiques do tempo, mas, entre os perseguidos sem razão, enumeram-se quase todos aqueles que lançam nova luz sobre as rotas da vida.
É por isso que Jesus, o Divino Governador da Terra, preferiu alinhar-se entre os escarnecidos e injuriados, aceitando a morte na cruz, de maneira a estender a glória do amor puro e a força do perdão, para que se aprimore a Humanidade inteira.

Da obra Religião dos Espíritos, psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.


Imagem do livro

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Os limites da liberdade


Em que condições poderia o homem gozar de absoluta liberdade?

Nas do eremita no deserto. Desde que juntos estejam dois homens, há entre eles direitos recíprocos que lhes cumpre respeitar; não mais, portanto, qualquer deles gozará de liberdade absoluta (Livro dos Espíritos, questão 826, Lei de Liberdade).

Um náufrago vem ter em ilha deserta. Constrói tosca habitação e ali se instala. Desfruta de liberdade plena. Movimenta-se à vontade. Faz e desfaz, conforme lhe parece conveniente, senhor absoluto daquela porção de terra.
Tempos depois chega outro náufrago. A situação modifica-se. O primeiro experimentará limitações. A não ser que se disponha a eliminar o recém-chegado, descendo à barbárie, deverá reconhecer que seu direito de dispor da ilha esbarrará no direito do companheiro em garantir a própria sobrevivência. Terão, pois, que dividir os recursos existentes. E a liberdade de ambos diminuirá à medida que outros náufragos aparecerem.
É o que ocorre na vida comunitária, onde nossa liberdade é relativa, porquanto deve ser conciliada com a liberdade dos concidadãos. O limite de nosso direito é o direito do próximo. A inobservância desse princípio elementar gera conflitos. As implicações dessa equivalência de direitos são extensas. Fácil enunciar alguns exemplos:
Não nos é lícito, na vida comunitária, transitar de automóvel pelas ruas à velocidade acima da fixada por lei; a ninguém é permitido, em logradouro público, postar-se nu, nem ali despejar lixo ou satisfazer necessidades fisiológicas. A liberdade de movimentação é restrita. Vedado nos é invadir uma propriedade alheia ou recintos de diversão como cinema ou teatro. Mister sejamos convidados ou nos disponhamos a pagar o ingresso.
Não é conveniente nem mesmo permanecer na inércia se fisicamente aptos, porquanto não nos pertencem os bens comunitários. Alimentos, abrigo, roupas, indispensáveis ao nosso bem-estar e à própria subsistência, pertencem àqueles que os produzem. Somos chamados a produzir, também, com a força do trabalho, a fim de que, em regime de permuta, utilizando um instrumento intermediário, o dinheiro, possamos atender às nossas necessidades.
A perfeita compreensão dos deveres comunitários, que restringem a liberdade individual, é virtude rara. Por isso existem mecanismos destinados a orientar a população e conter suas indisciplinas. Há leis que definem direitos e obrigações. Há órgãos policiais para fiscalizar sua observância. Os infratores sujeitam-se às sanções legais, que podem implicar até no confinamento em prisões por tempo determinado, compatível com a natureza dos prejuízos causados a alguém ou à sociedade.
Quanto maior a expansão demográfica e a concentração urbana, mais difícil o controle da população. E há infrações que nem sempre podem ser enquadradas como delitos passíveis de punição ou nem sempre podem ser rigorosamente detectadas e corrigidas pelas autoridades.
Revelam os infratores, total desrespeito pelos patrimônios individuais e coletivos da comunidade e pelo inalienável direito comum à tranquilidade.
Todavia, estes impenitentes individualistas, ilhados numa visão egocêntrica de vida, saberão, mais cedo ou mais tarde, que nenhum prejuízo causado ao próximo ficará impune.
Se a justiça da Terra é impotente para sentenciar os infratores, a justiça do Céu o fará, inelutavelmente, confinando-os em celas de desajuste e infelicidade, na intimidade de suas consciências, impondo-lhes penosas retificações na presente existência ou em existências futuras.
Aprendemos todos, por experiência própria, que há limites em nossa liberdade de ação e que o mínimo que nos compete, em favor de nossa felicidade, é não perturbar o próximo, tanto quanto estimamos que ele não nos perturbe.

Richard Simonetti

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quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Eu admito...


Admito que o céu é azul e lindo, mesmo quando encoberto por nuvens, nubladas e escuras.
Admito que nem sempre tenho razão, e prefiro ter paz do que ter razão.
Admito que errar é humano, mas que prudente é aprender com o erro, e sábio é aprender com o erro alheio.
Admito que todos os dias preciso, ao despertar, fazer escolhas – e para minha paz e felicidade escolho aprender, servir, perdoar e amar.
Admito que boa vontade, mente aberta e honestidade vão me levar para um lugar seguro – consciência tranquila por ter feito o melhor.
Admito que com determinação e fé posso alcançar meus objetivos no bem, confiante que o Universo conspira a meu favor.
Admito que amizades sejam frutos da confiança e da fidelidade e que devo cultivá-las para manter a graça mais perto de mim.
Admito que ainda me confundo entre o bem e o mal, mas me esforço para ser melhor hoje do que fui ontem.
Admito que ninguém renasce para sofrer, mas para evoluir, crescer e ser melhor em gentileza, generosidade e gratidão.
Admito que as melhores coisas da vida não se compram, mas se permutam: sorriso, abraço e carinho.
Admito que o passado é irrecuperável, mas reparável no presente.
Admito também que, onde se desenvolve o amor, se desenvolve a paz, e onde existe paz, Deus está presente.

Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo

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quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Enquanto brilhe o Sol


Há dias em que tudo parece sombreado, sem possibilidade de luz…
Programações cuidadosas tornam-se mais difíceis de serem realizadas, esperanças sustentadas em todos momentos com alegria tornam-se mais distantes, os compromissos habituais parecem enfadonhos e inúteis, ao tempo em que uma onda de pessimismo toma conta dos nossos ideais.
Nesta quarentena longa, que se vem arrastando com vários ritmos e definições, tem havido aturdimento em muitas mentes, gerando grandes conflitos nos relacionamentos, afastando os indivíduos uns dos outros, produzindo tédio e ansiedade, assim como outros conflitos emocionais em razão da falta desse hábito de convivência.
Ideias estapafúrdias, nascidas nas fugas psicológicas da realidade, anunciam prazeres que exaurem e atentados contra a dignidade, como se fosse uma campanha bem dirigida contra a ordem, o equilíbrio e o dever, dando a impressão que essas são manifestações tabus que devem desaparecer da sociedade.
Nesse báratro perde-se o discernimento ante o que é ou não salutar, porque as filosofias existenciais e a política pervertida somente trabalham em favor dos seus interesses mesquinhos, pretendendo reduzir o seu humano contemporâneo ao indivíduo grosseiro e primitivo, por cujas experiências antropológicas transitou com êxito.
Campanhas sistemáticas muito bem urdidas trabalham contra a fé religiosa de qualquer espécie, como se isso resolvesse os graves problemas existenciais nas suas expressões mais significativas.
A educação, que deveria ser a base da construção do mundo novo, por ser o alicerce de glorificação da criatura humana, experimenta a banalização e o desprezo, porque, quanto menos educado (e disciplinado um povo), melhor para os dominadores de ocasião implantarem os seus regimes brutais e esmagadores das populações que permanecerão na miséria social e econômica.
Nada obstante, se arregimentam legiões enlouquecidas do mundo espiritual inferior que invadem o planeta ansiosas para transformar a abençoada Gaia em um núcleo de perversão, de crimes tornados legais pela desventura dos partidos políticos.
Não será esta a primeira vez que ocorrerá. Periodicamente o planeta vê-se assaltado pelas guerras e desvarios, tudo transformado em sombras e desencanto, mas subitamente raia o Sol da liberdade, dos direitos humanos, das democracias, dos valores éticos e Deus abençoa a humanidade, envolvendo-a em conquistas da beleza e da paz.
Renasça em nossos corações a esperança, porquanto todos fomos criados para a plenitude.

Divaldo Franco

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quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Fraternidade sempre!

 

Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós. (Mateus 7: 1,2)

Encontramos no dicionário da língua portuguesa, entre outras definições para a palavra fraternidade, as que seguem: Amor ou afeto em relação ao próximo; Boa convivência ou harmonia entre as pessoas, o que nos leva a deduzir que ser fraterno é antes de tudo buscar o bom convívio, a paz e a harmonia em nossas relações com o nosso próximo, no contexto em que a Soberana Sabedoria do Universo nos situou por misericórdia.
Quando alcançamos a bênção de compreender com a Doutrina Espírita que temos um passado de vidas anteriores à presente, em que nem sempre pautamos nossas relações com o nosso irmão de caminhada nos preceitos do Evangelho do nosso Mestre e Guia, que é Jesus de Nazaré, isso nos faz entender o porquê, quase sempre, nossas experiências e desafios de hoje causam-nos tantas dificuldades, dores e sofrimentos.
Mas há sempre uma porta aberta para nos libertar na busca de transformar os obstáculos de hoje em bênçãos para o amanhã com a Lei Divina do Trabalho, pela qual nos é permitido refazer em pensamentos, palavras e atos, uma imprescindível reforma íntima, pois que para isto, recursos não nos faltam em momento algum.
Preciso se faz que empreguemos os nossos melhores recursos intelectuais, morais e espirituais, movidos por uma vontade verdadeira para seguir com disciplina os exemplos daquele que é para nós “O Caminho a verdade e a Vida”, que nos impulsionaram na direção da caridade e do respeito ao nosso próximo, que conosco convive, o que nem sempre é tão simples. Somos naturalmente convidados a entender que precisamos ser os braços multiplicados do Amigo Maior da Humanidade e, nessas condições, é imprescindível nos movimentemos na execução dos nossos programas na fraternidade legítima.
Isto porque, nem todos os membros de nossa convivência social estão em condições de compreender conceitos tão fora de uso pela maioria dos indivíduos que preferem seguir os modismos ditados pelos padrões materialistas do mundo de hoje, onde os mais desrespeitosos, indecentes e atrevidos conquistam espaços e, até mesmo, a atenção e a inveja dos incautos que chegam ao cúmulo de admirar-lhes a “esperteza”.
É lastimável essa visão de tantos quanto ainda não despertaram para o fato de que a criminalidade em qualquer nível não tem outra consequência que não seja a desgraça causada pela infidelidade aos ensinamentos do Cristo que resumiu as Leis e os Profetas em “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”, e que mais tarde esses supostos “espertos” estarão às voltas com a realidade da Lei de Causa e Efeito, que lhes chamarão à prestação de contas, fazendo-os entender pela dor, que o crime jamais compensará.
Essa realidade está à vista de quem tiver olhos de ver as prisões lotadas desses irmãos, tolhidos em uma das maiores bênçãos que desfrutamos na vida, a liberdade de ir e vir, causada justamente pelas tais atitudes de esperteza, desrespeito etc., onde aprendem de forma dura, triste e lamentável que a honestidade, o respeito e a paz têm para todo indivíduo um valor inestimável.
O pior de tudo isso, é que não somente sofre o indivíduo encarcerado, mas também toda sua família, amigos e toda sociedade, pois, ninguém há que possa ser beneficiado em termos reais com a desgraça de um irmão em humanidade, um filho do mesmo Pai de todos nós, levado a infelicidade de uma vida de presidiário.
O espiritismo nos ensina a não julgar ninguém, entregar a Deus o justo direito do julgamento que só ELE pode avaliar com exatidão o melhor para cada filho seu. Cabe-nos orar, vibrar e a fazer ao outro o que gostaríamos que os outros nos fizessem em situações delicadas como a vida nas penitenciárias.

PRISÃO

“Mentalizemos a criatura recolhida à prisão para relacionar-lhes os aflitivos problemas.
Quase sempre chora sem lágrimas sob o azorrague do remorso a zurzir-lhe o espírito, arrependendo-se, tardiamente, da culpa que poderia ter evitado a preço de complacência.
Dia e noite, o relógio assinala-lhe os instantes amargos que se acumulam em cristalizações de angústia que, frequentemente, raiam no desespero.
Padece doloroso banimento social, em compulsória distância daqueles que mais ama….”(1)

Francisco Rebouças

Referência:
Xavier, Francisco Cândido, pelo espírito Emmanuel. Livro: Alvorada do Reino – Cap. 20 Prisão.

quarta-feira, 28 de julho de 2021

Nascer de novo


Existe um pensamento predominante entre os educadores de que as crianças são como uma tábua rasa ou folha em branco e que a relação com o meio constrói as estruturas de pensamento e do ser da criança. Nos relacionamentos sociais, no que a criança vivencia, está a base de seu caráter. Na revista Nova Escola[1] encontramos o eixo basilar deste pensamento. Ele provém do pensador inglês John Locke. No artigo de Márcio Ferrari, escrito na referida revista, ele descreve: “um aprendizado coerente com sua mais famosa afirmação: a mente humana é tábula rasa, expressão latina análoga à ideia de uma tela em branco”.
São possíveis várias linhas de pensamento sobre esta posição filosófica. Contudo, enfocaremos a criança como um ser humano que está em uma jornada de aprendizado através de um novo nascimento. Jesus nos ensina sobre este nascer de novo no encontro com Nicodemos. Respeitosamente, Nicodemos pergunta a Jesus: “...que deverei lançar mão para conhecer o Reino de Deus?” Jesus com seu poder de síntese, nos oferece esta profunda frase como resposta: “Ninguém poderá ver o Reino de Deus se não nascer de novo”.[2]
É uma referência clara à reencarnação, porém, nós temos no íntimo que a reencarnação é real? Ou a reencarnação é uma ideia sem grande importância para os dias atuais? Reflitamos! Quem nos alerta sobre a importância da reencarnação é Jesus. Nascer de novo está como condição para encontrar o reino de Deus.
Podem nos pairar algumas dúvidas: Como existem outras vidas, se não me lembro nada? Não há comprovação sobre isso: se já reencarnamos. Esta pode ser uma resposta racional quando pensamos em vidas sucessivas. Em contraponto a estas dúvidas, existem diversos estudos, livros sobre lembranças de outras vidas, mas mesmo assim as questões podem persistir e a reencarnação não se tornar algo concreto que se possa observar sua veracidade no cotidiano. Assim, no íntimo podem surgir dúvidas sobre outras existências, mesmo para os espíritas, que podem minimizar a importância do processo reencarnatório para evoluirmos.
Será que os espíritas, de certa forma ainda estão como Nicodemos? Um fariseu de bom coração, inteligente, mas ainda sem conseguir compreender a lei do nascer e renascer. Jesus respondeu para Nicodemos assim, ante sua dúvida: “Se vos falei de coisas terrestres e não crestes, como crereis se vos falar das coisas celestiais?”[3]
O saber sobre as múltiplas vidas é pôr em prática no íntimo e nas ações exteriores a compreensão da lei reencarnatória. Para tanto, é importante empreender o nosso melhor no ambiente humano que nascemos. O berço é o melhor lugar, ele molda-se às necessidades da evolução do Espírito.
“De conformidade com a regra, porém, nosso berço no mundo é o reflexo de nossas necessidades, cabendo a cada um de nós, quando na reencarnação, honrá-lo com trabalho digno de restauração, melhoria ou engrandecimento, na certeza de que a ele fomos trazidos ou atraídos, segundo os problemas da regeneração ou da mordomia de que carecemos na recomposição de nosso destino, perante o futuro.” (Emmanuel/F. C. Xavier: Pensamento e Vida. Cap. 11, p. 49. 19ª edição, FEB.)
A morada na Terra foi o lugar que escolhemos pela lei da sintonia, seja esta por sentimentos bons, ruins ou até pela nossa feição psicológica. O que temos no interior do ser se exterioriza a todo momento e atraímos aqueles com mesmo padrão vibrátil; é a parte psicológica a influenciar o renascimento. Emmanuel nos explica com propriedade:

“A chamada hereditariedade psicológica é, por isso, de algum modo, a natural aglutinação dos Espíritos que se afinam nas mes­mas atividades e inclinações.
Um grande artista ou um herói preemi­nente podem nascer em esfera estranha aos sentimentos nos quais se avultam. É a ma­nifestação do gênio pacientemente elaborado no bojo dos milênios, impondo os reflexos da sua individualidade em gigantesco trabalho criativo. Todavia, na senda habitual, o templo doméstico reúne aqueles que se retratam uns nos outros.” (Emmanuel/F. C. Xavier: Pensamento e Vida. Cap. 12, p. 52. 19ª edição, FEB.)

A nossa vida, como um todo, está entrelaçada de renascimentos. Não temos ideia de quanto o Espírito aferiu de aprendizado nas oportunidades do nascer novamente. Portanto, não temos tempo a perder, viver bem é harmonizar-se com o criador no trabalho diário de fraternidade e compreensão.
Por outro lado, não seria importante sabermos o passado reencarnatório, para bem encaminharmos o que fazemos no hoje? A título de reflexão, imaginemos que nesse instante, todas as lembranças, sentimentos bons, ruins, ações boas, destrutivas, que cometemos, surgissem na nossa tela mental. Como seria? Aguentaríamos equilibrar tantas informações a embaraçar o discernimento? Acredito que não teríamos maturidade para compreender se toda a estrada que percorremos nos diversos renascimentos brotasse toda de uma vez. Não conseguiríamos equilíbrio com o turbilhão de ideias, remorsos, perdas, acertos, ganâncias, encontros, desencontros a pulularem na mente. Não lembrar concretamente certos fatos também é imperioso para não trazermos o erro do passado para interferir no presente. Prejudicaria o propósito reencarnatório de harmonização.
O esquecimento é uma forma de permanecermos mais centrados, em harmonia interior com os propósitos de reajuste. Deus é sábio. Portanto, não somos uma tábua em branco, uma folha de papel para se escrever. O ser humano é muito mais complexo, temos uma verdadeira biblioteca no interior da mente. Muitas vidas e muitos aprendizados.
Por outro olhar, o renascer não acontece somente em uma nova vida. Quantos momentos passamos em que a estrada muda, se transforma em grandes desafios existenciais. Um trauma, uma dor profunda, afastamentos, encontros, reencontros, muitas vezes significam mudanças tão impactantes que poderemos dizer, metaforicamente, que foi um nascer de novo. Quem poderá dizer que não foi um renascer para Saulo encontrar Jesus no caminho de Damasco? Ele caiu vergado, cego, pela força poderosa do amor de Jesus. A proposta de renovação do mestre do amor ainda nos ofusca? Para Saulo, Jesus ofereceu a compreensão de Ananias que, com afeto, retirou a crosta dos seus olhos, fazendo-o ver novamente. Quem sabe, para nós, Jesus tenha ofertado o Espiritismo a nos banhar os olhos, para nos fazer enxergar as potencialidades de transformação que possuímos?

Nota da Redação:

O texto acima foi contemplado no concurso A Doutrina Explica – 2020-2021, promovido pelo Jornal Brasília Espírita (www.atualpa.org.br), com o objetivo de sensibilizar para a leitura, o uso da biblioteca espírita e levar a conhecer alguma metodologia de pesquisa para apoiar o estudo doutrinário, além de incentivar os participantes para o potencial de racionalização e explicação da realidade social e espiritual pela Doutrina Espírita.

[1] Revista Nova Escola - 01 de Outubro de 2008 – ou pelo site:
[2] Humberto de Campos/Fco. C. Xavier: Boa Nova. Cap. 14, p. 115. 3ª edição, FEB.
[3] Novo Testamento - S. João, 3:12

Gustavo Henrique de Lucena

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