Muito se tem falado sobre o melindre e o quanto provoca
danos quando se manifesta. Apesar de muitos terem conhecimento a respeito dessa
chaga moral, poucos realmente procuram trabalhar a si mesmos para que o mal do
constrangimento não faça parte de suas personalidades e por isso, o melindre
continua fazendo vitimas, destruindo laços de amizade e pondo em derrocada
trabalhos que poderiam dar bons frutos, tanto dentro quanto fora da casa espírita.
O melindre aparece em qualquer circunstância, em todo e
qualquer ambiente seja nas instituições de cunho filosófico ou religioso, no
lar, no trabalho, entre vizinhos, entre novos e velhos amigos enfim, onde está
o homem lá se encontra o melindre, em estado latente, e ao despertar de sua
suposta hibernação provoca danos arrasadores.
Essa propensão para nos ofendermos facilmente e para
fazermos de pequenos contratempos violentas tempestades, dorme no íntimo de
todos e tende a estar em processo de ebulição naqueles que se julgam superiores
e que, portanto supõem-se não estar no mesmo nível dos reles mortais, logo,
seus desejos não podem ser contrariados, por achar que a razão é um instrumento
pessoal seu.
O melindre nunca se manifesta só, traz consigo amigos também
cruéis e nefastos: o orgulho, a falta de humildade e o radicalismo.
O fato de um pedido ser negado por um companheiro de jornada
já é motivo mais do que suficiente para que o radicalismo melindroso se faça
presente tornando o individuo rancoroso por achar que aquele que lhe negou a
rogativa não é suficientemente bom para ser seu amigo e que precisa afastar-se
dele.
O que o melindroso não percebe é que além de tudo ele é
também egocêntrico, pois, visando apenas à realização de seus intentos, não
pergunta ao outro se por acaso ele teria condições de ajudá-lo, não procura
colocar-se no lugar do outro para perceber as suas limitações e dificuldades.
Deveria refletir: se eu estivesse no lugar de “fulano”, com as
responsabilidades que tem, teria condições de satisfazer os desejos de alguém?
Até onde me seria possível ir? Quais as minhas limitações?
Precisamos nos conscientizar que nem tudo o que queremos
poderá ser realizado, ainda mais quando esta realização irá depender de outros
para que se efetive. Por mais amigos que tenhamos nem sempre eles poderão nos
auxiliar e o Espírita, principalmente por ter acesso a informações que lhe
mostram de forma clara a realidade da vida espiritual e material, deveria ter
pleno conhecimento de que nem todos tem condições para tomar determinadas
decisões. Quando queremos impor nossas vontades estamos sendo tão maniqueístas
quanto os que criticamos por terem posições impositivas e manipuladoras. Não
alimentemos o melindre, pois ele tem consequências morais devastadoras em nossas
vidas, nos envereda por uma rede de negatividade e de ignorância que se tornam
entraves à educação do espírito, logo à evolução, além de ser uma porta aberta
para a obsessão.
Cobramos dos outros atitudes firmes, criticamos o que
se constrange entretanto agimos da mesma
forma quando não somos o centro das atenções. Quais crianças, fazemos birra,
porém, na criança a birra pela contrariedade sofrida logo passa, no adulto ela
permanece e cria raízes malignas: ódio, solidão... Amigos deixam de se falar ao
invés de procurar uma solução para o problema surgido; pais e filhos dão as
costas uns aos outros e ficam assim por anos, chegando mesmo a desencarnar sem
que a situação seja resolvida; irmãos deixam de se falar. O ego ferido, de
acordo com Emmanuel é como um verme que destrói uma semente.
É importante nos darmos importância? Sim, precisamos cuidar
de nós mesmos, porém tendo o cuidado de não ultrapassarmos limites achando que
somos melhores que os outros. Essa falsa idéia de ser melhor é extremamente
perigosa, pois nos deixa cheios de vaidades inúteis e não me toques que afetam
a alma e o corpo físico levando-nos por vezes a quadros depressivos e ampliando
o juízo de valor que nos incute que somos vitimas de injustiças e ingratidões.
Não devemos confundir favor com obrigação, ninguém tem a
obrigação de nos prestar um favor, principalmente sem ter condições efetivas
para isso, Respeitemos os limites do outro, suas dores, aflições e
dificuldades. A tolerância, quando bem entendida é uma benção que nos faz agir com
responsabilidade e com menos apego a nós mesmos. Tracemos um plano de varrer o
melindre de nossas vidas, vigiando para que não se instale e procurando
desfazer situações desconfortáveis que tem ele como pano de fundo.
Insegurança e baixa autoestima são estigmas provocados pelos
melindres e pelo radicalismo de não querermos reconhecer quando erramos e
permitirmos que a mágoa seja nosso guia. Quando criticamos e nos afastamos das
pessoas por julgar que fomos desrespeitados e não procuramos entender as situações,
que por vezes são criadas por nossas atitudes impensadas e desestruturadas,
demonstramos que também não fomos amigo o suficiente do outro, pois se o
fôssemos, entenderíamos sua posição.
Intrigas, mal entendido que parece irreversível e desânimos
podem ser revertidos desde que o individuo procure conhecer a si mesmo e
reconhecer seus erros. Mas para isso é preciso fortalecer-se espiritualmente,
entender que a ofensa só existe porque ele permitiu que ela habitasse o seu
íntimo.
Levemos em consideração, para todos os âmbitos de nossas
vidas, seja na convivência no grupo espírita, na vida profissional, em família
ou com amigos as recomendações que Kardec nos dá em O Livro dos Médiuns, no
capítulo 24, para granjearmos a simpatia dos bons espíritos: que procuremos
trabalhar em nós os vieses de consequências ruins transformando-os em condições
morais favoráveis ao progresso espiritual.
Precisamos cultivar a perfeita comunhão de sentimentos, a
cordialidade recíproca, a ausência de sentimentos contrários à verdadeira
caridade cristã, entendendo caridade no sentido de utilidade e ter em vista um
único desejo, instruir-se e melhorar-se conforme nos ensinou os espíritos
superiores através de Allan Kardec.