quarta-feira, 24 de março de 2010

A matemática do Vovô



Chovia copiosamente. Eu, frustrado por não poder ir à praia, dar meus mergulhos, fazer o “Cooper” e apreciar as sereias, estava sentado na cadeira de balanço, dando asas aos meus pensamentos, quando fui abordado por minha netinha Laís que, na época, tinha seis anos de idade.
Meiga e comunicativa, entre carícias e manhas, perguntou-me com sua inocente naturalidade:

- Vô, quantos anos você tem? 
- Sessenta, minha querida, respondi prazenteiro.
- Xi!... está bom de morrer!...

Passada a crise de riso, bem humorado, argumentei:

- Você tem seis, eu tenho sessenta anos, mas nossas idades se equivalem. É só uma questão de modo de ver, ou, como dizem os adultos, de ângulo de observação.
- Como pode ser vô? Não entendo.
- A matemática do vovô explica. Quer ver?
- Quero, estou curiosa. Mostre-me logo.

Com caneta e papel à mão, iniciei a aula de minha matemática particular. Somo os valores absolutos dos algarismos da minha idade, assim: 6 + 0 = 6, a sua idade. Daqui a seis anos, você terá 12 e eu, 66 anos. Faço o mesmo processo: 6 + 6 = 12, também sua futura idade, Entendeu?

- Acabou-se, vô? Você morre com 66 anos?

Indagou Laís com as mãos nos quartos.

- Espero que não... E, se você quiser, posso continuar com a mesma progressão aritmética tendo como razão a sua idade. Vamos ver. Passando-se mais seis anos, você estará com 18 e eu com 72. Agora some os seus algarismos e eu somo os meus: 1 + 8 = 9; 7 + 2 = 9. Viu? Ainda estamos com os mesmos valores.
- Não, assim não, o vovô mudou a forma de calcular. Não vale. É enrolação!
- Ora, Laís, falei que é questão de ângulo de observação. As coisas mudam, a gente precisa adaptar-se aos novos tempos. Deseja continuar ou se dá por vencida?
- Mande brasa, vovô, você é um sabidão!
- Junto mais seis anos e você terá 24, 2 + 4 = 6. Eu 78, 7 + 8 = 15, o que resulta 1 + 5 = 6. Nesta mesma progressão, você alcançará os 30 e os 36 e eu terei 84 e 90 anos e uma bengala na mão. Então: 3 + 0 = 3, 8 + 4 = 12, daí 1 + 2 = 3. Depois, 3 + 6 = 9, 9 + 0 = 9. Sempre chegamos aos mesmos resultados. Conclusão: você é tão “velha” quanto seu avô ou eu sou tão “moço” quanto minha neta.
- Vovô, e quando eu fizer 42 anos?
- Façamos a conta: 4 + 2 = 6. Ah! já sei... Meu corpo deverá estar na cova N° 6 do cemitério e minha alma de volta à Pátria Espiritual, prestando contas do que fez e deixou de fazer; feliz ou em sofrimento porque “a cada um será dado conforme suas obras”. Ninguém escapa da lei.
- Vovô eu não quero que você morra. Vou ficar muito triste.
- Diga saudosa em vez de triste. A morte não existe como comumente se pensa, não é o fim de tudo. Ocorre, sim, a desencarnação e o conseqüente retorno da alma à espiritualidade, o lugar de onde se vem quando se renasce aqui na Terra. Depois, com o desencarne, volta-se para a grande família espiritual.
- E de lá, vovô, você pode ver a gente?
- Sim, o vovô estará vendo seus queridos netinhos e rezando por eles. Mas, enquanto tenho você no colo, vamos continuar apreciando suas idades em comparação com os capítulos correspondentes do Evangelho Segundo o Espiritismo. Vejamos:

Capítulo 06O Cristo Consolador – O Jugo Leve;
Capítulo 12Amar os Vossos Inimigos – Pagar o Mal com o Bem;
Capítulo 18Muitos Chamados e Poucos Escolhidos;
Capítulo 24Não coloqueis a Candeia sob o Alqueire.

- E o que quer dizer cada capítulo?
- Com seis anos, você já deve sentir Jesus em seu coraçãozinho, como o Cristo Consolador, entregar-se ao Seu jugo que é suave e tomar o Seu fardo que é leve.
“Aos doze anos, saber amar integralmente e sempre retribuir com o bem todo mal que lhe fizerem. “Completando dezoito anos, estar devidamente preparada para ser uma das escolhidas a participar do Festim do Senhor.
“Seja você, aos vinte e quatro anos, uma candeia acesa colocada em lugar elevado para que possa ser vista por todos e iluminar aqueles que estiverem ao seu redor. 
- Ah! meu vô, quero ser uma boa menina para você gostar muito de mim.

Disse-lhe ainda que Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida e que ninguém vai ao Pai senão por Ele. Orientei-a no sentido de orar e vigiar não se afastando jamais do bem, do amor, do perdão, CAMINHO que conduz a Jesus.
Incentivei-a alçar vôos mais altos buscando a VERDADE pura, sem ilusões fantasiosas, sem dogmas escravizantes de consciências, sem os rituais dos primitivos e adoração a ídolos herdados do antigo paganismo.
Exortei-a seguir os passos do Senhor, exemplo sublime de VIDA para a humanidade.
A emoção não me permitiu continuar. Abracei minha netinha pedindo a Deus que abençoasse aquela alma meiga, tão cheia de amor e ternura.
Escoaram-se quase oito anos no implacável calendário do tempo. Hoje, 2 de abril de 1998, Laís completa quatorze anos e, em breve dias, atingirei os sessenta e oito.
Ela é uma linda adolescente, formoso botão de rosa desabrochando para a vida, enquanto eu entro em declínio físico, entretanto, meus olhos de “avô coruja” vêem nela a mesma menina dócil, amorosa, que, em sua ingenuidade, achava que o vovô devia morrer por ter sessenta anos.
Parabéns, Laís, no dia do seu aniversário!
O Vovô é vidrado em você.


Felinto Elízio Duarte Campelo
felintoelizio@gmail.com

Imagem ilustrativa

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