sexta-feira, 14 de agosto de 2015

A ilusão da família perfeita


Era uma vez Aloísio e Vera, um casal muito simpático; ambos de família espírita e atuantes no movimento. Desde o namoro, todos viam que seria um casamento que daria certo. E deu. Aloísio e Vera, com amor, companheirismo e tolerância, souberam construir uma relação saudável em todos os sentidos. 
Aloísio era advogado; Vera, professora. Ambos muito bem-sucedidos e estimados. E, como dedicados trabalhadores da seara espírita, sempre estiveram à frente em vários setores, não só do centro espírita, mas também do movimento espírita municipal e estadual. Enfim, Aloísio e Vera seguiram a tradição familiar e abraçaram o movimento espírita com determinação, trabalhando com afinco por ele e para ele. 
A união e a estabilidade de Aloísio e Vera, aliadas à dedicação de ambos à causa espírita, faziam com que o casal estivesse sempre cercado de admiração por todos. Era referência no movimento espírita. 
Dentre as várias atividades, o casal estivera, por um bom tempo, à frente da mocidade. Como evangelizadores, falavam para os jovens sobre felicidade conjugal, fidelidade, importância do namoro, formação familiar, divórcio... Tudo sempre visando a que os jovens, futuramente, encontrassem parceiro ideal e formassem um casal feliz como eles. 
Aloísio e Vera tinham três filhos: Douglas, Vítor e Luciana. E também tinham irmãos, cunhados, sobrinhos... 
Toda vez que um casal do movimento espírita local se separava, Aloísio e Vera, construtivamente, criticavam. Não entendiam aonde havia ido parar o amor que um prometera ao outro; diziam que as pessoas estavam brincando de casar; reprovavam o fim da união... Quando era na família de um deles, também. Irmãos e sobrinhos costumavam ser alvos de crítica caso se separassem, namorassem sem casar, ou “ficassem”, algo muito comum hoje em dia. Na visão deles, um espírita não poderia se separar ou fazer sexo sem se casar. E o casamento deveria ser de papel passado. 
Os filhos do casal ainda eram pequenos, e Aloísio e Vera olhavam os três com olhos alvissareiros. Na visão de ambos, os filhos não passariam por tempestades conjugais ou afetivas. Afinal, eram espíritas de berço, cresceram dentro do centro espírita. Começaram na evangelização infantil e, em seguida, iriam para a mocidade. Mais adiante, já adultos e plenamente integrados ao movimento espírita, teriam tarefas variadas no centro e, quiçá, no movimento espírita da cidade ou do Estado. Ato contínuo, eles se casariam com pessoas do próprio movimento espírita e teriam uniões conjugais perfeitas. Se não fossem espíritas, os escolhidos dos filhos decerto adeririam à causa, pois ninguém resiste ao Consolador Prometido. 
Filhos, noras e genros espíritas, netos espíritas, casamentos perfeitos e felizes! Aloísio e Vera vislumbravam a possibilidade de envelhecerem cercados por descendentes e agregados espíritas, diferentemente dos familiares e amigos, sempre às voltas com separações. 
Tudo ia bem na vida e nas esperanças do nosso feliz casal até que, um dia, Douglas, Vítor e Luciana entraram na vida adulta. 
Douglas, o mais velho, dentista, casou-se como manda o figurino. E com uma moça espírita, ainda por cima, para felicidade e contentamento dos pais.  Dois anos depois, o casamento acabava. Douglas e a esposa haviam chegado à conclusão que não se amavam tanto a ponto de quererem a companhia um do outro por anos a fio. Vera, a mãe, ficou muito chocada. Aloísio, o pai, chorou convulsivamente. Aquele deve ter sido o dia mais triste da vida dele. O casal espírita que havia idealizado filhos perfeitos com casamentos da mesma forma experimentava o gosto amargo da separação do mais velho. 
Depois da separação, Douglas não quis voltar para a casa dos pais. Foi morar sozinho. Livre como nunca pensara. De vez em quando, aparecia no centro para tomar um passe. Mas não se interessava em, digamos, seguir carreira no movimento espírita. 
Mais adiante, Douglas conheceu Talita, uma jovem com quem prontamente se afinou. Talita era mãe solteira de Carolina, menina que adorou Douglas assim que o conheceu (e ele, a ela). Foram morar juntos. Passado um tempinho, Douglas e Talita já eram pais de Carolina. O tão sonhado neto – no caso, uma neta – de Aloísio e Vera chegara, mas não da forma como haviam sonhado. Foi uma alegria mesclada com uma pitada de descontentamento. Afinal, a nora era mãe solteira. 
Vítor, o filho do meio, chef de cozinha, também se casou. Dono de um restaurante, conheceu Elaine, a esposa, especialista em vinhos, durante um evento. O casamento de Vítor deu certo. Ele encontrou de fato uma mulher que o completava, só que, ambos, devido aos vários eventos e viagens proporcionados na área em que atuavam, resolveram não ter filhos. Além disso, Vítor, que até então, por orientação dos pais, não dera importância a bebidas alcoólicas, passou, por influência da esposa e da profissão, a ser um apreciador dos bons vinhos. Ele não se tornou um bebedor contumaz, deixo claro. Mas gostava de harmonizar, ou seja, escolher que tipo de vinho ia melhor com carne bovina, peixe, cordeiro e por aí vai. Como espírita que era, gostava de estar no centro. Sempre que podia, ajudava nos eventos gastronômicos. Já preparara incríveis almoços beneficentes. Não dava expediente em outras atividades por causa do restaurante e das viagens e eventos gastronômicos em que, com prazer, estava sempre envolvido. 
Aloísio e Vera esperavam mais da união feliz de Vítor. Era um casamento que tinha tudo para lhes dar netos, mas Vítor e a esposa tiveram outros planos. E quando nosso casal de espíritas perfeito soube que o filho gostava de harmonizar os pratos por ele preparados com vinhos de uva tipo merlot,cabernet sauvignon etc., ficou muito triste. Exagero! Vítor não é nenhum alcoólatra! Graças à formação religiosa que teve, sabe muito bem o que faz! 
Por fim, Luciana, a caçula, profissional da área de turismo, aos 22 anos, conheceu Carlos, um executivo de 45, separado, e pai de três filhos. Ambos se gostaram e foram morar juntos, para decepção dos pais, que sonhavam um casamento de princesa para a única filha mulher. Não houve papel passado, nem bolo, nem doces. Luciana comunicou a decisão aos pais e, dias depois, fez as malas e se mudou para a casa do amado, com quem vive muito feliz até hoje. 
Ela e Carlos também não quiseram filhos. Ele já tinha três, e ela era nova; queria terminar os estudos e curtir o charmoso quarentão por quem se apaixonara. E como se entrosou muito bem com os enteados, praticamente da mesma idade dela, Luciana nunca teve muita vontade de ser mãe; deu-se por satisfeita como jovem madrasta de três adolescentes. 
Como boa espírita, Luciana frequentava um centro. Era evangelizadora de mocidade já que sempre gostou de lidar com jovens. Tanto que os enteados gostavam muito dela. 
Foi difícil para os pais aceitarem a decisão de Luciana. Até evitavam conversar sobre ela. Quando alguém perguntava, diziam que ela estava estudando no exterior. Embora não admitissem, Aloísio e Vera estavam com vergonha da filha. Acharam que sua atitude não condizia com a de uma moça de família. Ainda mais família espírita! Depois, felizmente, a poeira assentou. 
Tempos depois, Magda, prima de Vera, trouxe o casal à realidade. Após ouvir os dois tecerem um tapete de lamentações e decepções para com a prole, disse aos dois: – Sinto muito. Mas foi a melhor coisa que aconteceu a vocês. 
– Como assim? –retrucou Vera, atônita. 
–Vocês– disse Magda–sempre se acharam melhores do que os demais familiares e o pessoal do centro espírita. Sempre se acharam um modelo de família. Tinham a ilusão de que os filhos seriam iguais a vocês. Não contavam que eles cresceriam e fariam suas próprias escolhas. Vocês sempre acharam que as pessoas que não são espíritas, tal como vocês, não seriam tão bons espíritas como vocês. As escolhas dos meninos fizeram vocês colocarem os pés no chão. 
Magda quis dizer que o fato de Douglas, Vítor e Luciana serem espíritas não os isentava de serem cidadãos do mundo de hoje, em que o livre-arbítrio é mais dilatado. Um mundo no qual as mulheres são livres para administrarem a vida afetiva, sexual e profissional. Um mundo no qual o casamento de papel passado deixou de ser a única porta de entrada para a vida adulta. Um mundo no qual uma pessoa separada não carrega mais o estigma de décadas atrás. E quis dizer também que Aloísio e Vera não haviam falhado como pais. Pelo contrário, haviam dado aos três, desde a mais tenra idade, amor à luz da imortalidade da alma. Um amor capaz de torná-los seguros para fazer as próprias escolhas sem culpa e com maturidade. E quis dizer também que pais espíritas não devem achar que falharam porque os filhos não quiseram abraçar tarefas no centro espírita. Se quiserem, ótimo! Sempre há trabalho esperando. Mas o que importava é que os três eram boas pessoas, cidadãos do bem, éticos, íntegros, queridos, honestos e com sólida formação cristã e moral para seguirem suas vidas; espíritas, quer estivessem ou não integrados ao movimento espírita. E, acima de tudo, eram três irmãos que se adoravam e gostavam muito dos pais. 
A partir da advertência de Magda, Aloísio e Vera passaram a perceber que, de fato, os filhos estavam felizes com as próprias escolhas. Os três eram adultos. Portanto, competia a eles viver suas vidas e arcarem com as consequências de seus erros e acertos. Mesmo porque, Talita, Elaine e Carlos eram boa gente. Aloísio e Vera deixaram de lado o pé atrás e facilitaram a aproximação dos três. Com isso, perceberam que a filha mais velha de Talita e os três filhos de Carlos também gostavam muito deles. Por que não aceitá-los como netos também? Aceitaram. Essa abertura gerou um grande bem-estar para todo mundo. 
Daí por diante, nosso casal passou a cuidar mais um do outro, a viajar mais vezes. Iniciaram até atividades físicas. Enfim, foram viver sua vida de casal feliz, aceitaram as escolhas dos filhos e recuperaram a harmonia. 
A ilusão da família perfeita nos moldes por eles estabelecidos terminara. Aloísio e Vera haviam se humanizado. Tornaram-se, inclusive, não só melhores pessoas, como melhores espíritas. Menos bitolados, menos rigorosos... Mais tolerantes, flexíveis, arejados, modernos e compreensivos!

Marcelo Teixeira
Petrópolis, RJ (Brasil)


Imagem ilustrativa 

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Quem é o idoso?


“O corpo gera o corpo, porém o Espírito não é gerado pelo Espírito, porque já existia antes da gestação do corpo. Não foram os pais que geraram o Espírito de seu filho, eles apenas forneceram-lhe um corpo carnal.” – Está escrito n’O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XIV, item 8.
Quando encarnamos recebemos uma carga de fluido vital (fluido de vida). A quantidade de fluido vital não é a mesma para todos os seres; isso depende da necessidade reencarnatória de cada um.
André Luiz, em livro psicografado por Chico Xavier, explica que poucos são os completistas, ou seja, nascemos com uma estimativa de vida estabelecida pela quantidade de fluido vital recebido e, com os abusos que cometemos, podemos desencarnar antes do previsto, não completando o tempo estipulado.
Se viemos para acertar as pendências biológicas por mau uso do nosso corpo, como o suicídio direto ou indireto, vamos ficar aqui pouco tempo, somente o necessário para cobrir o tempo que desperdiçamos com os abusos numa vida anterior. Uma pessoa pode ter sua estimativa de vida programada para viver 80 anos e, em consequência de abusos químicos, por exemplo, desencarnar aos 65 anos, ficará devendo 15 anos. Na próxima encarnação, viverá somente 15 anos. 
Outros indivíduos vêm para uma tarefa prisional. Ao conviver com gerações que não são a sua, o indivíduo vai se sentindo isolado, um estranho no ninho. Os jovens o olham como se fosse uma peça de museu; com os companheiros da sua idade já não consegue se entender, pois lhe faltam estímulos visuais, auditivos ou lucidez. Torna-se pessoa dependente dos parentes, dos descendentes, para levá-lo aqui e acolá, para cuidar-se e tratar-se. Alguns idosos apanham, outros são explorados em seus bens materiais, outros são colocados em asilos onde nunca recebem visitas. Apesar do descaso dos filhos, dos familiares e da sociedade, que também terão de resgatar suas posturas equivocadas, esta é uma oportunidade de resgate dos abusos cometidos em outras vidas para, quem sabe, dobrar seu orgulho ou sua vaidade.
Em compensação, outros indivíduos vêm, cuidam da família, educam os filhos, se preocupam com o entorno, com a natureza. Ao findar a carga de fluido vital, voltam para o plano espiritual com a missão cumprida.
A escritora espírita, Dora Incontri, afirma que quem envelhece de modo apropriado é capaz de entender o conjunto da vida, que é uma preparação para o encontro com Deus. Quando o indivíduo estiver consciente deste destino eterno e tiver acumulado experiências proveitosas e puder repartir com os mais jovens o testemunho de uma vida exemplar, o declínio físico pouco importará. 
É necessário, portanto, a compreensão de que "o jovem de hoje, pelas determinações biológicas do Planeta, será o velho de amanhã; e o ancião de agora, pela lei sublime da reencarnação, será o moço do futuro". (André Luiz, do livro "Correio Fraterno", Francisco Cândido Xavier.)

Maria Angela Miranda
Londrina, PR (Brasil)

Fonte:http://www.oconsolador.com.br/ano9/425/maria_miranda.html

Imagem ilustrativa

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Você pode me explicar o que significa intelecto-moral?


Em carta publicada na seção de Cartas desta mesma edição ( Revista O Consolador ) o leitor João Zamoner pergunta-nos: Você pode me explicar o que significa intelecto-moral? 
A palavra composta “intelecto-moral”, que tem valor de adjetivo, é utilizada quando queremos dizer que determinado fato ou coisa dá relevância, ao mesmo tempo, à inteligência e à moralidade. 
Allan Kardec a utilizou quando escreveu sobre as Aristocracias, em um dos capítulos que compõem a 1ª parte do livro Obras Póstumas. Nesse texto, Kardec faz uma previsão acerca do advento futuro em nosso mundo do que ele chamou de aristocracia intelecto-moral. 
A palavra aristocracia vem do grego Aristos, o melhor, e Kratus, poder. Aristocracia significa, assim, o poder dos melhores, conquanto saibamos que o sentido primitivo da palavra foi por várias vezes deturpado. 
De acordo com o texto escrito por Kardec, verificaram-se na história da Humanidade terrena cinco espécies de aristocracia:

1 - Aristocracia dos patriarcas

Nas sociedades primitivas, quando surgiu, em decorrência da formação dos grupos sociais, a necessidade de uma autoridade, esta foi conferida aos chefes de família, aos anciãos e aos patriarcas. Surgia assim a primeira de todas as aristocracias, um fenômeno que ainda se vê em pleno século 21 em algumas comunidades indígenas.

2 - Aristocracia da força

Com o surgimento dos conflitos e das guerras, a autoridade foi sendo transferida aos poucos para os indivíduos fortes e vigorosos, ocorrendo então o advento dos chefes militares. Surgia com isso o segundo modelo de aristocracia.

3 - Aristocracia do nascimento

Os detentores do poder foram, com o tempo, transferindo seus privilégios e sua autoridade aos descendentes. Nascia então o terceiro modelo de aristocracia, geralmente fundamentada em leis outorgadas por quem estava no poder e nisso tinha interesse. Na organização política atual, como por exemplo no Brasil, senadores e deputados costumam inserir seus filhos e netos na política, transferindo-lhes o seu prestígio e seus votos, o que constitui um resquício do terceiro modelo de aristocracia surgida no mundo.

4 - Aristocracia do dinheiro

Com o surgimento das grandes fortunas, elevou-se na Terra um novo poder, o do ouro, visto que com o ouro pode-se dispor de homens e coisas. O que não se concedia mais aos títulos, concedeu-se à fortuna e esta, como ainda é bastante comum em nossos dias, passou a ser detentora do poder. Foi esse o quarto modelo de aristocracia verificada no planeta.

5 - Aristocracia da inteligência

Este modelo é o que vai se insinuando no mundo, em que técnicos e especialistas nas mais diferentes áreas é que ditam as regras que governam os povos. Ocorre que a inteligência, por si só, não é garantia de que todos os seres humanos de igual forma serão contemplados pelos detentores do poder. O desenvolvimento intelectual sem o guia dos princípios morais pode, como sabemos, ter consequências desastrosas para a sociedade.

Kardec prevê então, no texto que mencionamos, o surgimento de uma sexta forma de aristocracia no mundo, como decorrência da própria evolução da Humanidade, a aristocracia intelecto-moral, em que, por definição, a inteligência e a moralidade estarão presentes na autoridade, a que todos podem submeter-se, confiados em suas luzes e em sua justiça.  
Algo semelhante já se vê em algumas comunidades espirituais, como a colônia Nosso Lar, descrita por André Luiz no livro de mesmo nome. O governador de Nosso Lar reuniria as duas condições que o Codificador do Espiritismo assinala como características da aristocracia intelecto-moral.

Astolfo O. de Oliveira Filho
Londrina, Paraná (Brasil)


Imagem ilustrativa

domingo, 2 de agosto de 2015

Intuição salvadora


Uma jovem senhora, mãe de duas meninas, nos apresentou seu filho mais novo, um lindo menino de cerca de 50 dias de idade e já com cinco quilos. Contou-nos ela uma história emocionante, que nos faz, uma vez mais, atestar o socorro incessante que nos é proporcionado pelo amor divino. Disse ela que estava tudo certo para que tivesse um parto normal. Acompanhava tudo corretamente com seu obstetra no pré-natal. Quando estava com 39 semanas de gravidez, faltando poucos dias para o parto normal, numa sexta-feira, acordou sentindo uma impressão angustiante. Não podia esperar o parto normal. Tinha que fazer uma cesariana naquele dia mesmo. Começou a chorar sem parar, não conseguia parar de chorar. Ligou para o médico, desesperada, que tinha que fazer cesariana naquele dia mesmo e chorando sem parar. O médico aquiesceu e conseguiu um centro cirúrgico para aquele dia mesmo. O marido assistiu à cirurgia e ouviu o médico comentar várias vezes, surpreso: - Eu nunca vi isso antes!
Eventualmente ouve-se comentar sobre o circular de cordão, quando o cordão umbilical enrola no pescoço do bebê e é um risco para a vida da criança ou para o cérebro, se apertar. Isso pode ser previsto hoje em dia com aparelhos e salvar o bebê. Nessa gravidez, os exames pré-natais estavam perfeitos, não havia suspeita de nada errado. O médico surpreendeu-se ao ver que o cordão umbilical tinha virado sobre si mesmo, estava fazendo um nó em si mesmo e, se apertasse, o bebê podia morrer no útero ou no parto normal. A atitude da mãe salvou-lhe o filho. Ali estava ele, lindo, sem sequela alguma.
Perguntamos à mãe se ela havia sonhado com algo que lhe pudesse ter sugerido aquela atitude. Ela disse que não, que só estava com aquela impressão horrível e que tinha que fazer uma cesariana urgente. Ainda bem que o médico a ouviu. Na questão 459 de “O Livro dos Espíritos”, Kardec pergunta se os Espíritos influem sobre nossos pensamentos e nossas ações e a resposta é que nesse sentido a sua influência é maior do que supomos e que, muito frequentemente, são eles que nos dirigem. Essa jovem mãe, com certeza, foi amparada pelos benfeitores amorosos, para que tomasse a atitude referida, que salvou a vida de seu filho.
Na questão 471, Kardec pergunta se quando experimentamos um sentimento de angústia, de ansiedade indefinível, ou de satisfação interior sem causa conhecida, isso decorreria unicamente de uma disposição física. Os Espíritos respondem que isso é quase sempre um efeito das comunicações que, sem o saber, tivemos com os Espíritos durante o sono.
A mãe não lembrava e, na grande maioria, as pessoas não se lembram dos sonhos. Léon Denis explica isso em seu magistral livro “O Problema do Ser, do Destino e da Dor”. O Espírito, em se desprendendo do corpo durante o sono, permanece ligado a ele por um laço fluídico, que transmite ao corpo as impressões do mundo espiritual. Ora, o corpo é matéria densa, que vibra em estado desacelerado, enquanto o Espírito, em estado de vibração acelerada, fora da matéria, está vivenciando uma situação energética rápida. Quanto mais longe o Espírito for, em camadas mais elevadas, menos material será sua lembrança, pois maior será o estado de energia e menor o da matéria densa. Menos nitidez de lembrança, devido à densidade da matéria física, impressiona menos o corpo material, a menos que o Espírito vivamente o deseje, com toda a força de sua vontade. Como, espiritualmente falando, nem sempre o Espírito deseja ou tem condições, esquecerá ao acordar, embora em sua memória espiritual a lembrança se mantenha, fora de seu cérebro físico. Há também os casos em que os mentores apaguem a memória, permitindo somente a lembrança do necessário, para que o encarnado, em lembrando a alegria e a beleza do mundo espiritual, não perca a vontade de viver aqui na Terra. Vemos isso expresso nas obras de André Luiz, pela psicografia de Chico Xavier.
A mãe do bebê deve ter sido visitada em sonhos e alertada. Ao acordar, não tinha a lembrança, mas uma impressão, um mal-estar, a certeza de que tinha que intervir no mesmo dia e não aguardar o parto normal, que é o que desejava.
Bendito é o amor de Deus que sempre socorre! Nunca estamos sozinhos. Sempre amparados. Quantas vezes teremos sido socorridos, sem o saber? Como diz Emmanuel, no livro “Fonte Viva”, psicografado por Chico Xavier, na mensagem Capacete da Esperança, resguardemos, pois, o nosso pensamento com o capacete da esperança fiel e prossigamos para a vitória suprema do bem. Tenhamos fé no amparo e socorro de Deus. Prossigamos na grande batalha com nós mesmos, para o nosso aprimoramento, na certeza de que estamos sob a proteção dos que nos amam, no mundo espiritual.

Jane Martins Vilela
Cambé, PR (Brasil)

Imagem ilustrativa

quarta-feira, 29 de julho de 2015

João Pedro


Esse novo amigo tem apenas 5 anos. Um garoto inteligente, afetuoso, que corre a me abraçar onde me vê. Tocou-me o coração. Foi conosco, acompanhado pelos pais, a Guaxupé (MG), num evento de grande porte – onde havia 700 pessoas –, participando ativamente das atividades dedicadas às crianças. Foi num fim de semana, fomos no sábado e voltamos no domingo.            
Minha participação no evento foi proferir palestra no encerramento. O tema era dedicado ao afeto, ao cuidado que devemos ter uns com os outros, na vivência do respeito e no esforço da fraternidade, onde se inclui naturalmente o amor e o carinho às crianças, para que se sintam amadas, respeitadas e acolhidas. Aliás, já se sabe, que a maioria dos casos de desequilíbrios sociais na vida adulta é resultante de uma infância desprezada ou vivida sem amor dos pais ou responsáveis adultos pela criança. Isso é normalmente constatado em terapias, onde traumas, medos e angústias tem sua origem na infância, repetindo, na maioria dos casos.              
Antes da minha vez de assumir a tribuna para iniciar a palestra, tive um insight e pedi autorização aos pais, sem nada combinar com o garoto e pedi aos pais nada dissessem a ele.              
Iniciei a abordagem, desenvolvi a temática durante uns 25 minutos e, ao final, após todas as considerações, que julguei viáveis e oportunas pertinentes ao tema, citei que um novo amigo já estava entre nós e chamei-o pelo nome: João Pedro, venha ao palco!              
Agachei-me, abri os braços chamando-o para o abraço de dois velhos amigos. Ele veio correndo pelo palco, na presença do imenso público, e lançou-se aos meus braços, com a espontaneidade e alegria que é própria das crianças, que é característica peculiar da pureza de coração.              
Levantei-o nos braços, levei-o até o microfone, colocando-o de pé sobre a cadeira para alcançar o pedestal e fiz rápidas perguntas que ele respondeu com graça, fazendo a emoção do público. Que cena comovente! A espontaneidade de uma criança, onde o coração ainda não se impregnou da malícia, do melindre, da desconfiança ou do preconceito.              
Abraçamo-nos com alegria. Encerrei a fala para dizer que na pureza infantil está, sem dúvida, a chave da felicidade humana, o segredo para sairmos de nossas neuroses e vencermos os quadros deprimentes da vida adulta perturbada pelas neuroses que vamos acumulando.              
Não é por outra razão que afirmou o Mestre da Humanidade: deixai vir a mim as crianças, porque delas é o Reino dos Céus.              
Sim, é o reino da humildade interior, da alegria espontânea, do comportamento puro de quem confia e não se deixa contaminar por preconceitos ou pensamentos e posturas pré-concebidas que tantas vezes nos permitimos adotar.              
É que o afeto é capaz de construir a felicidade, dentro e fora de casa, em qualquer lugar. Tratemos de valorizar essa grande virtude de nos tratarmos com docilidade, com respeito, com fraternidade. Maridos e esposa, tratemos nosso cônjuge com carinho e atenção, são eles os companheiros que a vida nos deu para essa caminhada de aprendizado.              
Abracemos os filhos, abramos o coração aos amigos, sejamos mais afáveis uns com os outros, construamos a fraternidade.              
Sejamos como João Pedro: espontâneos, puros de coração. Ele é uma criança, mas todos nós podemos nos esforçar para esse comportamento.    

Parabéns aos pais! Meu abraço ao menino querido.

Orson Peter Carrara

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Violência e Paz


O mundo está perigoso, diz-se à boca cheia. Cada vez há mais violência, não só entre povos como também entre grupos de interesses e familiares. Haverá solução para este drama social que nos consome?

1 - Um estudo revela que, de 162 países, apenas 11 não estão em guerra no mundo hoje. Não em guerra aberta declarada, mas envoltos nas guerras regionais e locais, de um modo ou de outro.

2 - Este ano, em Portugal (país pacífico), já foram mortas 27 mulheres (até 28 de Novembro de 2014), vítimas de violência doméstica.

3 - Curiosamente não se consegue encontrar um número definido de organizações que estão empenhadas na paz do mundo. Impossível conseguir contabilizar os atos de paz levados a cabo, diariamente, no mundo inteiro.

Figuremos dois pescadores, na pesca a linha, numa praia. Um diz que o mar é perigoso, pois tem peixes-aranha, tubarões, tsunâmis; as pessoas morrem afogadas, há naufrágios. O outro refuta os argumentos, dizendo por sua vez que o mar serve para pescar, fazer caça submarina, surf, bodyboard, andar de barco, nadar etc.

Qual dos dois tem razão, sendo o mar neutro?

Obviamente, tudo se desdobra no campo do mero ponto de vista, na maneira como analisamos as situações. 
Os órgãos de comunicação social de hoje têm sede de escândalos, de “sangue” de notícias que firam a sensibilidade, pensando assim estarem a prestar um bom serviço à comunidade. Esta, por sua vez, intoxica-se mentalmente com o mal alheio, como se isso alimentasse a sua sede inconsciente de sobrevivência. 
Jesus de Nazaré aconselhava, sabiamente, “amai o próximo como a vós mesmos”, numa notável lei de sabedoria para uma convivência pacífica e evolutiva na sociedade. 
O problema é que não amamos o próximo (isto é, não fazemos ao próximo o que desejaríamos para nós) porque também não nos amamos (não temos sentimentos, pensamentos e atitudes que nos façam bem). 
Escolhemos o melhor peixe, a melhor carne para que o corpo físico não adoeça (corpo que irá morrer), e intoxicamo-nos com todo o lixo mental que encontramos (sendo o Espírito imortal). 
São os paradoxos do ser humano, numa sociedade que perdeu o Norte de Deus e que tem de reaprender a amar-se e a amar, para poder ser feliz. 
A violência e a paz são estados de alma, que cada um pode escolher amplificar e esparzir pelo mundo afora. 
A violência e a paz, mais do que atos exteriores, são estados de alma que cada um carrega de acordo com as suas escolhas íntimas. 
Há que alimentar as atitudes pacíficas e transmutar as tendências violentas. Para isso, urge nos educarmos, aprender e ensinar as nossas crianças, em busca de um dever melhor. 
“Fora da caridade não há salvação” é um lema da doutrina espírita que projecta para hoje essa paz que todos buscamos e que tão pouco fazemos para que se torne realidade. 
Fica o convite: a partir de hoje, treinarmos, diariamente, a nossa mente em busca da paz, questionando que sentimentos temos tido, que pensamentos alimentamos, que tipo de conversas tivemos, que filmes e programas televisivos vimos, que gênero de livros lemos, e o que fizemos pela paz em nós, na família, na comunidade e no mundo…

José Lucas
Óbidos, Portugal 

Imagem ilustrativa

terça-feira, 14 de julho de 2015

O debate a respeito da redução da maioridade penal


Um dos assuntos mais debatidos nos últimos anos no Brasil trata da polêmica redução da maioridade penal. Mas seguindo na contramão da racionalidade e da lógica ficamos - também nesse tema - gastando enorme tempo em discussões estéreis e absolutamente dissociadas da realidade. Vários argumentos e análises (frágeis em sua maioria) têm sido brandidos ao longo dos anos, mas que não ajudam na efetiva solução de tão grave problema social. Portanto, é mais do que hora de encarar o assunto com a seriedade e objetividade necessárias. 
Uma criança ou adolescente contemporâneo – isto é, pertencente à geração Z (nascidos entre 1990-2010) – tem conhecimentos, percepções e experiências muito mais significativas e abrangentes do que obtiveram, por exemplo, os seus pares da geração Baby boomers (nascidos entre 1946-1964). De fato, há praticamente um fosso entre essas gerações não apenas etário, mas também contextual. 
Crianças ou adolescentes da atualidade têm acessos a objetos e oportunidades que os seus avós nem sequer sonharam. Também é inegável que o salto tecnológico alcançado nas últimas décadas e a mudança radical de costumes moldou o mundo moderno de tal maneira que as crianças amadurecem bem mais cedo. Em decorrência disso, as crianças são inseridas na realidade da vida muito precocemente. Em contrapartida, elas não são tão facilmente manobráveis como outrora foram as das gerações pregressas. De fato, elas têm uma vontade inquebrantável, personalidade forte, comportamento irritadiço e, por conta desses traços, fazem valer as suas opiniões e desejos com frequência (não raro, indesejável). É muito difícil lhes impor qualquer coisa. Dominam a arte da negociação o que lhes dá vantagem quando a empregam com os pais. 
Além disso, são muito mais articuladas, astutas e antenadas, considerando a forte exposição à realidade cotidiana a que são submetidas. Ademais, em menor ou maior grau a violência e o bullying fazem parte do cotidiano delas, independentemente da classe social à qual pertençam. 
Por tudo isso, portanto, pode-se inferir que são seres humanos que entendem e captam as nuances da vida muito mais rapidamente do que as crianças e jovens de outras gerações. Por conseguinte, as noções do mal e do bem lhes são praticamente palpáveis considerando os acontecimentos e turbulências com as quais convivem nessa era pós-modernista e ainda profundamente desespiritualizada. 
No que concerne ao melhor procedimento punitivo a ser adotado, mais inteligente será se os nossos legisladores se inspirarem no que outros países mais avançados vêm fazendo, descartando-se de vez as ideias malsãs e as sugestões obtusas. Desse modo, as experiências bem-sucedidas e pragmáticas de países como França, Canadá, Suécia, Dinamarca e Finlândia – examinadas pela revista VEJA de 18 de abril e pelo jornalista Reinaldo Azevedo em matéria postada em seu blog em 31 de março – podem perfeitamente nos servir de referências saudáveis. 
Nesses países, aliás, um criminoso de 13/15 anos ou até mesmo sem qualquer restrição etária como no caso da Inglaterra, dependendo da gravidade do seu delito, poderá ser condenado como um adulto. No geral, a pura redução da maioridade de 18 para 16 anos para efeito de imputação penal não avança muito sobre a questão. Do ponto de vista espiritual, entretanto, alguns fatos precisam ser devidamente salientados de modo a alicerçar as decisões dos legisladores, bem como salvaguardar a sociedade da sanha de delinquentes perversos e desalmados. Nesse sentido, cumpre destacar que, como pondera o Espírito Joanna de Ângelis na obra Liberta-te do Mal (psicografia de Divaldo Franco), “A imensa caravana terrestre é constituída por Espíritos enfermos, ainda necessitados de amar, desdobrando os sentimentos nobres que se lhes encontram adormecidos...”. 
Posto isto, o primeiro aspecto a ser considerado é o fato de que um adolescente, salvo raras exceções, tem plena consciência dos seus atos. Em outras palavras, ele já está adequadamente familiarizado com a noção do que é certo ou errado. Seguir numa direção ou outra depende exclusivamente das suas próprias escolhas que, aliás, lhe são oportunizadas bem mais cedo simplesmente porque assim faculta a sociedade atual. Mas é preciso lembrar que elas também vêm acompanhadas das inerentes e intransferíveis responsabilidades. 
Em segundo lugar, habitando o corpo de um adolescente há, fundamentalmente, um Espírito milenar portando características éticas e morais desenvolvidas ou não, assim como aspirações d’alma e compromissos assumidos perante a espiritualidade. 
Por isso, um adolescente que pratica um crime hediondo está fazendo pleno uso do seu livre-arbítrio. Ao viver em sociedade não lhe é estranha a necessidade de respeitar determinados imperativos tais como não matar, não ferir e não furtar, entre outros. Mas ao enveredar por essas obscuras veredas, o infrator deve ser responsabilizado à altura do crime perpetrado, independentemente da sua idade. É, a propósito, o que a maior parte da sociedade anseia e igualmente o que os países mais avançados estão realizando nessa área. Reinventar a roda aqui soa como algo insipiente e desproposital. 
De modo geral, os criminosos precisam ser adequadamente isolados para refletir sobre as suas ações infelizes. Nesse processo de afastamento do convívio social, o ser desajustado tem de lidar com a justa expiação pelas suas faltas cometidas e assim obtém as condições ideais para o encontro com o arrependimento. A partir dessa apropriada correção aprende a valorizar a liberdade e a vida equilibrada em sociedade até que o Criador lhe conceda novas oportunidades de reajuste. Ao Estado cabe lhe proporcionar condições dignas e humanas para a reparação. 
      
Anselmo Ferreira Vasconcelos
São Paulo, SP (Brasil)

Imagem ilustrativa

segunda-feira, 13 de julho de 2015

O dia em que desencarnou Kardec


Sempre que iniciamos o mês de abril, nós, espíritas, somos lembrados de alguns eventos de suma importância ocorridos nesse período, como o lançamento de “O Livro dos Espíritos”, no dia dezoito; o nascimento de Chico Xavier no dia dois etc. Hoje citaremos um fato muito marcante: o dia do velório e enterro do corpo de Allan Kardec.
No dia 31 de março de 1984, quando se comemorava mais um aniversário da desencarnação do insigne codificador do Espiritismo, Allan Kardec, nosso querido Chico, em seu semanal encontro sob um abacateiro, na periferia de Uberaba, narrou uma história sobre o momento, que lhe foi contada pelo inesquecível Dr. Canuto Abreu.

Diz Chico:

Em 1869, no princípio do ano, ele (Allan Kardec), com os espíritas, imaginou fazer a primeira livraria espírita do mundo, que seria a livraria de Paris (hoje, pelas circunstâncias da vida francesa, ela não existe mais). A livraria se propunha a divulgar as obras espíritas. Ele e aquela turma já trabalhavam por três meses. Nos últimos dez dias de março, ele sentiu as chamadas dores pré-cordiais, que hoje são tratadas a tempo, mas no ano de 1869... Começou a sentir aquelas dores no peito, que precedem a determinados problemas difíceis na circulação, como sendo a fibrilação do músculo cardíaco...
A senhora dele, D. Gaby, faltando uns quatro dias para a morte do Codificador, ouviu-o dizer:

– Gaby, eu me sinto indisposto, com muita dor no peito, mas a inauguração da livraria espírita está prevista para o dia 1º de abril; faltam cinco dias para arranjar tudo para uma inauguração tão distinta quanto possível... Eu não me sinto bem, mas no dia 1º de abril eu tenho que inaugurar a livraria.
Ela, então, disse:

– Mas se você estiver com essa dor muito aumentada, podemos deixar para outra semana, daqui a uns quinze dias...

Nove anos mais velha do que ele, ela tinha por Kardec um desvelo também maternal... Naquela época, as viagens não eram tão fáceis. Os amigos que vinham ajudar, na inauguração, já estavam viajando para Paris, ou com todos os preparativos feitos... A viagem era feita a cavalo, e eles, em determinadas estações, tinham que ser mudados.

E os dois começaram a dialogar:

– Nós temos aí talvez mais de cinquenta companheiros, da França, da Bélgica... Eu não posso deixar, com dor ou sem dor, tenho que ir.
– Mas eu, como sua esposa, não acho que isto esteja certo.
– Mas eu não posso desconsiderar o dinheiro que os irmãos gastaram para vir até aqui.
– Apesar disso tudo, eu aconselharia você a adiar...
– Você me aconselha a adiar, mas, se eu estiver muito mal, no dia primeiro, ou que tenha até desencarnado, já que estamos numa Doutrina de caridade, o que é que você faria por mim, se eu estiver incapacitado para ir até o local da livraria, já que a inauguração está prevista para as dez horas... Não podemos fazer os outros esperarem, isto também é caridade.
– Já que a sua decisão é tão firme, no caso desse ato inauguratório, no caso de você piorar...
– E no caso de eu desencarnar?
– Mesmo assim, se você piorar ou desencarnar, eu irei no seu lugar.

E, no dia 31 de março, ele desencarnou, tudo indica por um aneurisma; foi repentino. Os amigos começaram a visitar a casa, já bem à noitinha... Então alguém aventou a hipótese de adiar a inauguração. Mas D. Gaby respondeu:

– Não, eu e meu marido conversamos sobre isto; ele está na urna; amanhã é o primeiro dia do velório, mas, às 10 horas eu irei cumprir o que a ele prometi; em nome da Doutrina de caridade, eu vou substituí-lo.

E, de manhã cedo, no dia 1º de abril, às 8 horas, D. Gaby despediu-se do corpo do esposo e falou com ele que ia cumprir a sua tarefa... Pediu-lhe desculpas por se ausentar de casa e foi para o local... Demorou umas duas horas, deu entrevistas, fez conferências e depois voltou para junto do corpo do marido... Os jornais da época comentaram muito sua coragem. Como percebemos, estamos numa Doutrina que nem a morte nos pode privar do dever a cumprir.

(Este caso está registrado no livro “Chico Xavier, à sombra do abacateiro”, de Carlos A. Bacelli, editora IDEAL.)

José Antônio V. de Oliveira
Cambé, PR (Brasil)

Imagem ilustrativa

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Frutos


Note o leitor como o texto abaixo é atualíssimo para a realidade do país e que especialmente pode ser aplicado à nossa realidade individual interior. Ele foi escrito em 1863 e retrata bem o descuido que vivemos com os autênticos valores que deveríamos preservar. A situação política do país é um reflexo direto desse descuido. Peço ao leitor ler atentamente com os olhos da pesquisa imparcial. O texto é todo construído com imagens simbólicas, de alto alcance filosófico e deve ser lido além das formas, além da moldura das palavras.

“(...) Os frutos da árvore da vida são os frutos de vida, de esperança e de fé. (...) A árvore é sempre boa, mas os jardineiros são maus. Eles quiseram conformá-la à sua ideia, quiseram modelá-la segundo as suas necessidades; eles a cortaram, diminuíram-na, mutilaram-na; seus ramos estéreis não produzem maus frutos, pois nada produzem. O viajor sedento que se detém sob sua sombra para procurar o fruto da esperança que lhe deve restituir a força e a coragem, não distingue senão ramos infecundos fazendo pressentir a tempestade. Em vão, ele procura o fruto da árvore de vida; as folhas caem secas; a mão do homem de tanto manejá-las, queimou-as. (...)”.

E prossegue com propriedade:

“(...) Aquele que a plantou vos convida a cuidá-la com amor, e a vereis produzir ainda, com abundância, seus frutos divinos. (...) não a mutileis; sua sombra intensa quer se estender sobre o Universo; não encurteis seus ramos. Seus frutos benfazejos caem em abundância para sustentar o viajor sedento que quer atingir o objetivo; não os colheis, esses frutos, para os guardar e os deixar apodrecer, a fim de que não sirvam a ninguém (...); a árvore que produz bons frutos deve distribuí-los para todos. Ide, pois, procurar aqueles que estão sedentos; conduzi-os sob os ramos da árvore e dividi com eles o abrigo que ela vos oferece. (...)”.

A linguagem simbólica indica claramente o egoísmo que ainda nos caracteriza a condição humana, preocupados que ainda estamos em acumular, esquecidos ou negligentes dos cuidados com os valores reais da vida e seus frutos, manipulando, moldando aos nossos interesses e adaptando-os às nossas ideias, nem sempre saudáveis, mutilando-os em seus reais objetivos. E tudo isso com prejuízos enormes à coletividade que busca, sedenta, seus frutos de vida, de esperança e fé. Seria o caso de pensarmos no alcance da expressão: frutos de vida, esperança e fé, além das palavras e em toda sua abrangência. 
O egoísmo é o grande responsável por esse quadro de interesses, dos quais estamos assumindo enorme responsabilidade perante a vida e seus nobres objetivos.

A transcrição parcial, porém, não é desanimadora. É antes, construtiva, convidando à fraternidade: “(...) segui aqueles que vos conduzem à sombra da árvore da vida (...)”.

Afinal, reconhece-se o cristão pelas suas obras, como indica o título do texto. E essas obras produzem a pura brisa da harmonia individual e social, pois que “A lei de amor substitui a personalidade pela fusão dos seres e aniquila as misérias sociais”. 
A crise moral que se abate sobre o país é resultante do esquecimento de princípios básicos de amor e conduta reta e poderemos alterar tudo isso a qualquer tempo, fazendo as mudanças dentro de nós, que se refletirão inevitavelmente na vida social.

Extraídos de O Evangelho Segundo o Espiritismo, em transcrição parcial dos capítulos XI e XVIII, os textos oferecem reta orientação aos desafios da atualidade.

Orson Peter Carrara

Imagem ilustrativa

domingo, 5 de julho de 2015

O necessário e o supérfluo, mas sem passar batido


O jornalista espírita André Trigueiro, meu amigo-irmão, é especialista na área ambiental. Tem livros publicados e também faz inúmeras palestras sobre o assunto, tanto em centros espíritas como em universidades, igrejas católicas e em todo local onde houver um grupo religioso, estudantil ou entidade de classe interessada em meio ambiente, assunto de suma importância para melhor nos situarmos no mundo atual, às voltas com mudanças climáticas, consumismo e afins. 
Certa vez, em Petrópolis, durante o seminário “Ecologia e Paz”, o André, ressaltando que a Doutrina Espírita aborda várias vezes a questão ecológica, disse que precisamos deixar de passar batido pelo item “O necessário e o supérfluo”, de “O Livro dos Espíritos” (terceira parte, capítulo cinco, questões 715 a 717). 
Confesso que não lia essas questões há um tempo. Passei batido também, como advertiu o André. E fiquei surpreso ao ver que são apenas três questões que, de fato, devem passar despercebidas para muitos. É como se as três formassem um item de menor importância, perdido na parte que estuda as Leis Morais. Como nada nas obras de Kardec é mais ou menos importante (tudo tem o mesmo e importantíssimo peso) e eu também sou um entusiasta da questão ambiental, resolvi me debruçar sobre as três. Que Santo André Trigueiro, padroeiro das causas ecológicas, me ajude! 
Na questão 715, Kardec pergunta “Como pode o homem conhecer o limite do necessário?”. A resposta diz que o homem ponderado conhece tal limite por intuição. Muita gente, no entanto, só irá conhecê-lo à própria custa, ou seja, batendo cabeça. 
Quando reli essa questão, lembrei-me de uma senhora com quem dividi algumas sessões de fisioterapia quando torci o tornozelo há alguns anos. Conversa vai, conversa vem, ela contou que ela e o marido moravam numa casa com cinco suítes. Uma para o casal. As demais, para os quatro filhos homens. Só que os filhos já haviam saído de casa por terem casado ou ido trabalhar em outra cidade. Ficaram ela e o marido morando numa residência cheia de suítes, que ela mantinha fechadas e nas quais não entrava havia meses. Contou, também, que por ser uma casa grande, havia demorado a ficar pronta. Por isso, os filhos aproveitaram pouco das suítes. Perguntei se ela pensava em vender a casa, quem sabe para alguém interessado em transformá-la numa pousada. A casa, disse a senhora, estava à venda, mas ainda não havia aparecido comprador. 
É claro que se tenho dinheiro e sou pai de quatro filhos, não vou morar com minha família numa casa apertada. Mas se ajo com ponderação, como ressalta “O Livro dos Espíritos”, perceberei que, em breve, eu e minha esposa corremos o risco de ficar sozinhos numa casa imensa. Creio que se os proprietários tivessem construído uma casa com dois quartos para os filhos (dois filhos por quarto) e dois banheiros sociais, fora a suíte de marido e mulher, a casa estaria num bom tamanho. Todos teriam aproveitado mais não só a casa, mas também a companhia uns dos outros. 
Na Região Serrana do RJ, onde vivo, há casas cinematográficas em profusão. Todas com inúmeras suítes (com closet), churrasqueira, forno a lenha, salão de jogos, casa de hóspedes, piscina, sauna seca e a vapor e por aí vai. Muitas delas à venda há meses. Não aparece comprador. Hoje em dia, muita gente não dispõe de tempo e dinheiro para manter uma mansão. 
Quando “O Livro dos Espíritos” diz que muitos vão conhecer o limite do necessário pela própria – e muitas vezes sofrida – experiência é porque não sabemos lidar com a matéria de forma equilibrada. Geralmente, pensamos que ser materialista é não acreditar em Deus ou na existência de algo além da morte. Mas materialismo também é não parar para pensar na hora de construir um imóvel que, mais adiante, se transformará num elefante branco. Não só pelo tamanho do mesmo, mas pela quantidade de tempo e dinheiro que a casa mega linda requer para permanecer de pé e arrumada. Estou falando de impostos altos, número de empregados, material de limpeza... Tudo para dar conta do número exagerado de quartos, salas e banheiros que a gente inventou. Haja material de construção! E cimento, barro, madeira e Cia. Ltda. vêm de onde? Da Natureza, que já demonstra sinais de saturação por causa de tanta extravagância. 
A resposta à pergunta 716 diz que a Natureza deu ao homem uma organização que lhe traça os limites da necessidade. O homem, porém, tudo alterou por causa de vícios que o fizeram criar necessidades nada reais. 
Hoje em dia, é farta a oferta de confeitarias, restaurantes de comida a quilo, lanchonetes de comida rápida... Comida saborosa, farta e acessível. Mas será que temos necessidade de, todo santo dia, tomar refrigerante, comer brigadeiro, se entupir de batata frita? 
Em 16 de dezembro de 2013, o pediatra carioca Fábio Becker deu entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura. Ele abordou a questão da comida pronta de hoje em dia. Nos Estados Unidos, paraíso do alimento industrializado, a comida é feita com sabor, crocância e consistência ideais para que a criança rejeite o alimento natural quando o provar. Dessa forma, diz ele, corremos o risco de ter crianças que só aceitam comida fabricada e rechaçam a couve, o chuchu, a beterraba... Vícios que alteram nossa constituição e criam necessidades irreais, conforme observa o sempre atual “O Livro dos Espíritos”. 
O André Trigueiro é inimigo do closet. Em suas palestras, ele sempre fala da desnecessidade de fazermos um cômodo estilo sala de troféus para exibir a coleção de sapatos, gravatas, lingerie, camisas, toalhas felpudas e sabe lá Deus o quê. E esse cômodo supérfluo tem, ainda por cima, iluminação especial, feita por um “light designer”. Haja energia elétrica! 
Se o André elegeu combater o closet, eu escolhi a varanda gourmet como inimiga. Tenho visto, em recentes lançamentos imobiliários no RJ e SP, apartamentos com as tais varandas, que vêm equipadas com churrasqueiras. Será que precisamos de churrasqueiras em varandas de apartamentos? Fico imaginando o fumacê se todo mundo resolver fazer churrasco no mesmo dia. Sabemos que uma das grandes causas de desmatamento na Amazônia é a criação de pastos para o gado. Portanto, a fumaça do exagero churrascal é a mesma das queimadas na Amazônia. Será que precisamos consumir tanto churrasco assim? Será que virou um item de primeira necessidade, a ponto de novos apartamentos já virem com a tal da varanda gourmet? Além disso, a área de serviço teve o espaço bastante reduzido para dar lugar à dita cuja gourmet. Há lugar para tanque, máquina de lavar e um pequeno armário. Nada mais. Será que só eu lavo e seco roupa em casa? 
Todos nós sabemos que o dia a dia doméstico não é varanda gourmet. É, entre outros itens, um local para secar a roupa que foi lavada. Digo isso porque já vi apartamentos de condomínios luxuosos cheios de varais de chão na varanda gourmet. Ou seja, não há local para secar a roupa. E quando chove, os varais de chão repletos de panos de pratos, meias e afins molhados ficam na sala. Eu particularmente prefiro uma boa área de serviço a uma varanda gourmet. Abaixo a varanda gourmet! 
Por fim, a questão 717, que diz que os homens que se apropriam dos bens da Terra para ter o supérfluo enquanto muitos não possuem o necessário terão de responder pelas privações que causam. Estas palavras me fazem lembrar Madre Teresa de Calcutá. Uma vez, ao desembarcar nos Estados Unidos para uma conferência, ela ficou horrorizada ao ver a quantidade de comida que estava sendo jogada fora no aeroporto. Comida industrializada, cheia de gordura. Mas ainda assim, comida. Comida feita de trigo, carne, leite, milho, batata e outros itens, que foram tirados na Natureza (Olha ela aí novamente!), para alimentar um bando de gente que come em excesso e joga fora toneladas de alimentos todos os dias. Até quando? 
No livro “Mundo Sustentável”, o André Trigueiro, referindo-se ao desenho animado “Mogli, o Menino Lobo”, cita a música cantada pelo Urso Balu, amigo do personagem-título: - Necessário, somente o necessário. O extraordinário é demais. 
Sei que às vezes é difícil estabelecer o limite entre o necessário e o supérfluo. Mas como diz o André Trigueiro, um bom indício é evitarmos fazer coleção. Todos sabem quantos sapatos, celulares, automóveis, toalhas e peças de roupa devem ter. É questão de foro íntimo. Mas se alguém começa, por exemplo, a fazer coleção de sapatos, é melhor acender o sinal de alerta. Afinal, como diz o adendo à questão 717, “Tudo é relativo, cabendo à razão regrar as coisas”.

Marcelo Teixeira

Imagem ilustrativa

sábado, 27 de junho de 2015

Terrorismo de natureza mediúnica


Sutilmente vai-se popularizando uma forma lamentável de revelação mediúnica, valorizando as questões perturbadoras que devem receber tratamento especial, ao invés de divulgação popularesca de caráter apocalíptico. 
Existe um atavismo no comportamento humano em torno do Deus temor que Jesus desmistificou, demonstrando que o Pai é todo Amor, e que o Espiritismo confirma através das suas excelentes propostas filosóficas e ético-morais, o qual deve ser examinado com imparcialidade. 
Doutrina fundamentada em fatos, estudada pela razão e lógica, não admite em suas formulações esclarecedoras quaisquer tipos de superstições, que lhe tisnariam a limpidez dos conteúdos relevantes, muito menos ameaças que a imponham pelo temor, como é habitual em outros segmentos religiosos. 
Durante alguns milênios o medo fez parte da divulgação do Bem, impondo vinganças celestes e desgraças a todos aqueles que discrepassem dos seus postulados, castrando a liberdade de pensamento e submetendo ao tacão da ignorância e do primitivismo cultural as mentes mais lúcidas e avançadas… 
O Espiritismo é ciência que investiga e somente considera aquilo que pode ser confirmado em laboratório, que tenha caráter de revelação universal, portanto, sempre livre para a aceitação ou não por aqueles que buscam conhecer-lhe os ensinamentos. Igualmente é filosofia que esclarece e jamais apavora, explicando, através da Lei de Causa e Efeito, quem somos, de onde viemos, para onde vamos, porque sofremos, quais são as razões das penas e das amarguras humanas… De igual maneira, a sua ética-moral é totalmente fundamentada nos ensinamentos de Jesus, conforme Ele os enunciou e os viveu, proporcionando a religiosidade que integra a criatura na ternura do seu Criador, sendo de simples e fácil formulação. 
Jamais se utiliza das tradições míticas greco-romanas, quais das Parcas, sempre tecendo tragédias para os seres humanos, ou de outras quaisquer remanescentes das religiões ortodoxas decadentes, algumas das quais hoje estão reformuladas na apresentação, mantendo, porém, os mesmos conteúdos ameaçadores. 
De maneira sistemática e contínua, vêm-se tornando comuns algumas pseudorrevelações alarmantes, substituindo as figuras mitológicas de Satanás, do Diabo, do Inferno, do Purgatório, por Dragões, Organizações demoníacas, regiões punitivas atemorizantes, em detrimento do amor e da misericórdia de Deus que vigem em toda parte. 
Certamente existem personificações do Mal além das fronteiras físicas, que se comprazem em afligir as criaturas descuidadas, assim como lugares de purificação depois das fronteiras de cinza do corpo somático, todos, no entanto, transitórios, como ensaios para a aprendizagem do Bem e sua fixação nos painéis da mente e do comportamento. 
O Espiritismo ressuscita a esperança e amplia os horizontes do conhecimento exatamente para facultar ao ser humano o entendimento a respeito da vida e de como comportar-se dignamente ante as situações dolorosas. 
As suas revelações objetivam esclarecer as mentes, retirando a névoa da ignorância que ainda permanece impedindo o discernimento de muitas pessoas em torno dos objetivos essenciais da existência carnal. 
Da mesma forma como não se deve enganar os candidatos ao estudo espírita, a respeito das regiões celestes que os aguardam, desbordando em fantasias infantis, não é correto derrapar nas ameaças em torno de fetiches, magias e soluções miraculosas para os problemas humanos, recorrendo-se ao animismo africanista, de diversos povos e às suas superstições. No passado, em pleno período medieval, as crenças em torno dos fenômenos mediúnicos revestiam-se de místicas e de cerimônias cabalísticas, propondo a libertação dos incautos e perversos das situações perniciosas em que transitavam. 
O Espiritismo, iluminando as trevas que permanecem dominando incontáveis mentes, desvela o futuro que a todos aguarda, rico de bênçãos e de oportunidades de crescimento intelecto-moral, oferecendo os instrumentos hábeis para o êxito em todos os cometimentos. 
A sua psicologia é fértil de lições libertadoras dos conflitos que remanescem das existências passadas, de terapêuticas especiais para o enfrentamento com os adversários espirituais que procedem do ontem perturbador, de recursos simples e de fácil aplicação. 
A simples mudança mental pra melhor proporciona ao indivíduo a conquista do equilíbrio perdido, facultando-lhe a adoção de comportamentos saudáveis que se encontram exarados em O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, verdadeiro tratado de eficiente psicoterapia ao alcance de todos que se interessem pela conquista da saúde integral e da alegria de viver. 
Após a façanha de haver matado a morte, o conhecimento do Espiritismo faculta a perfeita integração da criatura com a sociedade, vivendo de maneira harmônica em todo momento, onde quer que se encontre, liberada de receios injustificáveis e sintonizada com as bênçãos que defluem da misericórdia divina. 
A mediunidade, desse modo, a serviço de Jesus, é veículo de luz, de seriedade, dignificando o seu instrumento e enriquecendo de esperança e de felicidade todos aqueles que se lhe acercam. 
Jamais a mediunidade séria estará a serviço dos Espíritos zombeteiros, levianos, críticos, contumazes de tudo e de todos que não anuem com as suas informações vulgares, devendo tornar-se instrumento de conforto moral e de instrução grave, trabalhando a construção de mulheres e de homens sérios que se fascinem com o Espiritismo e tornem as suas existências úteis e enobrecidas. 
Esses Espíritos burlões e pseudossábios devem ser esclarecidos e orientados à mudança de comportamento, depois de demonstrado que não lhes obedecemos, nem lhes aceitamos as sugestões doentias, mentirosas e apavorantes com as histórias infantis sobre as catástrofes que sempre existiram, com as informações sobre o fim do mundo, com as tramas intérminas a que se entregam para seduzir e conduzir os ingênuos que se lhes submetem facilmente… 
O conhecimento real do Espiritismo é o antídoto para essa onda de revelações atemorizantes, que se espalha como um bafio pestilencial, tentando mesclar-se aos paradigmas espíritas que demonstraram desde o seu surgimento a legitimidade de que são portadores, confirmando o Consolador que Jesus prometeu aos seus discípulos e se materializou na incomparável Doutrina. 
Ante informações mediúnicas desastrosas ou sublimes, um método eficaz existe para a avaliação correta em torno da sua legitimidade, que é a universalidade do ensino, conforme estabeleceu o preclaro Codificador. 
Desse modo, utilizando-se da caridade como guia, da oração como instrumento de iluminação e do conhecimento como recurso de libertação, os adeptos sinceros do Espiritismo não se devem deixar influenciar pelo moderno terrorismo de natureza mediúnica, encarregado de amedrontar, quando o objetivo máximo da Doutrina é libertar os seus adeptos, a fim de os tornar felizes.

Vianna de Carvalho 
Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, no dia 7 de dezembro de 2009, durante o XVII Congresso Espírita Nacional, em Calpe, Espanha. Em 09.04.2012. 
Fonte: http://www.divaldofranco.com.br 

Imagem ilustrativa

terça-feira, 23 de junho de 2015

Existem almas gêmeas? Sim e não


Um dos pontos polêmicos que existem nas obras espíritas é a questão das almas gêmeas. Kardec nega terminantemente a sua existência. Léon Denis e Emmanuel falam que as há. Sempre tive uma postura estritamente kardecista de negar também. Mas ultimamente tenho meditado no assunto e cheguei a algumas conclusões um pouco mais matizadas, que não podem se encerrar apenas no sim ou no não.
Explico-me. Não, não pode haver almas gêmeas no sentido de metades, de seres que se complementam. Isso fere um dos princípios básicos da filosofia espírita, que enxerga com muita ênfase a individualidade (não individualismo) do espírito. Aliás, esse e outros aspectos da visão espírita têm um diálogo surpreendente e fecundo com as ideias de Erich Fromm. Ele também aponta como uma necessidade evolutiva da espécie, e de cada ser humano em particular, o processo de individuação. As relações saudáveis e plenas, portanto, seriam para ele, aquelas em que duas pessoas inteiras, se amam, sem complementaridade, nem submissão, nem perda da identidade de nenhuma das duas. Nesse sentido, portanto, e talvez seja esse o que Kardec entende, não há almas gêmeas - duas metades que se procuram na eternidade e que se encontram e não podem estar uma sem a outra. Isso significaria que há uma falta a ser preenchida, uma lacuna no ser, que não pode ser inteiro, sem outro ser. De fato, essa ideia revela um aspecto de romantismo exarcebado e místico e que se distancia da racionalidade (que vem desde a Grécia e perpassa a cultura judaico-cristã - raízes em que o espiritismo se mantém). A razão anda junto com o princípio da identidade. A razão define, individua, afirma a identidade dos seres. Sócrates e Platão, que têm ideias reencarnacionistas e visão de mundo bastante espiritualista, foram os primeiros a definir o conceito do ser, aliás como alma independente do corpo. As teorias panteístas, por exemplo, são bem menos racionais e quebram com a lógica da identidade, lógica que é socrática, platônica e artistotélica. Que é cristã e que é espírita. Quando Fromm segue por essa linha, também se ancora nessa tradição. Aliás, ele revive os clássicos da filosofia. A psicologia ocidental, com todas as suas práticas terapêuticas, está igualmente radicada no princípio da singularidade de cada um.
Então, em que sentido poderíamos entender, se é que há esse sentido, a existência de almas gêmeas? Eu diria que num sentido a posteriori e não a priori. Ou seja, não há almas que foram criadas pela metade e estão à procura de sua outra metade. Mas há almas que seguiram tanto tempo juntas, em milênios de convivência, cumplicidade, amor (mesmo passando por momentos de distanciamento e conflito naturais em seres imperfeitos), que se identificam mais plenamente uma com a outra do que com outros seres amados. Intimidade, construção conjunta e até quedas e desvios e retornos em sintonia, que proporcionam uma sintonia fina, maior e mais profunda do que com outros seres também afins.
E agora outra questão: essas almas "gêmeas" no sentido amplo da palavra, tiveram relacionamentos sexuais, no sentido terreno? Podem ter tido, mas não só. Aliás, uma constante que tenho observado em reuniões mediúnicas, em que se manifesta junto a espíritos renitentes, aquela alma que é capaz de os tocar, e que geralmente foram espíritos, que já passaram por diversas condições de relacionamento nos séculos. Já foram esposos, irmãos, pai, mãe, filho, filha… de modo que o amor parece assumir todas as dimensões possíveis e ao mesmo tempo transcender o amor carnal, porque esse nível de sintonia está além do exercício da sexualidade terrena.
Outra pergunta ainda: casais que vemos no mundo são almas gêmeas? Rarissimamente, acredito. Porque se forem, têm uma sintonia muito grande. Alguém pode ser casado com alguém, com amor e compromisso, com as dificuldades naturais de uma convivência mútua e com felicidade relativa, mas a alma mais afim pode vir na forma de um filho, por exemplo, ou nem estar encarnada. 
Pode ser ainda que nem todos tenham almas gêmeas, mesmo nesse sentido amplo, porque pode ser construção de alguns espíritos, resultado de algumas experiências específicas. O universo é livre e as almas vão evoluindo no amor, através de múltiplas vivências. 
Na sociedade contemporânea, a descartabilidade das relações, a ênfase no prazer carnal e a rara busca de identificações mais profundas de alma para alma, acaba por deixar as pessoas mais solitárias e mais sedentas de um amor verdadeiro. Isso pode muitas vezes obstruir o fluxo do amor num sentido mais profundo, pode impedir que vejamos nossas almas gêmeas (aquelas que mais se identificam essencialmente conosco, porque se estamos vivendo na superfície, estamos longe de nós mesmos também) ou pode também bloquear a comunicação mental e emocional com possíveis almas gêmeas nossas que estejam em outros pontos do universo e que mandam vibratoriamente seu amor por nós.
Quanto mais vivermos com lucidez espiritual, autoconhecimento, em sintonia com nossa essência divina, mais saberemos distinguir (e portanto não querer) relações de superfície, apenas baseadas em paixões e impulsos primários, e mais saberemos encontrar a pérola de nossas almas. E se ela não estiver por aqui, poderemos ter relacionamentos também amorosos, verdadeiros e responsáveis, mas sempre teremos uma nostalgia oculta da falta de alguém.

Dora Incontri 
http://wp.me/p1Bz2Z-8M

sábado, 20 de junho de 2015

Artigo importante, vale refletir.


Uma falsa noção de humildade


Trago aos leitores página preciosa do estudioso Deolindo Amorim (1906 – 1984), que foi jornalista, sociólogo, publicitário e escritor, nascido na Bahia. Pelo oportunismo do texto, bem adequado aos dias que vivemos, onde muitos nos escondemos em diferentes máscaras e diante da crise moral que se abate sobre o país, sempre é bom refletir sobre essas questões. Peço ao leitor atenta leitura, embora a transcrição abaixo seja parcial:

 “(...) Muita gente pensa que ser humilde é não ter personalidade. O próprio Cristo, que foi o Cristo, o bom, o justo por excelência, não abriu mão de Suas ideias, não recuou diante das dificuldades... Se Ele não tivesse personalidade, naturalmente ficaria acomodado à situação e não teria suportado o que suportou em defesa do ideal que O iluminava. No entender de muitas pessoas, o que, aliás, está muito errado, ser humilde é dizer amém a tudo, é ficar bem com todos, ainda que tenha de sacrificar as mais fortes razões da consciência. Não foi isto o que o Cristo ensinou. Nem foi isto o que Ele praticou.
Veja-se bem que o Evangelho reprova o procedimento dos que, calculadamente, ocultam os seus pensamentos, isto é, não dizem o que pensam nem o que sentem, porque preferem agir na sombra! Tanto é certo que o Cristo valorizava a personalidade, que ele mesmo disse, e de modo direto, que a criatura deve ser quente ou fria; ninguém deve ser morno. Que significa isto? Significa ter personalidade, no mais alto sentido humano e espiritual. Ficar morno é ficar indeciso, de caso pensado, é não se definir de propósito, para tirar algum partido próximo ou remoto. Isto, porém, não é procedimento compatível com a ética cristã. Não tenho receio das pessoas que tomam atitudes francas, para um lado ou para outro; mas tenho muito cuidado com os que ficam mornos, pois foi para estes que o Cristo chamou a atenção de Seus seguidores.  
Se o Cristo disse que o nosso falar deve ser sim-sim-não-não, é claro que, com isto, reconheceu que o homem deve ter personalidade. Vejo e ouço, constantemente, citar-se o Evangelho, mas também noto que muita gente ainda não compreendeu o sentido de certas máximas fundamentais do Evangelho. Vou dar um exemplo disto: quando alguém toma atitude, porque tem personalidade, e não está conformado com isto ou aquilo, logo se diz que é um antifraternista, que é um demolidor, etc. Pouco falta para se chamar o companheiro de um herético ou pecador público, simplesmente porque é sincero, é idealista, e diz o que pensa.
É preciso que se compreenda a situação de cada um de nós, em face da responsabilidade própria. Tomar uma atitude contra qualquer coisa venha de onde vier, não quer dizer que se pretenda destruir seja o que for. É agir sinceramente, de acordo com a consciência. Já é tempo de se acabar com a suposição ou com o sofisma de que, para praticar a humildade, é necessário curvar-se a tudo ou abdicar do direito de pensar e falar abertamente. Há, entre nós, uma noção muito falsa de humildade, para encobrir muita coisa ruim.”. 

Coincidência ou não, o texto foi publicado em 1964 e parece-nos precisa ser republicado novamente, face à excessiva valorização de valores transitórios, com desprezo aos valores reais e morais, aqueles que permanecem.

Orson Peter Carrara
orsonpeter92@gmail.com
http://orsonpetercarrara.blogspot.com.br/

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Resignação: uma virtude valiosa


Há virtudes difíceis de serem adquiridas ao longo da vida, e cujo exercício é pouco compreendido entre os homens; a resignação é uma delas. As criaturas levianas nem a veem como algo apreciável. Presas em suas ilusões, consideram a resignação apenas falta de força ou de coragem. Entendem que o homem sempre deve reagir violentamente contra qualquer circunstância que contrarie seus desejos.
A resignação geralmente se refere a experimentar uma situação sem a intenção de mudá-la. Já a aceitação não exige que a mudança seja possível ou mesmo concebível, nem necessita que a situação seja desejada ou aprovada por aqueles que a aceitam. De fato, a resignação é frequentemente aconselhada quando uma situação é tanto ruim quanto imutável, ou quando a mudança só é possível a um grande preço ou risco. Em O Evangelho segundo o Espiritismo lemos que “quando sofremos uma aflição, se procurarmos a sua causa, encontraremos sempre a nossa própria imprudência, a nossa imprevidência, ou alguma ação anterior”. Nesses casos, como se vê, temos de atribuí-la a nós mesmos, pois se a causa de uma infelicidade não depende absolutamente de nenhuma das nossas ações, trata-se de uma prova para a existência atual, ou de uma expiação de falta cometida em existência anterior.
Vemos em geral apenas o mal presente, e não as consequências vindouras e favoráveis que ele possa ter. O bem é frequentemente a consequência de um mal passageiro, como a cura de um doente resulta dos meios dolorosos que se empregam para obtê-la. Independentemente dos casos, devemos submeter-nos à vontade de Deus, suportar corajosamente as atribuições da vida, se quisermos que elas nos sejam creditadas em nossa jornada espiritual. Muitas vezes, nossos sonhos mais pretendidos não se concretizam, ou, então, nossa tranquilidade, tão duramente conquistada, é atingida por um infortúnio. Há dificuldades ou contrariedades que podemos vencer, mas algumas vezes a vida responde a nossos apelos com sombra e dor e nessas circunstâncias alguns encontram em seu íntimo forças para se resignarem.
Jesus, em sua curta passagem pela Terra, alimentou ainda mais as esperanças dos homens ao dizer: “Bem-aventurados os aflitos, porque eles serão consolados”, indicando aí o prelúdio da cura aos que sofrem com resignação. Essas palavras, segundo o Evangelho, devem ser entendidas de uma forma simples, em que nós, homens, devemos considerar-nos felizes por sofrer, porque nossas dores neste mundo decorrem de dívidas de nossas faltas passadas, e essas dores, suportadas pacientemente na Terra, nos poupam séculos de sofrimento na vida futura. Devemos, portanto, estar felizes por Deus reduzir nossa dívida, permitindo-nos quitá-la no presente, assegurando-nos a tranquilidade para o futuro.
Em face de situações constrangedoras e dolorosas, a resignação é uma atitude que apenas os bravos conseguem adotar. O resignado não é um covarde, mas alguém que compreende a finalidade da existência terrena. O homem nasce na Terra para evoluir, para vencer a si mesmo e acumular virtudes, pois a vida é uma escola, na qual passamos da ignorância e da barbárie à angelitude, e justamente por isso as dificuldades se apresentam em seu caminho.
O progresso, diz Santo Agostinho, é lei da natureza, em que todos os seres da Criação, animados e inanimados, foram submetidos pela bondade de Deus, que quer que tudo se engrandeça e prospere. A própria destruição, que aos homens parece o termo final de todas as coisas, é apenas um meio de se chegar, pela transformação, a um estado mais perfeito, visto que tudo morre para renascer e nada sofre o aniquilamento. Já nascemos inúmeras vezes e renascemos outras tantas. Somente na vida futura podem efetivar-se as compensações que Jesus promete aos aflitos da Terra. Se a vida nos reclama serenidade em face da dor, concordemos. A rebeldia de nada nos adiantará, pois a criatura rebelde perante as Leis Divinas apenas torna seu aprendizado mais lento e doloroso. Resignar-se não significa desistir da luta, porém implica reconhecer que a luta interiorizou-se. A resignação é uma conquista do Espírito que vence suas paixões e atinge a maturidade, mantendo a alegria e o otimismo, mesmo em condições adversas.
Joanna de Ângelis, no livro “Convites da Vida”, diz que “se estiveres sob o jugo de dores e padecimentos, ingratidões e perseguições injustos, serão injustos somente na aparência, pois que procedem do teu ontem, em regime de cobrança, para melhor estabilidade do teu amanhã. Submete-te, portanto, paciente, resignadamente, às situações atuais e, insistindo nos bons propósitos, construirás o porvir de bênçãos que agora ainda não podes fruir”.
Devemos, pois, ser conscientes de nosso papel de aprendizes e dedicar-nos a fazer a lição do momento. Vivemos em um mundo de provas e expiações. Nele a dor reina soberana, em virtude de o mal ainda sobrepujar o bem. Embora conscientes dessa inegável condição, é nosso dever lutar contra a adversidade, pois sofrer sem reagir aos males da vida seria uma covardia. Léon Denis diz, no livro “Depois da Morte”, que a adversidade é uma grande escola, um campo fértil em transformações. A ignorância das leis universais é que nos faz ter aversão aos nossos males. Se compreendêssemos quanto esses males são necessários ao nosso adiantamento, eles não mais nos pareceriam um fardo.
Em nossa cegueira, estamos quase sempre prontos a amaldiçoar as nossas vidas. Mas, quando formos capazes de discernir o verdadeiro motivo de nossas existências, compreenderemos que todas elas são preciosas. A dor é capaz de abrandar o nosso coração, avivando os fogos da nossa alma. É o cinzel que lhe dá proporções harmônicas, que lhe apura os contornos e a faz resplandecer em sua perfeita beleza. Quem se resigna enobrece lentamente seu íntimo, ao desenvolver novos propósitos de vida. 

Marcel Bataglia
Balneário Camboriú, SC (Brasil)

Imagem ilustrativa