terça-feira, 9 de setembro de 2014

Respeito à Pátria, compromisso inadiável!


A vida permitiu-nos renascer no Brasil, a querida Pátria que nos acolhe. A história do país, na colonização, nos embates para a construção da democracia e mesmo nos gigantescos desafios da atualidade – onde se incluem a violência e o tráfico, o contraste entre os interesses de variadas ordens e a corrupção, entre outros itens dispensáveis de serem citados –, também apresenta os benefícios de um povo aberto, feliz, descontraído, ardente na fé e na disposição. 
É nosso querido Brasil, gigantesco em proporções geográficas e na diversidade que se apresenta em todos os aspectos! Bendita pátria!       
Por outro lado, o país acolheu a Doutrina Espírita como nenhum o fez. Das sementes germinadas em solo francês, foi aqui que a grande árvore do conhecimento se fez gigante como o próprio país continental. E nós temos a felicidade de conhecer essa Doutrina maravilhosa que inspira ações de caridade – em toda a extensão da palavra –, convivência fraterna e amiga por toda parte. Apesar das dificuldades e limitações humanas que são nossas, individuais e coletivas, ele, o Espiritismo, espalhou e espalha seus frutos pelas mentes e corações que o buscam ou são beneficiados por sua imensa luz. 
Estamos no mesmo país que recebeu o cognome de Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, justa e coerente adjetivação para um povo ameno, solidário, apesar das lutas próprias de nossa condição humana. É aqui que as variadas expressões religiosas se manifestam para conduzir mentes e corações; é também nessa terra querida que nasceram ou renasceram almas que conhecemos sob os abençoados nomes de Irmã Dulce, Zilda Arns, Chico Xavier, Divaldo Franco, Dr. March, Dr. Bezerra de Menezes, entre tantos outros ilustres filhos que lhe dignificam o nome, sendo impossível citar todos e mesmo especificá-los por área, tamanha a variedade e quantidade de benfeitores que aqui vieram e ainda aqui vivem. 
Setembro lembramos a Pátria, desde os tempos escolares. Setembro também normalmente estamos às vésperas das eleições, como ocorre agora em 2014. Isso lembra responsabilidade, comprometimento, ética. Afinal, temos um compromisso com o país, com a coletividade brasileira. Qualquer cidadão está comprometido com a segurança, com os valores do país, com a obrigação moral da retidão e da gratidão, que se estendem por ações em favor do bem comum. É o dever! Não apenas um dever cívico, mas o dever moral para conosco mesmo e para com o próximo, como indica o Espírito Lázaro em O Evangelho Segundo o Espiritismo. Aliás, lembrando a Codificação Espírita, há que se ater às Leis Divinas, didaticamente apresentadas pelo Codificador em O Livro dos Espíritos. Leis que baseiam-se no amor, diga-se de passagem, mas igualmente são justas e misericordiosas. 
Por tudo isso, a reflexão sobre nosso papel de brasileiros perante a Pátria Brasileira inclui-se igualmente no dever, ainda que apenas por gratidão pelo país que nos acolhe, garantindo-nos a paz desse foco irradiador de trabalho e fé que é o Brasil. Tamanho compromisso dispensa corrupção, egoísmo e tolas vaidades. Pede-nos, isso sim, trabalho e dignidade, exatamente pelo alto compromisso que todos temos com a vida e seu significado. O que significa, em termos de eleições para outubro próximo, o compromisso com a decência e a escolha consciente sem outros interesses que não os da coletividade. 
Repare o leitor atento que, quando ouvimos o Hino Nacional, a emoção nos envolve completamente. É o sentimento de compromisso com a missão da Pátria que integramos. O renascimento no país não é obra do acaso. Indica comprometimento e programação sabiamente elaborada. Saibamos respeitar e cumprir o que antes prometemos. 
O Brasil tem grande papel a exercer junto à Humanidade. Filhos dignos, espíritos preparados e nobres estão sempre presentes como autênticos faróis a conduzir a coletividade. Sejamos daqueles que honram nossa condição humana e brasileira! Exemplos não faltam.
Por gratidão, ao menos, ao querido e grandioso Brasil! Lembremo-nos: o planeta construído por Jesus teve na mente e planejamento do Mestre da Humanidade a inclusão desse país incomparável, onde germinam as doces brisas do Evangelho. 

Orson Peter Carrara

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

A primeira pedra


Emblemática no evangelho de Jesus a passagem do apedrejamento da mulher adúltera, situação na qual o Cristo diz que “quem não tiver pecados, que atire a primeira pedra” (João, Capítulo 8). Tal afirmativa, que calou os populares que se arvoravam de algozes pela dilapidação, ainda ecoa, pela sua lógica, aplacando os nossos ódios e os nossos instintos mais violentos, diante das situações presenciadas no cotidiano. 
Jesus, que em outras situações defendeu a justiça, no “dai a César o que é de César” e no “a cada um segundo as suas obras”, não menos famosos que o enunciado sobre a primeira pedra, diante daquela mulher condenada pela legislação vigente, traria agora uma mensagem de leniência e de impunidade, em uma apologia ao crime? 
Uma resposta afirmativa seria uma visão superficial e contraditória da situação em tela. Ao nosso ver, Jesus condena sim o julgamento precipitado, apaixonado e desmedido, que não sopesa o contexto e a subjetividade de cada situação, chamando a reflexão pelo “quem não tiver pecados”, inibindo uma pseudo justiça feita com as próprias mãos, mas que desconsidera princípios basilares de proporcionalidade, contraditório, razoabilidade e outros afetos ao direito penal, que muito evoluiu desde a época do Cristo e que compõe o arcabouço jurídico de qualquer Estado moderno. 
Mais gravosa que a pena de morte, a dita justiça com as próprias mãos, estampada nos linchamentos, presentes em nossa sociedade e acentuados mais recentemente, é uma explosão de ódio, derivada de uma gama de injustiças menores percebidas e que se materializa em uma injustiça ainda maior, na condenação a uma morte cruel e desumana, que independente de ser um inocente ou um motivo comezinho, traduz-se na barbárie que aplaca vinganças e produz mais dor onde esta já campeava. 
A chamada a reflexão de Jesus nos convida a assumir o lugar da vítima e a refletir em qual é a melhor maneira de atuarmos frente a esta situação, o que necessitaríamos se fôssemos nós mesmos ali no banco dos réus da rua, dado que as pelas falhas cometidas, no espectro das reencarnações, ser réu é apenas uma questão temporal. 
Ataques de ódio com a promoção de linchamentos e a apologia a práticas dessa natureza, ao meu ver, afrontam diametralmente a conduta espírita na defesa da vida, argumentação ilustrada por autores fundamentais da doutrina, como na pergunta 761 de “O livro dos espíritos”, que assevera: “Há outros meios de ele se preservar do perigo, que não matando. Demais, é preciso abrir e não fechar ao criminoso a porta do arrependimento. ” 
Ou ainda na pena de Joana de Angelis no seu “Após a Tempestade”, quando diz: “A tarefa que compete às leis é a de eliminar o crime, as causas que o fomentam, não o equivocado criminoso. A morte do delinquente não devolve a vida da vítima. Ao invés da preocupação de matar, encontrar recursos para estimular a vida. Educar, reeducar, são impositivos inadiáveis; matar, não. Tenhamos tento! Não há, no Evangelho, um só versículo que apoie a pena de morte. ” 
A pena de Humberto de Campos, na psicografia de Chico Xavier, no seu “Boa nova”, não se furta dessa antiga questão, quando se refere a mulher adúltera: “ – Ninguém pode contestar que ela tenha pecado; quem estará irrepreensível na face da Terra? Há sacerdotes da lei, magistrados e filósofos, que prostituíram suas almas por mais baixo preço; contudo, ainda não lhes vi os acusadores. A hipocrisia costuma campear impune, enquanto se atiram pedras ao sofrimento. João, o mundo está cheio de túmulos caiados. ” 
Como se vê, a problemática do crime, da violência urbana e da intolerância com isso tudo é antiga e complexa, demandando soluções de igual natureza, dado que a soma de linchamentos ocorridos até hoje não parece ter surtido efeito na redução de índices de violência nas comunidades que dele fizeram uso. 
A visão do dito justiçamento é uma percepção segmentada do problema, descompensada e que tomada pelo calor dos acontecimentos, ignora as medidas sociais necessárias, para além de saúde e educação, mas também nas políticas de segurança de qualidade que coíbam e apurem os crimes, remetendo o réu ao Juízo, que tem grande importância nesse processo, no contexto do chamado Estado democrático de Direito. 
O ódio é uma força de características irracionais, de forma parcial. Ou seja, ela se volta para uma causa, ainda que a sua percepção seja nebulosa, e a ela associa a necessidade de descarregar a sua energia represada, muitas vezes fomentada pela indignação, pela dor, pelas injustiças cotidianas e ainda, por outras vozes, no ambiente das chamadas redes sociais. 
O cidadão comum, nesses ambientes de exaltação, como uma greve, um jogo de futebol, se vê tomado desses ímpetos marcantes e por vezes, se vê envolvido em processos de justiçamento, esquecendo aquela voz que lembra a ele a sua condição de espírito imortal. 
Casos emblemáticos como a Escola Base (SP) e o linchamento da jovem confundida com uma fotografia na internet ocorrida em 2014 no Guarujá (SP) se agregam a outros, ocultos em outras tipologias penais, atingindo culpados e inocentes, como formas bárbaras de promover uma vingança contra a nossa própria imperfeição como seres humanas batizada de justiçamento. 
Como espíritas e cristãos, lutemos pela justiça, defendamos a vida, com uma visão ampla e racional dessa questão, não se deixando seduzir pelo canto das soluções fáceis em arranjos complexos, na defesa de atos que servem apenas para aplacar ódios momentâneos, gerando, em termos práticos, mais violência e sofrimento, para vítimas e algozes. 
A exemplificação do bem, a postura cristã, não é privilégio dos mártires das letras evangélicas. A cada dia, cada um pode e deve, no seu campo de luta, exemplificar o que o Cristo espera de nós, em um desafio pessoal, como fez em maio de 2014 no Rio de Janeiro a jovem estudante de arquitetura Mikhaila Copello, que se pôs à frente de linchadores na defesa de um assaltante que já fora imobilizado, se valendo, como em uma parábola moderna, de palavras, do seu corpo e da sua coragem no testemunho de sua forma de ver a vida, impedindo que aqueles espíritos algozes complicassem a sua encarnação, convidando-os a reflexão da “primeira pedra”. 
Ainda há esperança! Nós, espíritos encarnados, podemos fazer melhor do que isso! A caminhada do bem é dolorosa, e apesar do crime, que a todos causa indignação, temos o dever de fazer ecoar as palavras do Cristo, que nos trouxeram a reflexão quando empunhávamos pedras, passados mais de 2000 anos, nos indicando na ocasião em que local da turba Jesus se posicionou, antes e depois do momento da dilapidação.

Marcus Vinicius de Azevedo Braga
Residindo atualmente na cidade do Rio de Janeiro, espírita desde 1990, atua no movimento espírita na evangelização infantil, sendo também expositor. Vinculado a Casa Espírita Amazonas Hércules (www.ceah.org.br). É colaborador assíduo do jornal Correio Espírita (RJ) e da revista eletrônica O Consolador (Paraná). É autor do livro Alegria de Servir (2001), publicado pela Federação Espírita Brasileira (FEB) e do Livro "Você sabe quem viu Jesus nascer" (2013), editado pela Editora Virtual O Consolador.


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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Um Pai de Família


Nicolas Cage é o ator principal do filme Um pai de família, lançado em dezembro de 2000 nos principais cinemas do país. O filme mostra a experiência de um bem sucedido executivo de grande banco americano. Com todo o poder nas mãos, podendo adquirir tudo que desejasse e ao mesmo tempo contando com bom número de servidores e subordinados, controlava o grande Banco com mãos de ferro. Conhecido pela grande inteligência e muita habilidade nas questões econômicas, dedicava sua vida em proporcionar lucros crescentes à empresa, que o valorizava com altos salários e invejadas mordomias. Na Noite de Natal, viu-se, entretanto, sozinho e talvez um tanto melancólico recordava-se da antiga namorada deixada há 13 anos, quando resolveu seguir a bem sucedida carreira executiva. 
A sequência do filme deixa entender que o telefonema da ex-namorada, durante o dia no escritório, fê-lo buscar recordações, embora tenha recusado atender o telefone. E nesse estado de espírito, dormiu. Dormiu e sonhou que acordava em outra vida, agora casado com aquela que fora sua namorada e pai de dois filhos. Assustado com a rotina de uma vida familiar, tentou voltar ao Banco onde não foi reconhecido. Desesperado, teve que se contentar com as dificuldades da vida conjugal, de pai de família... Embora mantendo a memória de ser o famoso executivo, não conseguia retomar a própria realidade. 
O filme desenrola-se quase por inteiro no cotidiano de uma família de classe média, culminando com o despertar de nosso personagem em sua vida real de destacado diretor do famoso Banco. O despertar, entretanto, provocou o cancelamento de inadiável reunião marcada para aquela manhã e a busca da antiga namorada, a quem relatou todo o sonho - inclusive citando nome e idade dos filhos, seus sonhos e detalhes da vida em comum. OThe end deixa que o público tire suas próprias conclusões, sugerindo um reatar de namoro para transformar em realidade o sonho vivido com tanta intensidade. E há uma frase no filme que é a marca da fita cinematográfica ora comentada: Não importa nosso endereço, o importante é que estejamos juntos. A frase, muito além do aspecto romântico entre casais, indica a importância da família e da convivência entre seres afins, normalmente reunidos no contexto familiar visando o progresso, como bem definem as Leis Divinas. Fica a sugestão ao leitor para apreciação do bem elaborado trabalho. 
Podemos fazer um estudo dos tres parágrafos acima à luz da Doutrina Espírita. Podemos assistir o filme e enxergá-lo sob a ótica espírita. Vários itens podem ser enquadrados. Para efeito didático do artigo, podemos analisar a questão dos laços de família e da missão da paternidade (respectivamente questões 773 a 775 e 582 de O Livro dos Espíritos, que sugerimos para consulta do leitor). Sugerimos porque desejamos analisar o tema com mais abrangência sob outro aspecto: a dos sonhos. Embora se trate de um filme, com suas fantasias, podemos classificar o sonho de que forma? 
No mesmo O Livro dos Espíritos, as questões 400 a 421 tratam do assunto, de onde trazemos as informações seguintes dadas pelos espíritos: O Espírito jamais fica inativo durante o sono do corpo; podemos avaliar a liberdade do espírito durante o sono pelos sonhos; dispondo de mais faculdades que no estado de vigília, durante o sono - enquanto o corpo repousa - o espírito tem a lembrança do passado e às vezes a previsão do futuro; o espírito vê em sonho aquilo que deseja, porque vai procurá-lo; pessoas que se conhecem ou não podem visitar-se durante o sono do corpo, se visitarem e conversarem. 
Já na Revista Espírita (julho de 1865 - vol. 7 - edição Edicel), com o título Teoria dos Sonhos, Allan Kardec desenvolve considerações importantes sobre a questão. Destaca uma classificação sobre os sonhos e apresenta o princípio básico dos sonhos. Usando palavras do próprio Codificador, referindo-se ao Espiritismo: Demonstra que o sonho, o sonambulismo, o êxtase, a dupla vista, o pressentimento, a intuição do futuro, a penetração do pensamento não passam de variantes e graus de um mesmo princípio: a emancipação da alma, mais ou menos desprendida da matéria. 
Esta incessante atividade do Espírito durante o sono do corpo indica que muitas providências, decisões de interesse da alma são tomadas durante o desprendimento pelo sono. Apenas o corpo dorme, pois na vigília ou durante o sono o comandante do corpo é o espírito, senhor absoluto de decisões que o livre arbítrio lhe confere. Decisões que vão interferir na felicidade ou infelicidade, saúde ou enfermidade que o corpo vai experimentar, por constituir-se ele em instrumento dirigido pelo Espírito nele encarnado, como ensina a notável Doutrina Espírita. Na verdade, vivemos uma única realidade e quando na vigília estamos parcialmente bloqueados pelo corpo físico. Quando desprendidos pelo sono, desfrutamos da liberdade plena, cujas imagens e experiências o sonho registra, muitas vezes é claro de forma confusa pois o corpo não participou e o registro pelo cérebro carnal fica confuso. Entre os sonhos, e aqui usando palavras do Codificador ainda na Revista Espírita acima citada, uns há que que tem um caráter de tal modo positivo que, racionalmente, não poderiam ser atribuídos a simples jogo de imaginação; tais são aqueles nos quais, ao despertar, adquire-se a prova da realidade do que se viu, e em que absolutamente não se pensava. 
Não se confunda aqui os sonhos provenientes de pesadelos por alimentação inadequada ou provocados por imaginação excitada e até aqueles oriundos de exageradas preocupações materiais. Vamos enquadrar os casos de origem espiritual, de ativa participação do espírito.
No caso do filme citado, excluindo-se os exageros da imaginação e da fantasia, poderá notar o leitor que tiver oportunidade de assistir, que tudo foi um sonho, mas a decisão final coube ao personagem da trama vivida, para mudar ou transformar em realidade aquilo que verdadeiramente buscava. E abrimos horizontes para outra questão básica: o livre-arbítrio, que para não alongar o artigo deixo ao leitor pesquisar nas questões 843 a 850 de O Livro dos Espíritos. Porém, a mensagem do filme fica: não importa o endereço, importante é que estejamos sempre juntos. 

Orson Peter Carrara 

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

De Saulo a Paulo


E eis que no meio da estrada repentina luz se faz, mais luminosa que o sol, quase ofuscando o rapaz. 
Tremendo de comoção, Saulo tomba do camelo. 
No céu se rasga um caminho e desce alguém para vê-lo. 
Voz suave, olhar profundo, rosto belíssimo, santo, pergunta esse Alguém a Saulo:  

— Por que me persegues tanto?
Responde Saulo espantado: 
— Mas quem sois vós, meu Senhor? 
— Sou Jesus, a quem persegues, com tanta raiva e rancor!

Há exatos 40 anos, quando tinha apenas 11 anos de idade, li pela primeira vez Paulo e Estêvão, romance de Emmanuel, psicografado por Chico Xavier. Ou melhor, minha mãe leu em voz alta para mim, porque descobriu que eu estava lendo escondido no banheiro. Ela achava que o livro era muito pesado para minha idade e não queria que eu lesse. Mas acabou ela mesma fazendo a leitura, não sei se censurando alguma coisa. Morávamos então em Berlim. E no inverno sombrio daquela cidade, na época ainda com o muro, que tanto nos deprimia, fiquei apaixonada pela figura de Paulo, pela história de sua vida. 
Depois dessa primeira vez, li mais que 50 vezes esse livro. E isso não é hipérbole. Parei de contar quando cheguei à 50ª leitura. E passei a estudar vorazmente todas as versões da vida do apóstolo. A que está nos Atos, suas Epístolas, li narrativas católicas, protestantes, ateias e a que mais me encantou foi a escrita na primeira metade do século XX, por um judeu, Sholem Ash, intitulada O Apóstolo. Nos últimos 15 anos, com o intenso envolvimento com a Pedagogia Espírita e questões educacionais, não me dediquei mais a esse tema. 
Agora estou lançando o livro de Saulo a Paulo, a história recontada inteiramente em versos para crianças e que faz parte da série Grandes Pessoas. Na verdade, muito antes de imaginar lançar essa série, quando ainda nem tinha fundado a Editora Comenius e minha mãe ainda estava encarnada, escrevi esse texto, constituído de 70 estrofes. Talvez uns 18 ou 19 anos atrás. 
Por conta desse lançamento, reli de cabo a rabo Paulo e Estêvão e decidi fazer esse balanço público da minha relação com Paulo de Tarso. Essa releitura me fez muito bem, porque me levou às motivações profundas que enraizaram os ideais dessa minha presente vida e aos sentimentos mais viscerais que ainda nutrem a minha personalidade. 
Primeiro, devo dizer, que o romance de Emmanuel resistiu ao tempo, em sua estrutura literária, belissimamente escrito, em sua mensagem que revitaliza o espírito e acende ideais. Apesar, é claro, de hoje minha visão a respeito desse livro ser muito diversa de anos atrás. Dediquei-me ao estudo dos primeiros 300 anos de Cristianismo, com autores como Bart Ehrman, Richard Rubenstein ou Paul Johnson, afora todas as novidades de manuscritos descobertos no século XX, que lançaram novas luzes sobre os Evangelhos. Com esse conhecimento, fica claro que o romance de Emmanuel é um romance. Tem uma validade histórica relativa. Por exemplo, sabemos hoje que os conflitos entre Paulo e Tiago não foram tão amistosos como parecem ter sido nos relatos de Emmanuel, com uma reconciliação final tão fraterna e cristã. Mais: Paulo certamente conservou traços de autoritarismo de sua personalidade depois de sua conversão. E não se tornou aquele modelo de humildade que Emmanuel retrata. Outra coisa que me chamou atenção nessa leitura de agora: na narrativa de Emmanuel, a leitura e a cópia de um manuscrito de Levi ocupam lugar central da história. Todos os apóstolos liam, copiavam etc. Hoje se sabe que eram todos analfabetos. Com exceção do próprio Paulo, que era doutor da Lei e talvez de Mateus (ou Levi), que era cobrador de impostos. A escrita e a leitura não ocupavam essa centralidade entre os primeiros cristãos, mas sim o ensino oral, pois a maioria da população não sabia nem ler nem escrever. 
Tudo isso apenas para dizer que os romances mediúnicos (os bons romances que hoje nem existem mais) não têm a intenção de nos dar informações históricas, porque cabe a nós, encarnados, pesquisar a História. A intenção dos Espíritos é de nos edificar com uma mensagem estimulante, uma inspiração positiva – como aliás, fez comigo. 
Mas voltemos à figura de Paulo. Passado esse arrebatamento juvenil pelo apóstolo, tive que me defrontar com as numerosas críticas que existem em torno de sua doutrina e atuação. Muitos historiadores do cristianismo, entre eles Charles Guignebert (que li por conselho de Herculano Pires) ou Paul Johnson, consideram que Paulo é o verdadeiro fundador da Igreja, tendo lançado a base dos dogmas que ainda empanam a pureza da mensagem de Jesus. Exemplo disso é a ideia do pecado original, que não aparece nas palavras de Cristo, sempre otimista em relação ao ser humano: “vós sois deuses”, “sede perfeitos como vosso Pai celestial é perfeito”. 
Outra acusação séria e verdadeira, feita a Paulo, é que se encontram em suas epístolas, traços do machismo que promoveu a exclusão da mulher como participante ativa nas práticas cristãs. E ainda há seu conservadorismo político, manifesto por exemplo na Epístola aos Romanos, que pode ter fundamentado a teoria do “direito divino” na Idade Média, ideia segundo a qual temos de respeitar a autoridade constituída, porque ela foi posta por Deus. 
É verdade que Paulo, como ex-doutor da Lei judaica, como filho de seu tempo, numa cultura greco-romana e judaica (as três extremamente patriarcais), inserido num contexto pessoal de culpa (tinha matado Estêvão, promovido vasta e sangrenta perseguição aos cristãos), impregnado dos conceitos bíblicos do pecado, não poderia se furtar a carregar tudo isso para sua interpretação da mensagem de Jesus! Não é possível julgarmos um homem de dois mil anos atrás, com nossos conceitos de hoje. Ele compreendeu e traduziu Jesus, como um ex-doutor da Lei daquele contexto histórico e com aquela história pessoal poderia compreender! 
Mas o que pode ainda nos inspirar Paulo, sua luta, sua vida?…Muitas coisas. Tanto que ao reler sua história agora, aos 51 anos de idade, consegui sentir em mim as mesmas emoções motivadoras, que me tocaram aos 11 anos de idade. 
Embora carregando para a sua tarefa de difusão do cristianismo nascente, as marcas de sua herança cultural, só Paulo podia fazer o que fez: arrancar a mensagem de Jesus do exclusivismo judaico e espalhá-la aos quatro cantos do Império Romano. Não foi à toa que Jesus o chamou para isso. O que me fascina em Paulo, ainda hoje, é seu espírito desbravador e universalista, fiel até o sacrifício e a morte a uma incumbência recebida. É daquelas almas que quando possuídas de um ideal, quando encarregadas de uma missão, não medem esforços, não se detém diante de nenhum obstáculo, percorrem estradas, atravessam mares, se defrontam com inimigos e vão até o fim. Devoção sem limites, ímpeto sem descanso, coragem sem esmorecimento. 
Exatamente dessas virtudes precisava o homem que fosse desentranhar a mensagem de Jesus do seu horizonte apenas judaico, para lançá-la ao mundo e semeá-la na história e fazer com que ainda hoje a tivéssemos em mãos. E isso, apesar de suas licenças históricas, o romance de Emmanuel retrata muito bem. 
E exatamente dessas virtudes que precisa qualquer pessoa ainda hoje que queira levar adiante uma causa nobre, que queira participar do bom combate pela mensagem do Reino, qualquer pessoa que tenha recebido alguma incumbência existencial que implique em mexer com mentalidades cristalizadas, com corações adormecidos, para acordar consciências! 
Mudanças significativas, desbravamento de novas ideias, semeaduras de paradigmas transformadores não se fazem com pessoas mornas, pacatas e sossegadas no seu canto. É preciso garra e paixão, ímpeto e capacidade de sacrifício para empreendimentos assim. Isso não significa santidade e perfeição, como Paulo não era santo, nem perfeito. Apenas a pessoa certa para a tarefa em vista. 
A personalidade de Paulo também me atrai pela sua sinceridade absoluta, com seu ódio à hipocrisia, pela sua incapacidade de fazer compromissos com princípios e ideias (o que para muitos pode parecer agressividade e inflexibilidade). 
É fácil entender por que Paulo tanto me encantou. Minha tarefa existencial – que não é maior ou melhor do que outras tarefas – também requer essa coragem, esse espírito desbravador e essa sinceridade de princípios. 
Às vezes, isso não agrada a muitos. Mas, espero estar cumprindo com a fidelidade paulinamente teimosa a incumbência recebida. A releitura de Paulo me realimentou, passados 40 anos, os mesmos sentimentos apaixonados de agir pela mensagem do Reino, nesse mundo que ainda é um grande Império Romano. E não posso deixar de mencionar que o meu grande inspirador na infância e adolescência, J. Herculano Pires, assinou durante décadas uma coluna no Diário de São Paulo, com o pseudônimo de Irmão Saulo. Coincidência de inspirações? 
Para finalizar, uma consideração a respeito das Epístolas de Paulo, que hoje são consideradas pelos pesquisadores das escrituras como efetivamente os documentos mais antigos que temos do cristianismo primitivo (todos os evangelhos foram escritos depois das epístolas): apesar das heranças judaicas, apesar de algumas ressonâncias da cultura da época, esses textos de Paulo contém pérolas espirituais muito valiosas. Por exemplo, apesar da ideia de pecado original, há frases profundamente otimistas em relação ao ser humano, como “somos herdeiros de Deus e co-herdeiros do Cristo”. E apesar de muitas vezes se acusar Paulo de ser um espírito duro e autoritário, ele escreveu umas das mais belas páginas de todos os tempos sobre o amor:

Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria. E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria. O amor é paciente, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. (Cor. I, 13) 

Dora Incontri 

sábado, 23 de agosto de 2014

O susto da ajuda espiritual


Popularmente, se diz que “Deus escreve certo por linhas tortas”, e essa realidade se apresenta com certa constância em nossa vida. Presenciei uma cena especial, estava sentado observando o quintal, quando percebi um pequeno pássaro, um filhote que não voava e certamente seria presa fácil aos cães e possíveis felinos que apareceriam pelo canto escandaloso do filhote. Tocado por um senso instintivo de auxílio ao mais fraco, resolvi ajudar o pequeno pássaro a sair da provável zona de risco, levando-o a um lugar seguro. No processo de execução do meu plano de auxílio, levantei e segui em direção ao filhote, que começou a correr em voos mínimos que mal saiam do chão e gritava crendo que eu o mataria. No momento parei, tocado pelo desespero do filhote, que deveria me ver como um gigante avassalador, mas segui na intenção de salvá-lo. Os gritos dele aumentavam significativamente e finalmente entre minhas mãos, acreditei que ele estouraria pelos gritos que emitia sem sessar, com as pequenas asas desarrumadas pelo constante debatimento. Conduzi o filhote vencido entre as mãos, imaginando que ele estaria esperando ser devorado, até que o coloquei lentamente num canto protegido por folhagens e me afastei. Sai pensando o que ficou na cabeça do pássaro (se é que ele pensa), não deve ter entendido nada, primeiro eu saio atrás dele até pegá-lo e depois solto, creio que ele nunca saberá que a angustia que ele sentiu era justamente a ajuda. Conosco acontece o mesmo, muitas vezes passamos por angustias injustificáveis e por mais que tentemos não entendemos o porque de tantas dificuldades e mal sabemos que muitas vezes, trata-se justamente da ajuda que precisamos. Nem sempre para sanar nossas necessidades imediatistas, mas sempre atendendo as nossas necessidades como espíritos imortais. Na questão 501 de “O Livro dos Espíritos” encontramos a seguinte pergunta: 

- Por que é oculta a ação dos Espíritos sobre a nossa existência e por que, quando nos protegem, não o fazem de modo ostensivo? 

E a resposta é merecedora de profunda reflexão: “Se vos fosse dado contar sempre com a ação deles, não obraríeis por vós mesmos e o vosso Espírito não progrediria. Para que este possa adiantar-se, precisa de experiência, adquirindo-a frequentemente à sua custa. É necessário que exercite suas forças, sem o que, seria como a criança a quem não consentem que ande sozinha. A ação dos Espíritos que vos querem bem é sempre regulada de maneira que não vos tolha o livre-arbítrio, porquanto, se não tivésseis responsabilidade, não avançaríeis na senda que vos há de conduzir a Deus.

Roosevelt Andophato Tiago
Barra Bonita, SP (Brasil) 

Imagem ilustrativa

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

A hipótese insuperável de Kardec


Terminei esta semana a leitura do livro “Kardec, a biografia”, de Marcel Souto Maior. Gostei do Livro, com os senões (e vantagens) de uma obra escrita por alguém que está de fora das fileiras espíritas, pelo menos no discurso, mas que soube retratar de forma leve os eventos históricos que conduziram a chamada codificação da doutrina espírita e que hoje nos alenta e nos inspira, nas lutas cotidianas. 
Bem redigido, de forma clara e didática, antecipando o roteiro da película a ser produzida, o livro mostra um Kardec homem, com dificuldades, inserido em um contexto político e filosófico, para assim ser o baluarte do espiritualismo moderno, que entre mesas girantes e cadernos manuscritos, produziu um manancial de conhecimento a influenciar o mundo até hoje, passados mais de 150 anos. 
A leitura do livro mostrou-me um homem de ciência, sagaz e bem-intencionado que, diante de fenômenos populares envolvendo mesas girantes, busca identificar a sua gênese e com o apoio das informações fornecidas pelos próprios causadores dos fenômenos, os Espíritos, elabora assim uma tese que deu conta daquela casuística, abrangendo um sistema filosófico amplo, sobre a natureza e o destino do ser humano no universo. 
 Essa tese, fundamentada na imortalidade da alma, na comunicabilidade dos Espíritos e nas múltiplas existências, inédita na sua integração, jaz insuperável, influenciando um sem-número de produções culturais, que trazem nesse paradigma seu espelho, no qual, apesar da baixa difusão percentual do Espiritismo como movimento religioso, esta doutrina tem, por meio de seus princípios basilares, conquistado seu espaço nesses mais de 150 anos, ao sol das ilações sobre a vida futura. 
A imortalidade da alma, hipótese comum à maioria das religiões, tem mais recentemente ganhado corpo nas pesquisas sobre EQM-Estado de Quase Morte do Dr. Raymond Moody Júnior e Sam Parnia, na análise de pessoas que em estado de coma retornam à vida e narram situações similares. A despeito das hipóteses formuladas sobre a ação do subconsciente, os estudos continuam, amparados na hipótese básica. 
As múltiplas existências tiveram também seus baluartes, nas pesquisas e produções de Hemendras Banerjee, Brian Weiss, Albert de Rochas e Ian Stevenson, com destaque para os estudos da Profa. Hellen Wambach, que comparou dados das regressões com informações históricas sobre as sociedades. Recentemente a Terapia de Vidas Passadas se vulgarizou entre os profissionais, e tem-se estudado relatos de vidas passadas e a sua associação a marcas de nascença. Tem-se ainda, aí bem recentemente, os estudos na Universidade do Prof. Jim Tucker, que vira e mexe aparece nos programas televisivos com intrigantes casos de lembranças de vidas passadas. 
No campo da comunicação com o Além, os médiuns brasileiros forneceram grande material de estudo, nas mediunidades de Chico Xavier e os diversos estudos correlatos, em especial na questão da grafoscopia. Os casos mediúnicos de Divaldo Franco, Arigó, Peixotinho e do Médium de cura João de Deus têm sido objeto de estudos que ratificam e fortalecem as ideias postas por Kardec. 
O ceticismo ainda campeia, por comodismo, por interesse ou por decepção. Ainda que surjam explicações isoladas de céticos, de forma integrada esses fenômenos encontram guarida nas formulações kardequianas à luz dos depoimentos dos Espíritos, o que vem sendo reforçado pela ação dos estudiosos citados e outros desconhecidos, que labutam de forma incansável, enfrentando o preconceito da academia e a pressão de ideologias religiosas, como enfrentou Allan Kardec no seu tempo, conforme bem descrito pela sua presente biografia. 
Para além de uma revelação, Kardec apresentou um sistema lógico coerente como resposta ao fenômeno posto, construído a partir do material coletado das comunicações com os Espíritos. Uma hipótese que ele mesmo apresentou e refutou as contradições, ao estudar os sistemas no Capítulo IV de “O Livro dos Médiuns”. Ali, Kardec já se posiciona sobre as demais hipóteses em relação ao fenômeno mediúnico e expõe, por argumentos, por que a tese espírita se apresenta insuperável para dar conta da situação. E, até hoje, a explicação ainda é válida. 
Os pilares, a visão de que o fenômeno derivava de inteligências que, chamadas de Espíritos, nada mais eram dos que os homens sem a roupagem carnal, que se sucediam em existências no mundo de cá e de lá, permanecem robustos e convergentes aos estudos que se seguiram, pelas regressões, comunicações e lembranças. Dizer que Kardec é atual não é tomá-lo pela letra idêntica de um suposto livro sagrado e sim pela força do paradigma por ele proposto na explicação da fenomenologia espírita e de todo o contexto com base nesses pressupostos. 
O aspecto filosófico da hipótese espírita, abraçando Deus e o problema do ser, do destino e da dor, traz a essa uma grande força, impulsionando vidas à modificação de disposições, à reforma íntima e à prática da caridade, tornando nosso mundo melhor. Outras hipóteses, além de não atenderem a completude dos fenômenos, baseiam-se em pressupostos teológicos estranhos à razão, com deuses seletivos e injustos, atendendo a injunções e poderes estranhos à visão do bem. O Espiritismo se apresenta como uma verdade ratificada pela razão e pelos fenômenos, na cantiga de esperança que embala a humanidade, mas que se faz incômoda. 
Incômoda, pois rompe os grilhões filosóficos do mundo antigo, da idade de trevas e das visões escravizantes de vida futura, que Kardec não se furtou a tratar no livro “O Céu e o Inferno”. Ideias que ainda pululam por aí, acompanhadas dos mesmos fenômenos de outrora, à busca de soluções razoáveis, que já surgiram no século retrasado pelas mãos do mestre Lionês. 
Assim como ocorreu na biografia de Chico Xavier, acredito que o livro do escritor Marcel Souto Maior despertará o interesse pela obra Kardequiana no público em geral, obra essa que se apresenta insuperável, pelo método e pela consistência, na resposta aos fenômenos mediúnicos. O estudo sistematizado das obras nos permite entender a essência do Espiritismo e de como chegamos a compreender que mesas que giravam nos forneciam uma resposta filosófica para a existência. 
As ideias de Kardec influenciaram o mundo. Ainda que carentes de autoria específica do Espírito A ou B, talvez como um bom caminho para evitar a captura e a exposição, essas ideias seguem por aí em filmes e livros, distantes da estranheza de outras épocas. Ideias de um Deus justo, de vidas que não terminam, de mortos que não se calam, de falhas que são reparadas. Uma visão de mundo libertador que, pelo esforço de um homem, das pessoas à sua volta e das gerações que se seguiram, do mundo de cá e de lá, continua a nos brindar com o consolo que ampara, mas também com a sagacidade que liberta.

Marcus Vinícius de Azevedo Braga
Rio de Janeiro, RJ (Brasil) 

Imagem do livro e seu autor

domingo, 17 de agosto de 2014

Até quando viveremos assim?


No mundo corpóreo as influências dominam as relações humanas. Isso pode ser bom ou ruim para as pessoas, dependendo do caráter dessas influências. Um bom exemplo tem força de transformação a ponto de melhorar hábitos e renovar ideias. O contrário é ainda mais verdadeiro: por conta das suas imperfeições morais, o ser humano assimila o mau comportamento com grande facilidade.
Há, entre nós, a tendência em seguir modelos. Gostamos de imitar os outros. Fazemos isso automaticamente. Sem raciocinar, muitas vezes nos surpreendemos falando, pensando ou agindo igual àquele que nos impressionou com seu modo de ser.
A comparação é outro processo de influência entre os homens. Queremos nos comparar aos outros para medir nossa posição social, nosso desempenho, nossa inteligência etc. Normalmente nos comparamos a quem julgamos nos ser superior, jamais a quem está abaixo de nós. Tolo orgulho.
Curioso é que imitamos e nos comparamos, quase sempre, ao que é ruim, e acabamos “incorporando” em nossa vida vícios e erros que nos atraem. Identificamos, nos outros, aquilo que temos dentro de nós e isso estabelece uma ligação que não percebemos. Esse motivo existe neles, forte a ponto de nos influenciar; e em nós, a ponto de querer parecer com eles. Passamos a escravos da conduta alheia, deixamos de ser nós mesmos. Esquecemos nossa identidade própria e adotamos um estereótipo. Vivemos uma vida de aceitação passiva, sem nenhuma avaliação crítica, guiados pela moda, conformados com o estabelecido, o que nos acarretará frustrações e desenganos, cedo ou tarde.
Até quando viveremos assim, seguindo os outros, com prejuízo do nosso livre-arbítrio? Até quando agiremos pela cabeça de terceiros, sem pensar que isso possa estar nos desviando dos compromissos que nos compete realizar? 
Precisamos reagir e pensar sério num bom projeto de vida para nós; ganhar experiência, construir nossa personalidade sob valores de qualidade, aprimorar as características pessoais e fazer escolhas com mais cuidado. Importante ajuizar se os modelos que copiamos não estão atrasando nossa vida; se as pessoas em quem nos espelhamos e cujas atitudes parecem o máximo, não estão equivocadas. O nível de exigência em relação a nós precisa aumentar. O que é bom para os outros pode não servir para nós. Precisamos exercer nossa vontade, independentemente da opinião em voga, sem desprezar as referências éticas. 
Essas medidas garantirão nosso processo de crescimento interior, sem ilusões. Construtores do nosso destino, nós desenvolveremos um modelo próprio, segundo as características que nos identificam como seres individuais. As influências, naturais no convívio humano, nos afetarão de modo menos impactante, já que passaremos a filtrá-las segundo padrões assertivos. De tudo o que é lícito, acataremos só o que nos convier, conforme o ensino de Paulo de Tarso (I Coríntios, 6,12).
Está na hora de reagir, portanto, e seguir com mais fidelidade a nossa própria vocação, dando ouvidos à consciência, escolhendo o modelo de vida que mais tem a ver conosco e que nos porá no caminho de grandes realizações.

Cláudio Bueno da Silva
Osasco, SP (Brasil) 

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sábado, 9 de agosto de 2014

A religião em nós


Dessa forma, como observadores e observados, nos apoiamos, reconstruímos nossos valores e nossas crenças.
Somos seres sociais. Precisamos um do outro para o exercício do autoconhecimento. No outro, admiramos o belo, reconhecemos o feio, aprendemos sobre o erro, aplaudimos o acerto, identificamos fraquezas, reconhecemos a força. Ao contrário do dito popular, são os iguais que se atraem e não os opostos.
Toda religião merece nosso respeito. Toda religião pretende a mesma coisa: a evolução espiritual, através da prática do bem; e condena a mesma coisa: o exercício do mal. Afirma que somos irmãos por termos a mesma Filiação Divina, que somos iguais e devemos nos amar e nos ajudar. Então, se todas as religiões possuem os mesmos princípios, por que são tão diferentes entre si?
Não existe diferença substancial no pensamento religioso, mas sim no entendimento, no posicionamento a partir da maturidade espiritual. O bem é sempre o bem, o mal é sempre o mal. Em todos os livros sagrados da humanidade encontramos diretrizes e normas que não se alteram na essência. O que se altera são as expressões e o entendimento dos homens.
A religião tem como função aproximar aqueles que possuem as mesmas necessidades evolutivas. Cada ser acompanha o pensamento religioso de acordo com a sua maturidade espiritual. Assim, em grupo, ao identificarmos no outro uma fraqueza semelhante a que temos e observarmos sua luta para superá-la, nos fortalecemos e criamos coragem para lutar nossas próprias batalhas. Dessa forma, como observadores e observados, nos apoiamos, reconstruímos nossos valores e nossas crenças.
Todo agrupamento pela religião, seja ela qual for, não está reunido ao acaso, mas pelas necessidades de aprendizado. Em Mateus, 6:33, encontramos: “Buscai primeiro o reino de Deus e sua justiça, e tudo o mais vos será dado por acréscimo”. O verdadeiro religioso deve crer que, se houver sinceridade em seus atos, Deus fará sua parte. E, então, deverá trabalhar para seu sustento material, mas trabalhará com a certeza de que nada lhe faltará para uma vida tranquila. Isso porque estará disponibilizando, com sinceridade, uma parte de seu tempo para aprender e praticar o que Jesus nos deixou: o conhecimento e o exemplo através da caridade.
Ser religioso não se resume em dizer-se espírita, católico, budista, umbandista, protestante etc. Significa, sim, agir com sinceridade, que nada mais é do que fazer ao próximo o que se deseja para si mesmo. Todo equívoco nos dá a oportunidade de aprendizado, de transformação. Deus não castiga. Ele nos premia. O castigo é uma invenção humana. Ele é a justiça suprema.
Ir à casa religiosa, participar de todos os seus eventos, chamar Jesus de Mestre, proclamando-nos crentes em Deus e possuidores de muita fé não nos torna verdadeiros religiosos. Os atos exteriores, se não refletirem nossa modificação íntima e a conscientização de nossos deveres, de nada servirão para nos ajudar ou ajudar a quem precisa. Deus reconhece o que temos dentro de nosso espírito, independentemente do que dizemos ser.
Há falsos religiosos, que enganam a boa fé dos que os escutam. Falam de Deus, pregam sobre Jesus através dos Evangelhos, enchem casas religiosas prometendo milagres para quem se dispuser a lhes dar o pagamento da enganação, mas seus corações só buscam o prazer material, proporcionado pela ingenuidade de quem os segue.
“Basta a cada dia o seu mal”, lembra o Mestre. Cuidemos de nosso presente, dando a devida importância para a verdadeira religião e a vida nos sorrirá com mais frequência. Não haverá por que praticarmos religião por conveniência, pois sua busca com consciência e responsabilidade nos tornará homens melhores, e sentiremos esta mudança em nossas vidas.
Sejamos como o bom samaritano que, independentemente da raça e da religião, era um verdadeiro homem de bem, um sincero religioso. 

“Como crês? Ninguém sabe... O mundo apenas
 Sabe que és luz nas aflições terrenas,
 Pela consolação que te abençoa.

 Seja qual for o templo que te exprime,
 Deus te proteja o coração sublime
 Alma querida e bela, humilde e boa.”

(Alma Querida, Auta de Souza, psicografia de Francisco Cândido Xavier)

Maria Angela Miranda
Londrina, PR (Brasil)  

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Encontro com Divaldo - Ciclo de palestras pela Europa (2014)

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Aproveitar o tempo


Lúcio, de dez anos, estava sempre a reclamar não ter tempo para nada. Quando a mãe lhe perguntava se tinha tarefas da escola para fazer, ele respondia:
— Sim, mas agora não tenho tempo. Estou brincando.
Mais tarde a mãe voltava a perguntar:
— Meu filho, você já fez os deveres da escola?

— Não, mamãe. Depois eu faço; agora estou vendo televisão!
E assim ele deixava para depois tudo que era realmente importante. Certo dia, a professora Meire mandou um recado para a casa dele, pedindo que a mãe de Lúcio comparecesse à tarde. Surpresa, a mãe agradeceu, confirmando.


Quando Lúcio chegou, a mãe quis saber como fora a manhã dele. O menino olhou para ela e respondeu:
— Tudo bem!
 Depois do almoço, a mãe deu uma desculpa e foi à escola.
Meire, que a esperava, levou-a até a sala dos professores e, após se acomodarem, a professora perguntou:
— Alzira, o que está acontecendo com Lúcio? Ele não tem feito os deveres de casa e não estuda para as provas, alegando não ter tempo. Gostaria de saber se isso é verdade, pois é grave a situação. As notas dele estão muito baixas!
A mãe, que ouvia de olhos arregalados, respondeu:
— Não sabia que ele estava mal assim! Quando pergunto sobre as provas, Lúcio diz que a professora ainda não deu as notas, nem entregou o boletim.
— Não é verdade. Procure conversar com seu filho e saber o que está acontecendo.  Estou preocupada, Alzira!
— Diante do que me disse, eu também! Obrigada, Meire. Vou falar com ele.

               
A mãe retornou a casa e encontrou o filho no computador, distraindo-se com um jogo. Pediu que ele desligasse para poderem conversar.
— Agora não posso, mãe. Estou ocupado, não vê? Não tenho tempo!
A mãe levou a mão na tomada e desligou o computador, afirmando:
— Agora nós vamos conversar, meu filho.
Levou-o para a sala e sentou-se com ele. Depois quis saber:
— Lúcio, você sabe o que significa “tempo”?
— Claro que eu sei, mãe! O tempo representa nossa vida. 60 segundos formam um minuto; 60 minutos, uma hora, e 24 horas representam um dia, e assim o mês e o ano... É isso que quer saber?
— Sim, mas vai muito além, meu filho. Perguntei de “tempo”, como oportunidade que Deus nos concede de vivermos e podermos aprender, não apenas na escola, mas com a própria vida; realizar coisas que nos agradem, crescer e evoluir. Mais tarde, escolher uma profissão para ajudar a nós mesmos e a outras pessoas. Entendeu?
— Sim, mãe, mas qual é o problema? Aonde quer chegar?
— Como você gasta seu tempo, Lúcio? — ela respondeu com outra pergunta.
O garoto baixou a cabeça e não disse nada. Então, a mãe considerou:
— O problema, meu filho, é que você gasta seu tempo inutilmente! Nada faz de bom ou de instrutivo, e, por isso, tem problemas. Não valoriza os estudos, especialmente.
— Ah, mãe, é que eu gosto de brincar, jogar, ver televisão! — o garoto murmurou, sem levantar a cabeça.
— Eu sei, você é criança ainda! Mas não pode fazer “apenas” isso! Tem que estudar também, filho. Teremos que prestar contas a Deus pelo tempo que desperdiçamos. Programando seu dia com cuidado, você pode fazer de tudo, sem se descuidar de nada.       
O garoto concordou, e contou à mãe, abrindo-lhe o coração:
— É verdade, mãe. Minhas notas estão péssimas! Eu sei que preciso estudar mais!
Depois, respirou fundo e sorriu aliviado:
— Mamãe, eu estava preocupado. Reconhecer essa verdade e contar para você deixou-me bem melhor. Preciso mesmo programar meu dia! Ajude-me!
— Eu o ajudo, meu filho. Pode contar comigo, mas procure colocar tudo no papel.

Lúcio pegou uma folha, colocou seus horários dividindo as horas. Com exceção da manhã — que era horário escolar —, e deixou um espaço para descanso logo após o almoço; depois, o horário de tarefas e estudo. E viu que ainda sobraria tempo, antes de escurecer, para brincar com os amigos! Feliz, ele mostrou a folha para a mãe, que aprovou.
— Muito bem, meu filho! Agora você só precisa obedecer a essa programação.


— Pode ter certeza, mamãe. Não quero que o Pai do Céu me cobre pelo tempo que desperdicei aqui na Terra. Vou fazer preces pedindo a Jesus que me ajude a ser mais organizado. Tenho certeza de que vou conseguir!
Alguns meses depois, as notas de Lúcio estavam bem melhores e mostrou o boletim para a mãe, com satisfação.
— Você está indo bem e, certamente, tem tido muita ajuda de Jesus! Parabéns, meu filho! Estou orgulhosa de você. Mostrou que tem vontade: decidiu mudar e manteve sua decisão.
— E sobra tempo para tudo, mamãe!

Meimei

(Recebida por Célia X. de Camargo, em 9/06/2014.) 

Enviado por: Célia Xavier de Camargo 
cxcamargo@uol.com.br
Rolândia-PR

segunda-feira, 28 de julho de 2014

A inclusão das crianças especiais não é uma utopia


O conhecido estudioso e psicopedagogo espírita fala sobre a questão da inclusão das crianças especiais nas instituições espíritas 

Marcos Paterra (foto), radicado em João Pessoa, capital do Estado da Paraíba, é psicopedagogo, palestrante e articulista espírita, membro da AME/PB. Na presente entrevista ele nos fala como vê a questão da inclusão das crianças especiais nas instituições espíritas. 

Como psicopedagogo e espírita, como o senhor vê a inclusão de crianças especiais nas instituições espíritas?

Nas instituições espíritas percebemos que poucos centros se adequam na estrutura física e menos ainda têm pessoas com conhecimento para lidar com as diversas e complexas  formas de deficiências. A inclusão, tanto nas instituições espíritas ou mesmo nas escolas, é para alguns uma utopia, pois embora algumas instituições se adequem para algumas deficiências instalando rampas, banheiros apropriados, a falta de conhecimento dentre os que ali estão torna a estadia de crianças ou mesmo adultos um tanto comprometida.
Vejo instituições que fundam associações ou fundações paralelas para tratamento de crianças especiais, ou de doenças crônicas ou mesmo para deficientes físicos. Isso é muito bom, mas restringe a elas a inclusão, além do que tem fins específicos para determinado  tratamento. E as outras instituições onde no bairro há uma família com um filho autista, ou deficiente auditivo, ou Down? Tem que excluir seu filho ou se deslocar para uma instituição que o aceite ou possa integrá-lo? 

O senhor então considera a inclusão uma utopia?

Não.  Mas...  A inclusão se baseia em vários conceitos, dentre eles posso frisar três, em que é necessário que a criança:
1. Seja uma pessoa que se encontra dentro de um grupo, no sentido de dele fazer parte.
2. Que tenha amigos e relações sociais significativas com iguais, ou sinta que participa na vida social, contribuindo com alguma coisa.
3. Por fim que seja tratada com igualdade, carinho e respeito como a pessoa única que é.
Resumindo, ela tem que ser inserida de modo a sentir bem-estar pessoal e social. Fica evidente que a inclusão sem esses conceitos não assegura inclusão social. Se as instituições não pensarem e agirem baseadas nesses conceitos, as mudanças estruturais para deficientes não terão usuários com deficiência.
        
Qual sua opinião quanto à inclusão nas escolas de evangelização espíritas?

Um dos grandes desafios das instituições espíritas, atualmente, é saber lidar com a criança que apresente alguma deficiência. Em seu despreparo o centro espírita pode desencadear mais problemas ainda, e até mesmo agravar os já existentes, reforçando nessa criança o autoconceito negativo, a desmotivação, o desinteresse e outros mecanismos de defesa, como a indisciplina, rebeldia ou agressividade, que utiliza para justificar a sua incompetência diante da aprendizagem, acreditando-se incapaz de internalizar novos conhecimentos. Acredito que seja necessária a construção do Projeto Pedagógico moldado às novas condições, e também identificar e intervir junto às dificuldades que esses alunos incluídos possuem ou tendem a possuir nessa nova perspectiva de ensino.

Que consequências você vislumbra para o processo de evangelização infantil e juvenil advindas da carência de uma visão inclusiva nessa atividade no movimento espírita atual?

Enfrentamos um paradigma cultural que vem dos conceitos eugenistas, em que o que é diferente ou deficiente deve ser “excluído”. Assistimos no decorrer dos últimos anos às  tentativas maciças de liberar o aborto, a eutanásia e, é claro, também minar as tentativas de inclusão. Sob esse prisma é necessário criar processos de ensino onde a visão inclusivista seja acrescida, ou teremos espíritas elitizados e moldados a formas arcaicas do conhecimento. Entendo que a própria palavra “Evangelizar” é espalhar a “boa nova” e, portanto, vamos fazer isso aprofundando-nos em uma visão inclusivista, no grande amor de Jesus por todos, sem distinção de sexo ou deficiências. E vou mais além, na evangelização juvenil que abre precedentes para o ESE e o ESDE, deve-se já instigar os jovens à leitura de obras de J. Herculano Pires, Ernesto Bozzano, Bezerra de Menezes, Adenauer de Novaes, e tantos outros que fazem também parte da história do Espiritismo e abordam assuntos pertinentes sobre diversos tópicos, dentre eles as deficiências. E dentro do ESDE seria imprescindível também ter esse incentivo. A doutrina espírita, maravilhosa que é, abre precedentes para a crítica e a autocrítica, e para responder às dúvidas inerentes a essas críticas é necessário ampliar as fontes do saber.
Se nós, que pregamos a caridade e tencionamos o entendimento do ser, não abrirmos precedentes para a inclusão dentro de nossas instituições, e é claro na evangelização,  estaremos caindo na hipocrisia da falsa moralidade e criando seres eugênicos.
  
Você diria que crianças com alguma síndrome, como o autista por exemplo, sofrem algum tipo de obsessão ?

Conforme Bezerra de Menezes na obra Loucura e Obsessão, psicografada por Divaldo Franco, o Autismo, como também todos os processos de limitações e doenças psíquicas ou mentais, é um resgate para Espíritos que em suas encarnações passadas tiveram "poder" de influência, decisão, liderança, ideológico ou coisas assim e que não utilizaram aquele "dom" em um objetivo útil ao próximo, abusando de sua influência e muitas vezes se aproveitando de tudo o que podia fazer para ganho próprio. O psicólogo espírita Adenáuer de Novais na obra “Reencarnação: processo educativo” nos diz: “Há crianças que rejeitam tão fortemente a encarnação atual, aos membros de sua família, ao ambiente em que retornaram, que se alheiam da realidade. Experimentam uma rejeição muito grande à atual encarnação. O Espírito prefere permanecer vinculado ao passado, a algo distante e remoto que,  de alguma forma, lhe recompensa. Esses casos podem levar ao autismo. [...]”.
Em resumo, além da auto-obsessão, essas “crianças que apresentam síndromes” também atraem inimigos do passado que as obsidiam.

Gostaríamos de agradecer sua disposição em nos conceder esta entrevista e pedir suas considerações finais.

Eu que agradeço, e gostaria de aproveitar e enfatizar que a “inclusão” não se restringe aos portadores de deficiência, mas também envolve as diversidades étnicas, a opção sexual e as diferenças sociais ou religiosas. Devemos lembrar que, segundo aprendemos no Espiritismo, o corpo nada mais é que uma carcaça para que o Espírito possa habitar e evoluir. Sob essa ótica somos todos Espíritos...  Portanto, todos IRMÃOS!
Devo também lembrar que os Centros Espíritas ajudam e orientam nas questões espirituais, todavia se o frequentador/evangelizando necessita de cuidados médicos ou fazer uso de remédios, não podemos nem devemos interferir. Nosso tratamento é baseado na fluidoterapia e na orientação, mas não descartamos o auxílio carnal dos médicos.
Para finalizar cito a frase de Kardec em “A Gênese” (pág. 31): “na reencarnação desaparecem os preconceitos de raças e de castas, pois o mesmo Espírito pode tornar a nascer rico ou pobre, capitalista ou proletário, chefe ou subordinado, livre ou escravo, homem ou mulher. Se, pois, a reencarnação funda numa lei da Natureza o princípio da fraternidade universal, também funda na mesma lei o da igualdade dos direitos sociais e, por conseguinte, o da liberdade”. Muito obrigado. 

De: Marcos Paterra

Enviado por:  Marcus Vinícius de Azevedo Braga
marcusbragaprofessor@gmail.com
Brasília, DF (Brasil)  

quinta-feira, 24 de julho de 2014

A reencarnação foi ensinada por Papas e está no Decálogo


A reencarnação pertencia ao cristianismo primitivo. Só no Concílio Ecumênico de Constantinopla (553) é que foi  condenada. Aliás, foi condenada a preexistência bíblica do espírito, que ensina que o espírito já existe quando acontece a concepção do feto. “Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te conheci, e antes que saísses da madre, te consagrei e te constituí profeta às nações.” (Jeremias 1: 5). Não existe reencarnação sem a preexistência. E se entendeu que ela foi também condenada.
Os papas Eugênio IV (papa de 1431 a 1447) e Nicolau V (papa de 1447 a 1455) apoiaram o seu ensino pelo sábio cardeal italiano de Cusa (1401 a 1464). (Meu livro “A Reencarnação na Bíblia e na Ciência”, 8ª Edição, página 172, Ed. EBM, SP). Também o Papa são Gregório Magno (papa de 590 a 604) a defendeu. (Idem e “Patologia Latina V. 76, Col. 1.100, Homilia 7, “In Evangelio”, citação de Carlos Torres Pastorino, “Sabedoria do Evangelho”, volume 4, página 120). Para ele, João Batista é reencarnação de Elias (Malaquias 3: 1; e 4: 5; Mateus 11: 14; e Mateus 17: 13). E ele diz que o Batista nega ser Elias (João 1: 21), mas Jesus afirma que seu Precursor é Elias e que já tinha vindo e o haviam degolado. (Mateus 17: 12). Para esse papa, foi como pessoa (personalidade particular de cada reencarnação do espírito) que o Batista negou ser Elias. De fato, geralmente, não nos lembramos das vidas passadas (Jó  8: 9). E continua o Papa Gregório: É como espírito ou individualidade (a personalidade geral da Psicologia Transpessoal de hoje), que animava sua pessoa, que João era o Elias que viveu no tempo do Rei Acab, no século IX antes de Cristo. (Papa são Gregório Magno, Homilia 7, Patologia Latina, Volume 76, Col. 1100, citação de Pastorino, em “Sabedoria do Evangelho, Volume 3, página 21).
E o Decálogo (Os Dez Mandamentos) trazem: “...sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos, “na” terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem...” (Êxodo 20: 5; e 34:7), ou seja, nos netos e bisnetos, quando o avô e o bisavô, geralmente, já se desencarnaram, e então o espírito do avó ou do bisavó já pode voltar reencarnando num neto ou bisneto, pagando ele próprio os seus pecados cometidos no passado. Realmente, os espíritos reencarnam muito nos seus familiares e descendentes. Mas os tradutores dogmáticos falsificaram a Bíblia. E, no lugar da preposição “em” mais o artigo feminino a (na), puseram a “até”, ridicularizando, assim, a justiça divina, pois fazem os espíritos pagarem pecados de outros. Tenho a tradução correta de João de Almeida de 1937, com “na”. Mas, posteriormente, como o espiritismo cresceu muito e pôs em destaque essa preposição (no hebraico “al”), a qual lembra a reencarnação, os tradutores  falsificaram a tradução.
A “American Bible Society”, a tradução para o Esperanto do Dr. Zemenhof (“en la tria kaj kvara generacio”) e a Vulgata Latina de são Jerônimo  (“in tertiam et in quartam generationem”) são fiéis à preposição hebraica “al” (sobre), que significa também em.

Devemos respeitar o cristianismo dogmático dos teólogos, mas o verdadeiro é o bíblico reencarnacionista! 

José Reis Chaves
Escritor, prof. de português pela PUC-Minas, jornalista, biblista,  teósofo, pesquisador de parapsicologia e do Espiritismo na Bíblia,  radialista, palestrante no Brasil e exterior, estudou para padre  Redentorista.
jreischaves@gmail.com
Tel/Fax  (31) 3373-6870. 

Obs.: Esta coluna é de José Reis Chaves, às segundas-feiras, no diário de Belo Horizonte, O TEMPO, pode ser lida também no site www.otempo.com.br - Clicar “TODAS AS COLUNAS”. Podem ser feitos comentários abaixo da coluna. Ela está liberada para publicações. Meus livros: “A Face Oculta das Religiões”, Ed. EBM (SP), “O Espiritismo Segundo a Bíblia”, Editora e Distribuidora de Livros Espíritas Chico Xavier, Santa Luzia (MG), “A Reencarnação na Bíblia e na Ciência”
Ed. EBM (SP) e “A Bíblia e o Espiritismo”, Ed. Espaço Literarium, Belo Horizonte (MG) – www.literarium.com.br - e meu e-mail: jreischaves@gmail.com - Os livros de José Reis Chaves podem ser adquiridos também pelo e-mail: contato@editorachicoxavier.com.br e o telefone: 0800-283-7147.

Na TV Mundo Maior, também pelo www.tvmundomaior.com.br, o “Presença Espírita na Bíblia”, com Celina Sobral e este colunista, às 20h das quintas, e às 23h dos domingos. Perguntas e sugestões: presenca@tvmundomaior.com.br E, na Rede TV, o “Transição”, aos domingos, às 16h15.
“O Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Kardec, pela Ed. Chico Xavier. www.editorachicoxavier.com.br (31) 3636-7147 - 0800-283-7147, com tradução deste colunista.
Recomendo “O Despertar da Consciência – do Átomo ao Anjo”, de Sebastião Camargo. www.sebastiaocamargo.com.br, www.odespertardaconsciencia.com.br e www.editorachicoxavier.com.br

Seicho-No-Ie, “Seminário da Luz”, em 8-6-2014. Orientadora: Preletora da Sede Internacional, Marie Murakami. Local: Chevrolet Hall, Av. Nossa Senhora do Carmo, 230, Savassi, das 10h00 às 16h30. Contato: (31) 3411-7411.
    
Notícias do Movimento Espírita: : http://ismaelgobbo.blogspot.com.

Imagem ilustrativa 

sábado, 19 de julho de 2014

A conspiração do silêncio em torno do Espiritismo


Mesa inter-religiosa no V Congresso Brasileiro de Pedagogia Espírita e II Congresso Internacional de Educação e Espiritualidade, promovido pela Associação Brasileira de Pedagogia Espírita (abril de 2014)
Resolvi escrever no meu blog esse desabafo porque é necessário pelo menos que aqui, num terreno meu, e livre, eu possa dizer tudo o que penso e me seja garantida uma escuta honesta.
Há uma conspiração do silêncio de 150 anos em torno do Espiritismo e eu, como militante da ideia  emancipadora da Pedagogia Espírita, sofro na pele diariamente esse silenciamento em forma de censura, de boicote, de patrulhamento ideológico, de que aliás, os próprios espíritas, muitas vezes fazem parte, por medo, covardia e por falta de entendimento do que o Espiritismo representa.
Kardec foi banido da cultura do século XIX, juntamente com todos os que o sucederam em pesquisas sérias a respeito dos fenômenos espíritas, como Crookes, Geley, Lodge, Zöllner, Lombroso, Conan Doyle e tantos outros. Se estes continuam a ser respeitados nos domínios do conhecimento cientifico em que se destacaram – as biografias, os artigos científicos, as divulgações de seus nomes omitem sutilmente que eles tenham se envolvido com esse modismo ultrapassado do século XIX e início do século XX.
Claro, se entendermos o Espiritismo como mais uma religião, piegas, retrógrada, desatualizada em relação aos avanços do pensamento contemporâneo, enfim uma idéia ultrapassada do século XIX, não há como não manter um desprezo em relação a essa corrente de pensamento, a Kardec e a tudo o que vem com o qualificativo de espírita. E quando se silenciam os cientistas que pesquisaram e os pensadores que filosofaram é o que vai ficar mesmo do Espiritismo. Porque é verdade que o movimento espírita no Brasil muitas vezes apresenta exatamente esse perfil, movido por um mercado editorial altamente comercial, que publica majoritariamente hoje livrinhos de auto-ajuda e romances sem nenhuma consistência literária ou filosófica.
Então, para as pessoas que guardam essa imagem do Espiritismo, não adianta eu falar que fiz minha tese sobre Pedagogia Espírita na USP, patrocinada pelo CNPQ; não adianta explicar que temos uma proposta de inter-religiosidade; não adianta fazer 5 magníficos congressos brasileiros de Pedagogia Espírita e dois inesquecíveis congressos internacionais de Educação e Espiritualidade, colocando a Pedagogia Espírita em pé de igualdade com outras pedagogias, em diálogo com elas, como a Waldorf, a de Paulo Freire, a de Montessori, a anarquista e tantas outras, que foram representadas nesses congressos!
Não adianta um trabalho sacrificial de 10 anos de ABPE e 16 de Editora Comenius justamente tentando resgatar o próprio Espiritismo como uma proposta cultural, como uma espiritualidade universalista, como um pensamento progressista e atual, filosófica e cientificamente consistente!
O que acontece? Tivemos eu e o Alessandro Cesar Bigheto um livro de Filosofia para o ensino médio avaliado duas vezes por ineletctualóides patrulheiros de uma universidade pública, para entrar como livro a ser adotado pelo governo para as escolas públicas. E qual a primeira objeção feita ao livro (o que dá para perceber que o restante é procura de pelo em ovo!)? É que em 400 páginas, mencionamos uma vez o nome de Kardec, como um pensador do século XIX. Mas mencionamos também Dalai Lama, Leonardo Boff, Confúcio, Lao Tsé, Madre Teresa de Calcutá – porque o livro é interdisciplinar e plural e pretende dialogar com várias árias e correntes. Mas como mencionamos uma vez Kardec, é proselitista! E estamos fora do programa do governo.
Essa postura vem de fora, dos não-espíritas, acadêmicos, que vivem em seus feudos dogmáticos (marxistas, freudianos, lacanianos, piagetianos……) que sentem um absoluto desprezo pelo pensamento espírita e nem sequer se dão ao trabalho de pesquisar e ver que existem intelectuais dignos que defendem essa corrente. Podem aceitar um Leonardo Boff, que nunca deixou de ser católico. Mas torcem o nariz para um Herculano Pires ou uma Dora Incontri.
Eu já presenciei uma banca da Unicamp brigar na minha frente se eu deveria ser aceita ou não num concurso de professores, pelo fato de eu ter como um dos meus objetos de pesquisa o Espiritismo. E eu já era doutora e pós-doutora pela USP. Claro que não passei no concurso. Mas claro que, como em todo processo de discriminação, seja com negros, mulheres, homossexuais, a coisa é velada. Se forem indagados, os examinadores dirão que havia melhores candidatos, etc.
E quando vamos divulgar nossos eventos? Já o tema de espiritualidade encontra resistência! Mas se sabem que a Associação Brasileira de Pedagogia Espírita que está promovendo um evento, mesmo que não tenha nada a ver com o Espiritismo, qualquer divulgação nos meios de comunicação nos é vedada. Mas não ocorre o mesmo se há um evento na PUC (que é católica) ou na Universidade Mackenzie (que é presbiteriana).
Para esse patrulhamento ideológico, para que os espíritas não tenham uma voz na sociedade – digo uma voz consistente e respeitada, no pensamento acadêmico, nos meios de comunicação e não aparecer com idéias chinfrins que nem espíritas são, como crianças índigo em novela da Globo – unem-se ateus, marxistas, evangélicos, católicos… todos excluem o espiritismo e se negam terminantemente a nos dar uma voz.
Mas o pior não é isso! Os próprios espíritas assumem esse papel, de calar outros espíritas que estejam trabalhando para marcar um espaço de atuação do Espiritismo na sociedade, a partir de uma visão progressista, plugada no mundo.
Quando entrei com minha tese sobre Pedagogia Espírita na USP, depois de 5 anos de tentativas, quem me ajudou foi um católico e uma judia. Professores titulares espíritas, a quem eu havia pedido para serem meus orientadores, fugiram da raia. Felizmente, honrei a confiança com que esses professores me ajudaram e minha pesquisa foi financiada pelo CNPq, tendo todos os relatórios aprovados, sem nenhum reparo. Não estou dizendo isso para me gabar, mas apenas para pontuar que o trabalho tinha respaldo e coerência.
Veja-se outra experiência nossa: pessoas amigas, espíritas, que freqüentam nossos eventos, e nos elogiam e usam nossos materiais, promovem eventos grandes e pequenos de educação e não nos convidam. Outros fazem projetos, diálogos, reportagens, que contam com nosso apoio, e não nos mencionam.
E o que eu já tive de ouvir de inúmeras pessoas, inclusive próximas, amigas, parceiras, que me aconselharam a não usar o nome espírita na Pedagogia que propomos! Então, em vez de vencer o preconceito e quebrar o boicote, devemos ceder? Esconder a nossa identidade? Ou estão os próprios espíritas convencidos de que o Espiritismo é um discurso atrasado, um positivismo do século XIX ou uma ingenuidade filosófica?
É claro que todo esse silenciamento e esse boicote têm conseqüências práticas muito óbvias: a dificuldade de nos mantermos financeiramente e levarmos adiante a proposta. Hoje, mata-se uma idéia, deixando-a a míngua de recursos financeiros.  E a conspiração do silêncio tem essa função.
Será que estamos falando grego, perguntou uma querida amiga minha? Será que não dá para entender que estamos falando a partir de um lugar? O lugar é o Espiritismo compreendido como um projeto cultural, filosófico e sobretudo pedagógico, que tem direito à cidadania acadêmica, que tem representatividade social para aparecer na mídia, que tem consistência teórica para dialogar com outras correntes de idéias! Que a Pedagogia Espírita caminha em diálogo com as pedagogias mais avançadas da atualidade (quem promoveu um congresso para mostrar isso fomos nós mesmos, mas os que participaram e gostaram e se beneficiaram dessa participação, nem sempre reconhecem nosso valor)! Não dá para notar que não queremos doutrinar ninguém no Espiritismo, tanto que em nossos congressos falam pessoas de todas as religiões, budistas, islâmicas, judeus, afro-brasileiros e também marxistas e ateus?… Quem tem essa postura plural em nossa sociedade? As universidades não têm! As religiões não têm. E nós temos e não somos respeitados e valorizados por isso! Obviamente que há pessoas e grupos que reconhecem isso e nos apóiam! Não quero parecer ingrata com esses. Mas o boicote é grande.
Enfim, desabafo aqui, apenas para desabafar, porque o silêncio provavelmente deve continuar. Por isso, grito: Temos o direito de ser, de existir e de marcar um território de influência na sociedade.

Dora Incontri

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